Sumário executivo

A eficácia de uma estrutura regulatória depende tanto do que quanto do como da regulação. Os formuladores de políticas e os reguladores devem se atentar ao que - o conteúdo da regulação - para assegurar que as “regras do jogo” produzam os resultados desejados. É igualmente importante que os formuladores de políticas e reguladores reflitam sobre o como da regulação - como os países desenvolvem, implementam e revisam as regras - para assegurar que os atos normativos funcionem de maneira efetiva para promover o interesse público.

Este estudo segue uma abordagem semelhante em relação à reforma regulatória no Brasil. O capítulo 1 analisa as barreiras regulatórias à concorrência no Brasil, utilizando os resultados do Brasil nos indicadores de Regulação do Mercado de Produtos da OCDE para propor um conjunto de opções de políticas que possam tornar os marcos regulatórios do país mais favoráveis à concorrência. Os capítulos 2 a 6 analisam os arranjos político-institucionais do Brasil para melhorar a regulação. Eles documentam o progresso alcançado pelo país até o momento e oferecem recomendações para enfrentar os desafios futuros. Os capítulos 7 e 8 trazem estudos de casos de reformas nos setores de gás natural e saneamento básico.

Juntas, as abordagens mostram como um marco regulatório proporcional, claro e eficiente pode impulsionar melhorias no desempenho econômico do Brasil e no bem-estar de seus cidadãos. Além disso, a remoção de barreiras desnecessárias à concorrência por meio de reformas direcionadas pode promover a produtividade e o crescimento econômico.

A avaliação da orientação regulatória do Brasil em relação aos indicadores de Regulação do Mercado de Produtos da OCDE mostra que, apesar das recentes reformas, muito mais poderia ser feito para melhorar o marco regulatório do Brasil e promover um ambiente de negócios mais competitivo. A propriedade pública não é uma questão per se, desde que as regras que garantem a governança das empresas estatais (SOEs) envolvidas em atividades comerciais limitem a interferência política indevida e promovam a igualdade de condições entre as empresas estatais e privadas. Entretanto, a propriedade pública é uma área que merece atenção no Brasil, tendo em vista tanto o nível significativo de estatais em vários setores da economia quanto os arranjos de governança das SOEs que estão defasados em relação às melhores práticas da OCDE. Do mesmo modo, a ausência de regras sobre a interação legítima entre funcionários públicos e grupos de interesse no processo de formulação de políticas aumenta o risco de que os interesses privados prevaleçam de forma obscura e pouco transparente e distorçam indevidamente a concorrência do mercado. Além disso, as compras públicas de bens e serviços e a contratação de obras públicas, que representam uma parte importante da economia, poderiam proporcionar uma melhor relação custo-benefício para o país.

Principais opções de políticas:

  • Definir claramente a lógica da propriedade estatal das empresas e considerar a privatização das empresas nos casos em que essa lógica não se sustenta.

  • Alinhar a governança das SOEs com as Diretrizes da OCDE sobre Governança Corporativa de Empresas Estatais de 2015.

  • Aprofundar os esforços atuais para adotar uma legislação abrangente que regulamente as atividades de lobby.

  • Continuar a tomar medidas para tornar os processos de compras federais mais abertos e competitivos.

Ainda há espaço para reduzir as barreiras à entrada e expansão de empresas, em especial as estrangeiras. Reformas recentes abordaram algumas dessas fragilidades regulatórias, mas são necessários esforços adicionais para superar totalmente a lacuna existente em relação aos países da OCDE.

Principais opções de políticas:

  • Continuar os esforços do país para reduzir a carga regulatória imposta às empresas por meio da implantação de um serviço centralizado para a criação de novas empresas e a aplicação mais ampla da regra de aprovação tácita para licenças.

  • Tomar medidas para reduzir permanentemente as barreiras tarifárias e não tarifárias e para automatizar e simplificar ainda mais as formalidades comerciais.

  • Avaliar se alternativas menos discriminatórias estão disponíveis em relação às atuais exigências que ainda limitam os investimentos estrangeiros em alguns setores.

O marco regulatório do Brasil na área do comércio varejista é mais favorável à concorrência do que em muitas economias da OCDE. Em compensação, a prestação de serviços de contadores, arquitetos, engenheiros, advogados, tabeliões e corretores de imóveis ainda está sujeita a uma série de restrições regulatórias que limitam a concorrência e correm o risco de dificultar a inovação e a produtividade.

Os resultados dos indicadores de Regulação do Mercado de Produtos da OCDE para as indústrias de rede são bastante distintos entre os setores. O marco regulatório dos setores de comunicações eletrônicas e transporte aéreo é bastante favorável à concorrência, principalmente em decorrência de reformas recentes, enquanto que o setor de transporte rodoviário ainda está longe das melhores práticas da OCDE. No setor de gás, as recentes mudanças regulatórias previstas prometem diminuir a lacuna entre o Brasil e os países da OCDE, como mostra o estudo de caso detalhado sobre o setor de gás, embora sejam necessários mais esforços para estimular a concorrência no setor elétrico.

Principais opções de políticas:

  • Considerar a realização de uma avaliação da concorrência para determinar se as restrições regulatórias impostas aos profissionais são efetivamente necessárias.

  • Contemplar a privatização das empresas do setor energético nos casos em que a lógica da propriedade estatal não se sustenta.

  • Promover a entrada em segmentos competitivos, assegurando a separação vertical entre segmentos monopolistas e competitivos.

  • Considerar a flexibilização das exigências para operar serviços de transporte rodoviário de cargas e de transporte rodoviário de longa distância de passageiros e a eliminação de todas as formas de regulação de preços do varejo.

O Brasil avançou na adoção e implementação de práticas e ferramentas de melhoria da regulação, principalmente pelo governo federal. Até o momento, a estratégia do país tem favorecido a adoção de ferramentas específicas de gestão regulatória em vez de criar um marco jurídico-institucional completo e abrangente para a política regulatória. Várias funções de supervisão regulatória estão espalhadas por várias áreas e entidades administrativas, levando a lacunas de coordenação e dificuldades na definição de uma estratégia de longo prazo para a implementação de uma melhor política regulatória.

Principais recomendações:

  • Definir e consolidar a maioria, se não todas, as funções de supervisão regulatória em um único órgão com apoio político do mais alto escalão e arranjos de governança adequados.

  • Promover uma abordagem holística da melhoria da regulação, reunindo as boas práticas regulatórias em um único documento de alto nível.

  • Desenvolver uma estratégia de implementação dos objetivos das políticas em matéria de qualidade regulatória com metas claras e mecanismos de coordenação definidos.

A maior parte dos esforços do Brasil em melhorar a regulação tem se concentrado na adoção e no desenvolvimento de um sistema de avaliação de impacto regulatório (AIR). A adoção gradual da AIR obrigatória permitiu ao país desenvolver capacidades e implementar a ferramenta no governo federal. No entanto, a governança do sistema e sua adoção pelos formuladores de políticas em todo o governo poderia ser reforçada. Além disso, a participação social continua sendo voluntária por parte dos ministérios. Uma implementação bem-sucedida da AIR e dos processos de consulta pública vão além de uma obrigação legal e exigem arranjos institucionais adequados e uma comunicação clara dentro e fora do governo.

Principais recomendações:

  • A curto prazo, considerar o fortalecimento do papel da Secretaria de Acompanhamento Econômico (SEAE) para uma supervisão mais rigorosa das atividades de AIR e participação social.

  • Desenvolver um roteiro para a política do país em matéria de AIR. Aproveitar as lições aprendidas pelas agências reguladoras para aprimorar o roteiro com metas explícitas para o resto do governo.

  • Utilizar as práticas de comunicação e participação dentro do governo como uma ferramenta para incorporar a AIR na cultura de elaboração de regulações.

  • Incorporar a exigência de consulta pública no processo de AIR.

  • Aproveitar o potencial das plataformas existentes, centralizando as consultas públicas no portal Participa + Brasil, e incentivar a participação das partes interessadas.

Os esforços do Brasil para revisar o estoque regulatório estão indo na direção certa, mas ainda não estão coordenados. Ao reunir as diferentes iniciativas sob uma única política mais abrangente, o Brasil poderia ampliar os benefícios para os cidadãos e as empresas. O país enfrentou a burocracia simplificando os procedimentos para concessão de licenças e alvarás para as empresas e implantando um programa para digitalizar os serviços públicos, com mais de 4.000 procedimentos disponíveis on-line. Por outro lado, a implementação de um sistema de avaliação sistemática ex post ainda se encontra em uma fase inicial.

Principais recomendações:

  • Dentro do escopo da política regulatória do país, definir uma estratégia de simplificação administrativa que englobe todo o governo.

  • Medir a carga administrativa criada por importantes processos e formalidades governamentais e direcionar os recursos do governo para a simplificação desses procedimentos.

  • Criar arranjos de governança claros e explícitos que sustentem a implementação de avaliações sistemáticas ex post por parte do governo federal.

O Brasil melhorou a coerência regulatória e a coordenação nos três níveis de governo. No entanto, esses esforços não são sistemáticos e a participação de estados e municípios tende a ser voluntária. A iniciativa do governo federal de documentar e divulgar o progresso alcançado pelos estados e municípios na adoção de boas práticas regulatórias representa um passo na direção certa.

Principais recomendações:

  • Incorporar a coerência regulatória como um pilar fundamental da política regulatória do país.

  • Adotar uma abordagem gradual para promover práticas de melhoria da regulação nos estados e municípios.

  • Incentivar o envolvimento dos governos subnacionais, desenvolvendo mecanismos de notificação quando os projetos de regulação tiverem impactos relevantes nos estados e/ou municípios.

  • Promover o intercâmbio de lições aprendidas e boas práticas entre o governo federal e os governos subnacionais e entre as entidades subnacionais.

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Publicado originalmente pela OCDE sob o título: OECD (2022), Regulatory Reform in Brazil, OECD Reviews of Regulatory Reform, OECD Publishing, Paris, https://doi.org/10.1787/d81c15d7-en.

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