7. Estudo de caso sobre gás natural

O setor de gás natural no Brasil passou por importantes mudanças recentes, pensadas como parte do Novo Mercado de Gás, culminando na aprovação da Nova Lei do Gás (Lei nº 14.134/2021) em 2021. Esses avanços criaram as bases para uma reforma significativa do mercado. As mudanças, aprovadas em lei e complementadas pela edição de atos normativos, visam a promover um setor de gás mais aberto, competitivo, eficiente e flexível.

As seções a seguir analisam as mudanças no marco legal a partir de duas perspectivas: o processo de reforma visto por meio da ótica da política regulatória e da avaliação do marco regulatório no mercado e das recentes reformas, fazendo uso do indicador de Regulação do Mercado de Produtos (PMR) da OCDE. Este capítulo se divide em três partes, cada uma com um tema. A primeira seção descreve o contexto das recentes reformas no setor de gás natural (seção Marco regulatório e recentes reformas no setor de gás natural). A segunda seção discute o uso de ferramentas de gestão regulatória na elaboração das reformas, levando em conta elementos como a participação social e a tomada de decisões com base em evidências, e resume as opções de políticas para fortalecer a gestão e a entrega regulatória no setor (seção Uso de ferramentas de gestão regulatória no processo de reforma). A terceira seção avalia os efeitos da reforma sobre o indicador de PMR setorial da OCDE para o setor de gás, a fim de compreender até que ponto as recentes mudanças no marco regulatório criam um ambiente regulatório mais favorável à concorrência, sugerindo opções de políticas a partir de tal análise com base no indicador de PMR (seção A reforma do setor de gás natural no Brasil e seus efeitos na concorrência econômica).

O marco legal do setor de gás natural no Brasil passou por uma série de ajustes desde 1997. Embora a produção e o consumo de gás natural no país tenham aumentado de forma consistente desde 1990 (Figura 7.1), as reformas anteriores não conseguiram criar um mercado de gás competitivo, limitando os benefícios para o país, seus cidadãos e para as empresas. A onda mais recente de reformas (Novo Mercado de Gás) visa a promover uma estrutura de mercado competitivo. A reforma proposta pelo Novo Mercado de Gás baseia-se em quatro princípios importantes: separação, acesso de terceiros, sistema de transporte em pontos de entrada e saída e transparência (IEA, 2021[1]).

O marco regulatório que sustenta o setor de gás natural no Brasil evoluiu desde a adoção da Lei do Petróleo (Lei nº 9.478/1997), que pôs fim ao monopólio estatal sobre o petróleo e o gás e permitiu a participação de outros atores do mercado além da estatal Petrobras. Em 2009, o Brasil aprovou a Lei do Gás (Lei nº 11.909/2009), editada em decorrência do aumento bastante limitado no número de participantes no mercado de gás natural com o fim do monopólio da Petrobras. A Lei do Gás instituiu um regime de concessão para o transporte de gás natural e regulou o acesso ao sistema de transporte em gasoduto.

Em 2016, o Brasil lançou a iniciativa Gás para Crescer. A iniciativa visava reformar o marco legal do setor de gás natural para incentivar a concorrência por meio da separação das atividades de transporte, abertura do mercado de gás natural e negociação do acesso à infraestrutura essencial, dentre outras medidas. O processo de reforma foi caracterizado por uma forte participação de atores relevantes na elaboração de uma nova lei com base nas experiências internacionais, especialmente aquelas da União Europeia. Embora um projeto de lei tenha sido elaborado, apenas em 2021 um novo marco legal foi aprovado.

Em 2021, a Nova Lei do Gás (Lei nº 14.134/2021) entrou em vigor como parte do Novo Mercado de Gás, adotado em 2019. Entre os aspectos mais importantes dessa reforma está o Termo de Cessação de Conduta entre a Petrobras e a autoridade de defesa da concorrência no Brasil (o Conselho Administrativo de Defesa Econômica, Cade) para reduzir a participação da estatal no mercado por meio do desinvestimento de ativos nos segmentos de transporte e distribuição. O principal objetivo do Novo Mercado de Gás é promover a concorrência, seguindo quatro princípios básicos: separação, acesso não discriminatório de terceiros, sistema de transporte em pontos de entrada e saída e transparência. Promover a harmonização entre a regulação federal e estadual também é um elemento importante do Programa, já que o segmento de distribuição da indústria é regulado pelos estados.

O processo de avaliação do marco regulatório anterior, bem como a definição das novas normas e leis, exigiu um esforço coordenado envolvendo diversos atores do governo brasileiro. A subseção a seguir relaciona os principais atores e suas respectivas atribuições em relação ao setor de gás natural.

O Ministério de Minas e Energia foi criado em 1960 e é a instituição responsável pelo desenho da política nacional de gás natural. O Decreto nº 9.675/2019 estabelece as atribuições do ministério, que incluem a definição da política de exploração e produção de recursos energéticos, a criação de diretrizes de planejamento e a fixação de tarifas. Além disso, o MME, em colaboração com as agências reguladoras e outras instituições, é responsável por:

  • Monitorar e avaliar as condições e a evolução do fornecimento de gás natural

  • Sugerir medidas que minimizem o risco de escassez em situações excepcionais

  • Coordenar e promover programas para atrair investimentos e negócios.

A Secretaria de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis é a unidade administrativa dentro do MME que propõe as diretrizes para a realização de licitações para áreas destinadas à exploração e à produção de gás natural. Ela monitora o desempenho do setor e, em colaboração com a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), controla o uso racional das reservas de hidrocarbonetos.

A Casa Civil ocupa um lugar central no governo federal e está diretamente ligada à Presidência da República. A Casa Civil coordena e integra as políticas e ações do governo e oferece apoio para o monitoramento e a avaliação das políticas e da gestão das entidades do governo federal. Especificamente, o Vice-Chefe de Análise e Monitoramento de Políticas Governamentais (SAG) é o encarregado de avaliar o mérito e a coerência dos programas e políticas do governo. Caso a SAG considere necessário, ela pode solicitar uma análise de impacto regulatório (AIR) para uma determinada proposta de regulação (lei ou decreto).

O Ministério da Economia é responsável pela política econômica nacional, pelo planejamento estratégico nacional, pela administração financeira e contabilidade pública, pela redução da burocracia, pela seguridade social, pelas negociações econômicas e financeiras com os governos, organizações multilaterais e órgãos governamentais e pela elaboração de materiais e informações para a formulação de políticas públicas de longo prazo. O Ministério também é responsável pela defesa da concorrência no setor de gás natural.

A Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) foi instituída pela Lei nº 9.478/1997 e regulada pelo Decreto nº 2.455/1998. Suas principais responsabilidades dizem respeito à regulação, contratação e fiscalização das atividades econômicas relacionadas ao setor energético. A criação de uma agência reguladora para os setores de petróleo, gás natural e biocombustíveis é um dos resultados do fim do monopólio que a Petrobras costumava deter. A ANP regula a extração, o transporte, tratamento, processamento, armazenamento, a liquefação e a comercialização do gás natural no Brasil, entre outros.

O órgão realiza atividades de pesquisa e produz estudos que o Ministério de Minas e Energia utiliza para embasar o planejamento estratégico do setor energético, que inclui o setor de gás natural. A EPE foi criada com o objetivo de garantir que o governo tenha informações e análises adequadas para o desenvolvimento de infraestruturas, políticas e diretrizes para o setor energético do país.

O Cade é a autoridade de defesa da concorrência no Brasil. É um órgão autônomo (vinculado ao Ministério da Justiça e Segurança Pública), com três objetivos gerais: analisar e tomar decisões quanto a fusões, aquisições e outras transações que possam afetar a concorrência econômica; investigar e, se necessário, punir abusos da lei de livre concorrência; e desempenhar atividades de defesa da concorrência.

Especificamente, a Petrobras assinou um Termo de Cessação de Conduta (TCC) com o Cade. Isso significa que a investigação por parte do Cade sobre possíveis práticas anticoncorrenciais pela Petrobras fica suspensa, contanto que a Petrobras atenda às disposições do TCC.

O BNDES é a principal entidade que fornece financiamento de longo prazo para projetos que contribuem para a expansão da indústria e da infraestrutura no Brasil. Para apoiar o desenvolvimento da indústria brasileira de gás natural, o BNDES realiza estudos de oportunidades para investimentos e propõe medidas para promover investimentos.

A regulação é um dos instrumentos de que os governos dispõem para a consecução dos objetivos das políticas públicas. Um marco regulatório de qualidade pode ajudar os países a se aproximarem de seus objetivos nas áreas ambiental, social e econômica. Elaborar e manter um marco regulatório que leve em conta o interesse público não é necessariamente uma tarefa fácil. Na maioria das vezes, os atos normativos geram consequências imprevistas, afetam os cidadãos e as empresas e precisam acompanhar as constantes mudanças no mundo.

A OCDE propõe que os governos vejam o processo de elaboração de normas como um ciclo que engloba várias etapas, começando com a identificação do problema de política pública e terminando com a avaliação da alternativa regulatória após sua implementação (ver Figura 7.2). Isso ajuda os governos a elaborar normas que geram maiores benefícios do que custos e que permanecem relevantes à luz dos objetivos por trás das políticas.

A alteração do marco regulatório para o setor de gás natural no Brasil pode ser analisada pela ótica do ciclo de política regulatória. Como já existia um conjunto de atos normativos que regulavam o setor, a análise deve se iniciar, naturalmente, pela avaliação desse estoque de normas e regras. A OCDE recomenda que as avaliações ex post contemplem as três características a seguir (OECD, 2020[4]):

  • Sejam parte integrante e permanente do ciclo regulatório

  • Sejam abrangentes

  • Incluam uma avaliação com base em evidências dos resultados reais da ação regulatória e contenham recomendações para resolver quaisquer deficiências.

As seções a seguir apresentam uma descrição do processo de avaliação das leis e decretos anteriores e a elaboração do novo marco regulatório para o setor de gás natural no Brasil. Tanto a avaliação da Nova Lei do Gás (e, até certa medida, da iniciativa Gás para Crescer) quanto a elaboração do programa Novo Mercado de Gás tiveram como base atividades que contaram com a participação social. Esses esforços também são analisados nas seções a seguir.

A aprovação da Nova Lei do Gás (Lei nº 14.134/2021) é o resultado de mais de quatro anos de trabalho concentrado na melhoria do marco regulatório para o gás natural no Brasil. A lei anterior para o setor, a Lei do Gás (2009), não aumentava o número de participantes no mercado. Na verdade, a Petrobras continuou a ser o ator dominante durante anos após a abertura do mercado e o fim oficial do monopólio estatal. A iniciativa Gás para Crescer foi adotada com o objetivo principal de revisar o marco regulatório para promover a participação de mais empresas no mercado. Já existia um consenso geral de que o marco anterior não havia conseguido promover a concorrência na cadeia de valor do gás natural. Dessa forma, não foi realizada no Brasil uma avaliação ex post para saber a razão pela qual a Lei do Gás havia deixado de cumprir alguns de seus objetivos.

Em 2016, o Conselho Nacional de Política Energética emitiu um conjunto de diretrizes estratégicas que definiam a base para a elaboração da iniciativa Gás para Crescer (Resolução nº 10/2016, CNPE). A elaboração da iniciativa incluiu a conformação de nove frentes de trabalho com o objetivo de estimular a participação e o diálogo entre representantes da administração pública e da indústria. Além disso, oito subcomitês realizaram uma análise aprofundada de temas importantes e contaram com a participação de diversos atores do setor para a criação de propostas de reforma (a Tabela 7.1 relaciona os subcomitês). Nesses grupos, foram avaliados artigos ou atos normativos específicos relacionados ao tema abordado por cada subcomitê. Isso foi feito tomando como base os objetivos das diretrizes estratégicas, bem como experiências internacionais. A abrangência das análises realizadas pelos subcomitês variou consideravelmente. - Embora, na maioria dos casos, a avaliação tenha sido abrangente, ela não incluiu uma análise minuciosa dos possíveis custos e benefícios do novo marco regulatório. Em alguns subcomitês, os benefícios e riscos esperados foram descritos de forma qualitativa. Além dos oito subcomitês, foi criado também um grupo de trabalho que analisou a necessidade de um fornecedor de última instância para o mercado brasileiro.

Em vários dos subcomitês, os atores concordaram sobre possíveis soluções e sugeriram ajustes ao texto legal. As propostas apresentadas pelos subcomitês tornaram-se parte do Projeto de Lei (PL) nº 6.407/2013 (posteriormente alterado para PL nº 4.476/2020), que não foi aprovado pelo Congresso durante aquela legislatura. Para obter mais detalhes sobre as reformas propostas, consulte a Tabela 7.2.

Entretanto, as propostas que não precisavam passar pelo Congresso para aprovação ou que representavam ajustes na regulação do marco legal (ou seja, aquelas relacionadas ao modelo de entrada e saída, Decreto nº 9.616/2018) foram implementadas.

A participação de diversos stakeholders foi fundamental para a reforma da Lei do Gás no Brasil. A identificação dos aspectos que poderiam ser aprimorados com base no marco regulatório anterior contou com a contribuição de stakeholders da administração pública, da indústria, de especialistas internacionais, do meio acadêmico e da sociedade civil. Em outubro de 2016, e dentro do âmbito da iniciativa Gás para Crescer, o Ministério de Minas e Energia submeteu à consulta pública o projeto Diretrizes Estratégicas para o desenho do novo mercado de gás natural no Brasil. O documento ficou disponível para consulta pública durante um 30 dias. O Núcleo Operacional que liderava o programa forneceu informações técnicas e documentos complementares para embasar o projeto de proposta.1

Após o término do processo de consulta, as contribuições e opiniões dos mais de 50 participantes foram resumidas. O relatório da participação da consulta pública inclui uma análise dos comentários recebidos, bem como o parecer do Núcleo Operacional, descrevendo quais aspectos foram levados em consideração. Por fim, o documento contém a versão final dos textos legais, refletindo os comentários que foram considerados relevantes.

Em dezembro de 2016, o Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) aprovou as Diretrizes Estratégicas para o desenho do novo mercado de gás natural no Brasil (Resolução nº 10/2016, CNPE). Além das 19 diretrizes estratégicas que deveriam ser a base do mercado de gás no Brasil, a resolução determinou a criação do Comitê Técnico para o Desenvolvimento da Indústria de Gás Natural (CT-GN), responsável por propor as alterações específicas no marco regulatório do setor. O Comitê foi composto por representantes da Presidência, de ministérios relevantes, da agência reguladora, da Empresa de Pesquisa Energética, do Fórum Nacional dos Secretários Estaduais de Minas e Energia e da Associação Brasileira de Agências de Regulação. O comitê e os subcomitês mencionados na Tabela 7.1 também foram incentivados a consultar representantes de outras associações e instituições públicas e privadas.

A segunda tentativa de reforma do setor de gás natural resultou no Novo Mercado de Gás (2019). Esse programa dá continuidade ao trabalho da iniciativa Gás para Crescer e define as diretrizes para as políticas energéticas, especialmente para o setor de gás natural (Resolução nº 16/2019 do Conselho Nacional de Política Energética). Tendo em vista as tentativas anteriores de alterar o marco legal do setor, os objetivos do Novo Mercado de Gás incluíam aumentar o consenso entre os atores para garantir maior aceitação das disposições e facilitar a adoção da nova lei.

Embora o processo de alteração da lei do gás tenha se baseado consideravelmente nas contribuições e no conhecimento de atores da esfera pública, privada e internacional, outros aspectos também desempenharam um papel importante. Em especial, a criação do Comitê de Promoção da Concorrência do Mercado de Gás Natural no Brasil e as medidas tomadas pelo órgão fiscalizador antitruste, o Cade. O Comitê de Promoção da Concorrência do Mercado de Gás Natural no Brasil (criado pela Resolução nº 4/2019, CNPE) foi responsável por propor ações destinadas a aumentar a concorrência no setor, promover a adoção de boas práticas regulatórias e fazer recomendações ao Conselho Nacional de Política Energética. Para isso, o comitê, por meio do Ministério de Minas e Energia, realizou uma análise da concentração de mercado, bem como uma análise multicritério, para fundamentar a tomada de decisão e prever os possíveis efeitos das reformas no mercado e na concorrência (Comitê de Promoção da Concorrência no Mercado de Gás Natural do Brasil, 2019[7]). Isso resultou na Resolução nº 16/2019 CNPE, que estabelece diretrizes e melhorias para as políticas energéticas destinadas a promover a livre concorrência no mercado de gás natural. Em paralelo, o Cade, que também integrava o comitê, tomou medidas para limitar o poder de mercado da Petrobras. A Petrobras assinou um acordo com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica para reduzir sua participação no mercado de gás natural.

Além disso, o Decreto nº 9.934/2019 criou o Comitê de Monitoramento da Abertura do Mercado de Gás Natural (CMGN). O CMGN agrupava representantes de várias agências e ministérios (ver Quadro 7.1 para mais detalhes) e criou três grupos de trabalho para aprofundar o entendimento de aspectos específicos da reforma, a saber, a integração entre o setor de gás natural e o setor elétrico, a integração entre o setor de gás natural e a indústria e aspectos fiscais e aduaneiros.

A aprovação da nova lei para o setor de gás natural no Brasil foi apenas uma das medidas para cumprir todos os objetivos considerados no Novo Mercado de Gás. O fato é que diversas regulamentações, decretos e atos normativos precisam ser revisados, alterados ou editados para garantir que o marco legal seja coerente e eficiente. No momento em que este relatório foi elaborado, a Nova Lei do Gás (Lei nº 14.134/2021)2 e sua regulamentação (Decreto nº 10.712/2021)3 haviam sido aprovados (Quadro 7.2). Além disso, a Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis publicou uma agenda regulatória para os anos seguintes, em que detalha os atos normativos a serem revisados ou aperfeiçoados. De acordo com a agenda, a ANP continuará a aprimorar o marco regulatório pelo menos até 2023.

Daqui para frente, um dos desafios mais relevantes para a consecução dos objetivos do Novo Mercado de Gás será a harmonização das normas entre os estados. As evidências coletadas pela equipe da OCDE mostram que a governança regulatória multinível do setor de gás natural é motivo de tensão entre os governos subnacionais, em especial os estados e o governo federal. Atualmente, a Federação possui mecanismos para incentivar a harmonização, criando uma rede de conhecimentos para a troca de boas práticas regulatórias e fornecendo diretrizes que os estados podem adotar de forma voluntária.

A Recomendação do Conselho da OCDE sobre Política Regulatória e Governança (OECD, 2012[8]) aconselha os governos sobre o uso eficaz da regulação para alcançar melhores resultados nas áreas social, ambiental e econômica. Ela também fornece aos governos uma orientação clara sobre os princípios, as ferramentas e institutos necessários para melhorar o desenho, a aplicação e a revisão do marco regulatório de acordo com os mais altos padrões. Algumas dessas ferramentas incluem a análise ex ante dos atos normativos, por meio da Análise de Impacto Regulatório (AIR), da avaliação ex post desses atos por meio da Análise de Resultado Regulatório e da participação social. O princípio por trás dessas ferramentas é garantir que os atos normativos sejam baseados em evidências.

As avaliações ex post permitem que os formuladores de políticas façam um balanço dos resultados e das realizações das leis e dos atos normativos existentes. Elas ajudam a definir em que medida os objetivos por trás da política foram cumpridos, e se a lei ou os atos normativos analisados geraram outros efeitos inesperados ou indesejáveis. O relatório Reviewing the Stock of Regulation, OECD Best Practice Principles for Regulatory Policy (OECD, 2020[4]) faz recomendações às autoridades do governo sobre quais métodos, medidas e práticas poderiam ser seguidos para a realização de uma avaliação ex post dos atos normativos.

A AIR é uma ferramenta de gestão regulatória que ajuda os formuladores de políticas a pensar de maneira crítica sobre os objetivos do projeto de ato normativo em termos de política antes de sua implementação. Ela oferece um método para identificar o problema de política pública a ser resolvido, definir diferentes alternativas para enfrentar esse desafio e, por meio de uma avaliação dos benefícios e custos previstos para cada alternativa, escolher a forma mais eficiente de intervenção por meio de políticas públicas. O relatório Regulatory Impact Assessment, OECD Best Practice Principles for Regulatory Policy (OECD, 2020[9]) contém orientações sobre como realizar a AIR utilizando boas práticas reconhecidas internacionalmente.

Um dos elementos fundamentais tanto da AIR quanto das avaliações ex post de atos normativos é a garantia de que as atividades de participação social sejam realizadas. A interação com diversos atores relevantes permite aos formuladores de políticas reunir evidências, contrastar pontos de vista e gerar adesão à reforma, o que contribui positivamente para a avaliação do ato normativo atual e daquele proposto. O relatório OECD Best Practice Principles on Stakeholder Engagement in Regulatory Policy (OECD, 2017[10]) visa fornecer aos formuladores de políticas e funcionários públicos dos países membros e parceiros da OCDE um instrumento prático para melhor elaborar suas estratégias de participação social.

No caso das duas últimas tentativas de reforma do marco regulatório do gás no Brasil (a iniciativa Gás para Crescer e o programa Novo Mercado de Gás), há elementos que nos permitem afirmar que essas tentativas foram congruentes com as boas práticas envolvendo avaliações ex post, AIR e participação social, embora em diferentes graus.

As práticas de participação social foram amplamente utilizadas em ambos os casos das reformas. A consulta com diversos atores ofereceu ao governo evidências que foram empregadas para avaliar o marco existente e analisar os méritos da reforma no setor de gás, bem como para criar consenso. Os processos também se revelaram transparentes e inclusivos.

No caso da avaliação ex post, antes da implementação da iniciativa Gás para Crescer, havia um certo consenso entre os atores relevantes de que a Lei do Gás não estava gerando os resultados previstos, havendo, portanto, a necessidade de reformar o marco regulatório. A iniciativa Gás para Crescer incluía diversas avaliações técnicas do marco existente.

Em relação à AIR, é notável que tenha havido esforços para avaliar os benefícios líquidos previstos das reformas, porém, esses esforços se limitaram a técnicas qualitativas. Um aspecto positivo a destacar, entretanto, é o uso de evidências para fundamentar a reforma, já que o processo se beneficiou da participação de diversos atores desde seus estágios iniciais, bem como da elaboração de subsídios e documentos técnicos. Ao considerar as medidas adicionais recomendadas mais adiante neste relatório como parte das reformas em curso no setor de gás, o Brasil deve procurar realizar uma análise quantitativa dos benefícios e custos previstos das mudanças regulatórias, na medida do possível.

Quando a Nova Lei do Gás (abril de 2021) e sua regulamentação, o Decreto nº 10.712/2021, foram publicados, nenhum processo formal de elaboração de uma AIR foi seguido. Embora o Ministério de Minas e Energia não tivesse obrigação legal de realizar a análise, esses documentos representam a base legal do Novo Mercado de Gás, e uma análise sob essa ótica teria sido benéfica. O Brasil poderia considerar seguir mais criteriosamente a metodologia de avaliação ex post e AIR para servir de base para as reformas que tenham um grande impacto econômico e social previsto, como no caso do setor de gás natural.

Durante a última década, o Brasil procurou implementar uma reforma no setor energético, em consonância com as experiências da OCDE. A reforma dos setores energéticos dos países membros da OCDE consistiu principalmente na transição por parte desses países de monopólios estatais verticalmente integrados para uma indústria efetivamente competitiva. Essa transição requer tanto a redução do controle estatal sobre as empresas do setor quanto a adoção de um marco regulatório que permita a entrada de novas empresas mais eficientes no mercado e a escolha por parte dos consumidores das empresas que oferecem as melhores ofertas.

O indicador de PMR para o setor de gás natural identifica as barreiras legais à entrada e à expansão enfrentadas pelas empresas no setor. O indicador de PMR ajuda a identificar as áreas em que o Brasil tem um desempenho pior do que os países equivalentes da OCDE, bem como as medidas que o país poderia tomar para adequar seu marco regulatório às melhores práticas internacionais. Considerando que o Brasil está passando atualmente por um processo de reforma em sua indústria de gás semelhante àquele empreendido por outros países membros da OCDE, uma análise aprofundada dos indicadores de PMR para o setor de gás do Brasil pode ser valiosa.

O objetivo desse exercício de análise é compreender melhor o marco regulatório do setor de gás, avaliar a situação das reformas utilizando os indicadores de PMR da OCDE como referência e sugerir opções de políticas que poderiam ajudar ainda mais o Brasil a abrir seu setor de gás natural à concorrência.

O setor de gás é uma indústria de rede, já que é necessária uma rede para conectar produtores e consumidores. Essa rede pode acarretar custos fixos de instalação extremamente elevados e economias de escala bastante significativas, fazendo com que seja mais eficiente que apenas uma empresa opere a rede em uma determinada área geográfica. Isso significa que alguns segmentos dessa indústria apresentam características de um monopólio natural.

Essas características, aliadas a questões relativas ao interesse público em garantir o amplo acesso dos consumidores à energia e à segurança do fornecimento, levaram, no passado, o setor de gás a se tornar um monopólio verticalmente integrado em todos os segmentos de propriedade do Estado.

A partir dos anos de 1990, o papel que o governo era capaz de desempenhar de forma proveitosa no setor comercial foi submetido a uma reavaliação minuciosa. Chegou-se ao consenso de que o alcance das empresas públicas era mais restrito do que se pensava anteriormente, mesmo nas indústrias de rede, como a de gás. Por um lado, acreditava-se que os incentivos gerenciais seriam beneficiados pela privatização, inclusive ao romper o elo entre gestores e políticos, reduzindo assim os custos com o fardo regulatório associado às atividades de lobby (OECD, 2000, p. 154[11]). Por outro lado, mostrou-se desejável facilitar a concorrência nos segmentos da indústria que pudessem sustentá-la, como uma ferramenta para controlar custos e promover investimentos e inovação, para o benefício final dos usuários e consumidores (OECD, 2001[12]).

Uma consequência dessa reavaliação é que os setores de gás em todo o mundo foram reformados nas últimas décadas, em sua maioria passando de um monopólio estatal verticalmente integrado para uma indústria competitiva, com exceção de alguns segmentos que ainda apresentam características de monopólios naturais. Alinhada a isso, a reforma regulatória na indústria de gás natural envolve a promoção da concorrência nos segmentos competitivos da indústria, o desenvolvimento de um regime robusto de acesso aos elementos de monopólio e a separação estrutural entre os segmentos competitivos e não competitivos (OECD, 2000[13]). Como veremos a seguir, todas essas dimensões são medidas pelo indicador de PMR.

Evidências empíricas sobre os efeitos de tais reformas regulatórias nos serviços públicos e em outros setores sugerem que a liberalização tem sido, em geral, benéfica para a eficiência e o bem-estar do consumidor, levando a uma melhor eficiência produtiva, maior qualidade do serviço e preços mais baixos após a reforma (Gönenç, Maher and Nicoletti, 2001[14]). Entretanto, esses efeitos benéficos por vezes são prejudicados por falhas regulatórias no regime de acesso aos elementos monopolistas, devido à incapacidade em refrear o uso do poder de mercado pelas empresas consolidadas nos segmentos competitivos das indústrias e por dificuldades em resolver problemas técnicos complexos que surgem após a implementação da liberalização básica de entrada nesses segmentos (OECD, 2000, p. 155[11]).

Na prática, a liberalização do setor de gás é um processo difícil que muitas vezes leva anos. Conforme as restrições à entrada em segmentos competitivos são eliminadas, devem ser estabelecidas regras para tornar possível o acesso não discriminatório e eficiente aos segmentos não competitivos por uma diversidade de prestadores de serviços. A capacidade dos consumidores de migrarem para novas empresas deve ser estimulada, facilitando o processo e assegurando que informações transparentes sobre os preços do varejo e outros termos e condições contratuais estejam facilmente disponíveis. Quando a liberalização é acompanhada pela divisão dos monopólios verticalmente integrados em várias entidades independentes (a chamada “separação”), é necessário criar mercados do zero para repor transações que anteriormente ocorriam exclusivamente dentro de uma única empresa. Quando se tenta atingir objetivos de interesse público (não econômicos) dentro de um ambiente regulado não competitivo, é preciso encontrar maneiras de tornar esses objetivos coerentes com a concorrência. Quando empresas são privatizadas ou atividades são contratadas, a regulação por meio da propriedade pública deve ser substituída por uma regulação eficaz e independente (OECD, 2000, p. 156[11]).

A indústria de gás é composta por vários segmentos, principalmente os de produção, armazenamento, transporte, distribuição e varejo. (OECD, 2000, pp. 7-9, 22-26[13]).

Este capítulo trata do gás natural e não considera o gás liquefeito de petróleo (GLP), uma vez que os indicadores de PMR se concentram apenas no primeiro.

  • O gás natural é, em geral, transportado da boca de poço – ou, conforme o caso, do local de importação do gás por via marítima ou da instalação de armazenamento – até o ponto de consumo por meio de gasodutos de transmissão de alta pressão e de distribuição de baixa pressão.

    • Economias significativas de escala são geradas nos gasodutos de transmissão. Consequentemente, as oportunidades de concorrência entre os gasodutos de transmissão dependem da localização geográfica de produtores e consumidores, bem como do nível de demanda pelo gás, sendo geralmente limitadas. Assim, normalmente considera-se que a transmissão de gás tem características de um monopólio natural (sendo tratado como tal pelos indicadores de PMR4) (OECD, 2000, p. 8[13]).

    • A rede local de distribuição de gás (baixa pressão) para consumidores menores apresenta economias de escala e densidade. O âmbito da concorrência é estritamente limitado, por isso, considera-se que as redes de distribuição local têm características de monopólios naturais (sendo tratadas dessa forma pelos indicadores de PMR5) (OECD, 2000, p. 8[13]).

  • O gás natural pode ser armazenado temporariamente, permitindo que o fluxo da rede de gasodutos seja mantido relativamente constante apesar das flutuações diárias e sazonais na demanda por gás. Há espaço para a concorrência nesse segmento, embora as oportunidades para uma concorrência eficaz de fato dependam do número de locais adequados para armazenar grandes quantidades de gás, o que varia de país para país. (OECD, 2000, p. 8[13]).

  • Empresas que atuam no varejo prestam diversos serviços, como a negociação do fornecimento com produtores e dos serviços de transmissão com operadores de transporte e distribuição. Essas empresas também podem desenvolver novos produtos e serviços mediante contrato que atendam às demandas dos usuários a jusante e também podem oferecer um serviço de corretagem, adequando a oferta à demanda dos consumidores nos mercados de gás. As possibilidades de concorrência podem ser significativas (OECD, 2000, p. 8[13]).

Em suma, a promoção da concorrência na indústria de gás natural depende do desenvolvimento da concorrência nos mercados de produção, armazenamento e fornecimento no varejo do gás. Como os segmentos de transporte e distribuição são atividades com características de “monopólio natural”, essas atividades precisam ser reguladas para promover a concorrência em outros segmentos, garantindo o acesso não discriminatório de terceiros com preços em função dos custos e oferecendo a eles incentivos à eficiência produtiva e de custos (OECD, 2000, p. 8[13]) (IEA, 2018, p. 7[15]).

Assim, a concorrência no setor de gás pode ser aumentada principalmente ao: a) permitir aos consumidores finais que escolham seu produtor de gás; e b) assegurar que as redes de transporte e distribuição estabelecidas não discriminem os produtores de gás ao fixar preços e outros termos e condições de acesso a seus gasodutos. (OECD, 2000, pp. 33-34[13]).

A separação vertical dos segmentos de mercado que tenham características de um monopólio natural (ou seja, transporte e distribuição de gás) daqueles segmentos de mercado em que a concorrência é possível (ou seja, produção, armazenamento e fornecimento no varejo) é essencial para a criação de um mercado de gás eficiente e competitivo. Um operador de transmissão integrado a montante, na produção de gás, ou a jusante, no varejo de gás, tem um forte incentivo para oferecer serviços de transporte com maior preço ou menor qualidade a produtores ou varejistas rivais e para resistir às pressões regulatórias que o forcem a oferecer acesso não discriminatório.

Vários modelos de separação são possíveis.

  • Separação total da propriedade, envolvendo a separação total da propriedade das empresas relevantes.

  • Separação legal ou operacional significa que as atividades do grupo de empresas filiadas como um todo ocorrerão e permanecerão separadas. Esse tipo de separação normalmente requer uma supervisão regulatória mais rigorosa do que a separação total da propriedade.

  • Por fim, separação contábil significa que uma empresa verticalmente integrada deve manter contas separadas para atividades de mercado reguladas e competitivas. Essa é a forma menos rigorosa de separação.

Conforme descrito na sequência, a classificação no indicador de PMR atribui diferentes pontuações, dependendo dos níveis de separação entre as redes de transmissão/distribuição e as empresas ativas a montante e a jusante. Especificamente, quanto mais eficaz e transparente o modelo de separação adotado, melhor será a pontuação no indicador de PMR, refletindo os menores riscos impostos à concorrência nos mercados a montante e a jusante.

A separação de empresas verticalmente integradas é uma condição necessária para garantir o acesso efetivo e não discriminatório de terceiros (TPA) às redes de transmissão e distribuição de gás (IEA, 2018, p. 21[15]).(IEA, 2018, pp. 3,21[15]).

Conforme já observado, a transição de uma cadeia de fornecimento de gás de propriedade pública e verticalmente integrada para um mercado de gás natural competitivo é um processo complexo que contempla várias etapas (OECD, 2000, p. 156[11]).

Esse processo de reforma é o caminho que o Brasil está seguindo. Ao decidir quais serão as próximas medidas a serem tomadas, o Brasil poderá contar com o indicador de PMR, que é elaborado para medir em que ponto desse percurso um país se encontra, levando em consideração os principais elementos da reforma do setor de redes aqui discutidos.

A liberalização do setor de gás natural envolve a promoção da concorrência nos segmentos competitivos da indústria. A entrada e os preços nos mercados de geração e varejo são liberalizados. O papel do Estado como proprietário de empresas que operam no setor é reduzido. Empresas que atuam tanto em segmentos competitivos quanto não competitivos da indústria são separadas. Normas são adotadas para promover a entrada e assegurar a concorrência em igualdade de condições e para garantir que os objetivos tradicionais de interesse público possam ser cumpridos dentro de um arcabouço regulatório cada vez mais competitivo (OECD, 2000, p. 151[11]).

Os indicadores de PMR refletem essas percepções. Conforme descrito em mais detalhes no capítulo 1, os indicadores de PMR baseiam-se em um banco de dados extenso, compilado pela OCDE com base nas respostas a um questionário enviado às autoridades nacionais sobre dispositivos regulatórios para toda a economia e específicos para cada setor. As informações incluídas no banco de dados são utilizadas para construir dois conjuntos de indicadores: um indicador para toda a economia, que fornece uma medida quantitativa geral da postura regulatória de um país, e um grupo de indicadores setoriais, que medem a qualidade da regulação em setores específicos de rede e de serviços. O presente capítulo se concentra no indicador de PMR para o setor de rede de gás natural.6 Como acontece com todos os indicadores para os setores de rede, o indicador de PMR para o setor de gás mede como a entrada e a conduta no setor de gás são reguladas (com foco nas barreiras legais à entrada, na integração vertical e na regulação de preços do varejo), bem como o grau de propriedade pública.

Refletindo a descrição do setor de gás acima, o indicador de PMR avalia como os seguintes segmentos são regulados:

  • Produção de gás: produção e posterior venda do gás.

  • Armazenamento de gás: propriedade ou operação de instalações de armazenamento de gás quando essas não são integradas à produção.

  • Transmissão de gás: transporte do gás em longas distâncias, das instalações de produção ou armazenamento até a(s) rede(s) de distribuição.

  • Distribuição de gás: transporte do gás da rede de transmissão para as dependências dos consumidores.

  • Importação de gás: importação de gás do exterior.

  • Exportação de gás: exportação de gás para o exterior.

  • Fornecimento de gás no varejo: venda de gás a consumidores finais.

O Brasil está buscando promover um mercado competitivo, reduzindo a posição dominante da empresa estatal Petrobras e criando arranjos orientados ao mercado, analisados na seção A evolução do setor de gás no Brasil, na sequência deste documento.

O Brasil solicitou à OCDE que avaliasse tais esforços de reforma e identificasse opções de políticas para futuras reformas, à luz de seus resultados nos indicadores de PMR. As informações utilizadas para compor os indicadores de PMR referem-se às leis e atos normativos em vigor nos países pesquisados em um determinado período. Para a maioria dos países, incluindo o Brasil, a data do último exercício de análise dos indicadores de PMR foi 1º de janeiro de 2018.

Entretanto, a OCDE recalculou o indicador de PMR setorial do Brasil para o setor de gás natural utilizando informações sobre as leis e os atos normativos em vigor no setor até abril de 2021, incluindo a Nova Lei do Gás.

É importante ressaltar também que, no Brasil, a distribuição e o fornecimento de gás no varejo estão sob jurisdição estadual, ao contrário dos setores a montante, que são de competência do governo federal.7 Quando elementos de um setor de rede são regulados no nível estadual e não pelo governo federal, os indicadores de PMR se referem à legislação em vigor em um único estado: no caso do Brasil, o estado de São Paulo.

Figura 7.5 mostra os resultados do indicador de PMR setorial de 2018 para o setor de gás e o valor revisado para 2021, que reflete o impacto de uma série de reformas realizadas no período.

A figura mostra que, com as reformas realizadas até o momento, o indicador de PMR setorial do Brasil para o setor de gás natural melhorou significativamente. A pontuação do Brasil ainda é mais alta do que a média da OCDE, mas a lacuna diminuiu. O país agora tem um desempenho melhor do que a média das economias emergentes do G20 em 2018. Entretanto, são necessárias mais reformas para que o indicador de PMR do Brasil se aproxime da média da OCDE, como veremos em mais detalhes a partir da seção A evolução do setor de gás no Brasil até a seção Regulação de preços do varejo abaixo.

Como observado acima, a abertura dos mercados de gás à concorrência é um processo longo e complexo que geralmente leva muitos anos. Embora este capítulo se concentre apenas nos indicadores de PMR de 2018 e 2021, os esforços do Brasil para promover um mercado competitivo começaram antes disso.

O mercado de gás natural no Brasil é historicamente controlado pela empresa petrolífera nacional Petrobras. Até 1995, a Petrobras desfrutava de um monopólio legal constitucionalmente consagrado para a exploração, produção e o transporte de hidrocarbonetos. O desenho do setor de gás no Brasil estava, portanto, alinhado à abordagem tradicional dos mercados de gás, caracterizada por uma estrutura verticalmente integrada de propriedade do Estado.

Refletindo a evolução descrita na seção O setor de gás natural e sua evolução ao redor do mundo, acima, quanto ao papel do Estado em setores de rede em todo o mundo nas últimas décadas, o Brasil vem se afastando há algum tempo de um monopólio estatal verticalmente integrado e promovendo o desenvolvimento de uma indústria efetivamente competitiva. Após uma reforma constitucional,8 a Lei do Petróleo de 1997 – aplicável tanto ao petróleo quanto ao gás – procurou separar as atividades de transporte de outros segmentos de mercado.9 A lei não impôs limitações à propriedade cruzada, e a Petrobras cumpriu as novas exigências legais criando subsidiárias próprias a fim de manter e operar os gasodutos de transporte10 (IEA, 2018, p. 15[15]).‐ A ausência de avanços no mercado brasileiro de gás natural após a reforma de 1997 levou à adoção da Lei do Gás de 2009, que visava, entre outras coisas, criar um regime de concessão para o transporte do gás natural e estabelecer o acesso regulado ao sistema de transporte por gasodutos.11 Apesar dessas reformas, a Petrobras manteve o monopólio efetivo de toda a cadeia de valor do gás (IEA, 2018, pp. 16, 18[15]).12

Outra tentativa de abertura do mercado de gás foi realizada por meio da iniciativa Gás para Crescer em 2016 (ver Tabela 7.2 para um resumo das mudanças propostas pela iniciativa). Conforme mencionado anteriormente, ao envolver estudos detalhados e a criação de diretrizes estratégicas pelo Conselho Nacional de Política Energética,13a iniciativa Gás para Crescer elaborou um marco geral para a integração do mercado do setor de gás no Brasil (IEA, 2018, pp. 23-25[15]). Embora algumas das medidas propostas tenham sido adotadas,14 aquelas que exigiam ação do Congresso não foram adiante.15

Consequentemente, uma segunda tentativa de reforma foi lançada em 2019. Conforme apresentado na seção Novo marco regulatório para o setor de gás natural: elaboração, o programa Novo Mercado de Gás culminou na adoção, em abril de 2021, de uma Nova Lei do Gás, que incluía as reformas significativas descritas na Tabela 7.3.16 Consulte também o Quadro 7.2 para mais informações.

Em suma, a Nova Lei do Gás fornece o marco legal para a transição de uma estrutura verticalmente integrada para uma estrutura de mercado liberalizada e competitiva, com base em quatro princípios importantes:

  • Separação: os operadores de redes de gás não podem ser controlados direta ou indiretamente por empresas envolvidas em outras atividades ao longo da cadeia de valor do gás, incluindo a exploração, produção, importação ou comercialização no varejo.

  • Acesso de terceiros: os participantes do mercado devem ter acesso concedido de forma não discriminatória aos gasodutos de transporte sob um regime regulado e aos gasodutos de coleta, unidades de processamento e terminais de gás natural liquefeito (GNL) sob um regime negociado.

  • Sistema de transporte em pontos de entrada e saída: os usuários da rede poderão reservar capacidades de entrada e saída de maneira independente, aumentando a flexibilidade do sistema de gás. Isso implica um rompimento com o sistema ponto a ponto, mais rígido, em que os usuários reservam a capacidade em pontos específicos ao longo da rota de transporte estabelecida em contrato.

  • Transparência: os operadores de rede devem garantir aos participantes do mercado transparência operacional quanto à capacidade de transporte disponível e às tarifas relacionadas aos serviços de transporte (IEA, 2021[1]).

Essa reforma é um passo importante rumo a um mercado de gás competitivo no Brasil e contribuiu para a melhoria do indicador de PMR do Brasil para o setor de gás (conforme descrito abaixo).

Para serem efetivos, esses esforços regulatórios devem ser combinados a esforços para reduzir a presença e o papel da Petrobras no mercado brasileiro de gás a fim de promover a entrada de empresas privadas nos segmentos competitivos da cadeia de valor. E, de fato, o grupo empresarial da Petrobras tem sido objeto de reformas que levaram à privatização e à cisão de alguns de seus negócios, ativos e subsidiárias no setor de gás.

Isso começou nos anos de 1990, quando o Brasil passou por uma série de reformas do mercado que promoveram a privatização e afetaram a estrutura corporativa do grupo Petrobras. Mais recentemente, a Petrobras tentou reduzir seu endividamento e custo de capital por meio do desinvestimento em negócios não essenciais. Para encerrar as investigações sobre supostas condutas anticoncorrenciais, a Petrobras aceitou ainda alienar importantes participações no setor de gás, entre outros compromissos. Entre esses negócios alienados, encontram-se ativos em terra e em águas rasas no setor de petróleo e gás, ativos de produção de gás, refinarias, ativos de geração termelétrica e subsidiárias envolvidas no transporte e na distribuição do gás.17 (OECD, 2020, p. 76[17]).

Em conjunto, os desinvestimentos realizados pela Petrobras e o estabelecimento de novos operadores que conseguiram adquirir partes dos sistemas de transporte e distribuição de gás no Brasil são contribuições valiosas para a separação do sistema (IEA, 2018, p. 5[15]), tendo implicações positivas na pontuação do Brasil no indicador de PMR para o setor de gás.

Apesar de todos esses esforços, a Petrobras continua sendo o principal ator em todo o setor de gás no país. Em fevereiro de 2018, 77% da produção de gás do Brasil provinha de campos operados pela Petrobras (IEA, 2018, p. 83[15]). Mesmo que praticamente 25% de todo o gás no Brasil seja produzido por outras empresas que não a Petrobras, essas ainda precisam vender seu gás à Petrobras, que é a única empresa a comercializar o gás no mercado atacadista brasileiro. Na realidade, cerca de 97% de todo o volume de gás no mercado atacadista foi negociado em 2021 com base em contratos de longo prazo com a Petrobras, embora vários produtores tenham começado a fornecer diretamente às LDCs em 2022 (ANP, 2022[18]).‐ A existência de contratos bilaterais de longo prazo da Petrobras com todos os distribuidores e grandes consumidores industriais indica que a Petrobras manteve uma influência dominante na fixação de preços do varejo em todo o país. Além disso, a Petrobras também detinha uma participação indireta em 19 das 27 empresas de distribuição local em 2021 por meio da Gaspetro, sua subsidiária de distribuição de gás natural (IEA, 2018, pp. 4-5[15]). Em 2022, a Petrobras e a Gaspetro concluíram a venda da Gasmar a outra empresa, reduzindo o número de empresas de distribuição locais nas quais a Petrobras tem participação de 19 para 18 (Petrobras, 2021[19]). Esse cenário pode mudar ainda mais no futuro, uma vez que a Petrobras concordou com a venda de sua participação em sua subsidiária de distribuição de gás natural, a Gaspetro, venda essa que estava sob análise pelo Cade no momento da elaboração deste relatório (Competition Policy International, 2022[20]).

Em suma, as reformas ao longo do tempo e, em especial, as reformas adotadas desde 2018, tem levado a uma melhoria do indicador de PMR do Brasil para o setor de gás. Entretanto, mesmo com essas iniciativas, o indicador de PMR ainda mostra que são necessárias mais reformas.

O restante deste capítulo analisa cada elemento que constitui do indicador de PMR para o setor de gás, destacando os pontos em que reformas ainda são necessárias, a saber:

  1. 1. o grau de propriedade pública;

  2. 2. o tipo e o conteúdo da regulação setorial, em especial:

    • Regulação de entrada no mercado, incluindo informações sobre acesso de terceiros;

    • Separação vertical dos mercados a montante e a jusante dos segmentos com características de monopólio natural, ou seja, as redes de transmissão e distribuição de gás;

    • A existência de um mercado atacadista liberalizado; e

    • A regulação de preços do varejo.

A análise da situação e do progresso dessas categorias fornece um insight do estado atual da reforma do setor de gás no Brasil, investiga como as reformas em curso influenciaram o indicador de PMR do Brasil para o setor de gás e identifica outras oportunidades para reformas a favor da concorrência.

O indicador de PMR analisa se as autoridades públicas são capazes de influenciar diretamente a concorrência no mercado em cada segmento do setor de gás por meio da propriedade e do controle operacional das empresas desse segmento.

Especificamente, para cada segmento do setor de gás (produção, importação, transporte, distribuição e fornecimento no varejo),18 o questionário de PMR analisa se o Estado detém participações acionárias na empresa de maior porte e se controla ou tem direitos especiais de voto (por exemplo, golden shares) em pelo menos uma empresa no segmento de gás relevante. Além disso, o questionário investiga se há restrições à privatização de empresas públicas nos segmentos de mercado relevantes.

Quanto à porcentagem de ações detidas pelos governos federal ou estaduais na empresa de maior porte de cada segmento, isso é significativo em todos os segmentos relevantes, com exceção da transmissão e da distribuição do gás. As autoridades públicas detêm uma participação de 50,5% na Petrobras, que é a maior empresa de produção, importação e fornecimento de gás no varejo.

Nos últimos anos, a Petrobras fez desinvestimentos significativos no setor de transmissão. No setor de transmissão de gás, a maior operadora é a Transportadora Associada de Gás S.A. (TAG). Até 2019, essa empresa, que possui cerca de 4.500 km de gasodutos de transmissão (cerca de 47% da rede de transmissão brasileira), fazia parte do grupo empresarial da Petrobras. Entretanto, em 2019, a Petrobras concluiu o desinvestimento de 90% do capital que detinha na TAG, antes de vender seu capital acionário em circulação em junho de 2020. Com isso, a TAG agora se tornou uma empresa totalmente privada.19 Em 2021, a Petrobras também concluiu o desinvestimento dos 10% restantes que detinha de participação na Nova Transportadora do Sudeste S.A. (NTS), após concluir a venda de 90% de suas ações em 2017 (NTS, 2021[21]). A NTS opera mais de 2.000 km de gasodutos, localizados nos estados do Rio de Janeiro, Minas Gerais e São Paulo (responsáveis por 50% do consumo de gás natural no Brasil). Ela se conecta ao gasoduto Brasil-Bolívia, à rede de transporte da TAG, às operações de regaseificação de GNL da Baía de Guanabara e às unidades de processamento do gás natural produzido na Bacia de Campos e no pré-sal da Bacia de Santos. (NTS, 2021[21]).

Com relação à distribuição de gás, a situação é mais variada, já que existem 27 empresas de distribuição em diferentes regiões do país. Entretanto, a maior distribuidora de gás é a Comgás, que é uma distribuidora privada que opera em São Paulo.

Além disso, os governos federais e estaduais ainda controlam pelo menos uma empresa em cada segmento relevante do setor de gás. Isso não acontece apenas nos segmentos em que a Petrobras é a empresa de maior porte, mas também nos segmentos de transmissão e distribuição do gás.

No segmento de transmissão, a Petrobras ainda detém uma participação de 51% na Transportadora Brasileira Bolívia-Brasil S.A. – TBG, que possui e opera o trecho brasileiro de 2.593 km do gasoduto Bolívia-Brasil. Entretanto, isso pode mudar em breve, já que a Petrobras está atualmente vendendo todo seu capital acionário nas empresas de transmissão, de acordo com os compromissos assumidos junto à autoridade de defesa da concorrência brasileira.

No que diz respeito à distribuição do gás, o envolvimento do Estado ainda é considerável. Apenas nove das 27 empresas de distribuição presentes no Brasil não têm o grupo empresarial da Petrobras como acionista. Dessas, apenas duas, ambas em São Paulo, são totalmente privadas. Das seis empresas restantes, a BNDESPAR, uma subsidiária do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, do governo federal, detém uma participação considerável em uma distribuidora de gás no Rio de Janeiro; duas outras distribuidoras são de propriedade integral de autoridades estaduais e locais; e os governos estaduais detêm a participação majoritária em uma distribuidora de gás,20 além de participações minoritárias em duas distribuidoras de gás nas quais o restante do capital é de propriedade privada.

Por meio de sua participação na Gaspetro, a Petrobras21 possui integralmente uma distribuidora, detém uma participação majoritária em outra e tem uma participação inferior a 50% (que pode, ainda assim, constituir a participação acionária majoritária) em outras 16 empresas de distribuição de gás, cuja propriedade é, em alguns casos, compartilhada com governos estaduais. É importante ressaltar que a Petrobras está atualmente em um processo de desinvestimento na Gaspetro, de acordo com os compromissos que assumiu junto à autoridade de defesa da concorrência no Brasil.22 Isso diminuirá significativamente o nível de envolvimento do Estado nesse segmento de mercado.23

O indicador de PMR também avalia se existem obstáculos para a venda de participações estatais em empresas de gás. Como em outras iniciativas de privatização, o desinvestimento de empresas de gás públicas ou de capital misto requer autorização legislativa quando essas empresas são detidas pelo governo federal. Além disso, caso a empresa em questão tenha sido criada por força de lei, é necessária uma nova lei para que o governo possa alienar sua participação nessa empresa (ver capítulo 1, seção 3.1.1 para mais informações sobre a propriedade pública no Brasil). A venda de subsidiárias, pelo contrário, não requer intervenção legislativa.

Por fim, os governos federal ou estaduais não detêm golden shares ou outros direitos especiais de voto em nenhuma empresa ativa no setor de gás.

Os principais atores da indústria de gás em todos os níveis do mercado costumavam ser integralmente estatais. O mercado passou por certa liberalização, mas o Estado ainda desempenha um papel importante em todos os segmentos do setor de gás. Embora isso faça com que o indicador de PMR setorial do Brasil seja elevado em relação à propriedade estatal (ver Figura 7.5), os esforços para liberalizar segmentos de mercado e, em especial, para que a Petrobras alienasse suas operações em determinados segmentos, contribuíram, e provavelmente continuarão a contribuir, para uma melhoria no desempenho do Brasil nesse indicador. Diante disso, o Brasil pode querer dar continuidade ao desinvestimento da participação diversificada da Petrobras no setor de gás.

A mudança de um monopólio estatal verticalmente integrado para uma indústria efetivamente competitiva requer um marco regulatório que permita a entrada de novas empresas mais eficientes no mercado e que os consumidores migrem para aquelas empresas que oferecem melhores ofertas (ou seja, preços mais baixos, maior qualidade e serviços mais inovadores). O indicador de PMR avalia se os elementos mais importantes de um marco regulatório desse tipo estão em vigor.

As condições amplamente reconhecidas como necessárias para que ocorra uma entrada efetiva no mercado, e que são refletidas no questionário, incluem: a ausência de regras que restrinjam o número de empresas que poderiam entrar nos segmentos da cadeia de fornecimento de gás que não são monopólios naturais (ou seja, as redes de transmissão e distribuição); a existência de condições de acesso de terceiros às redes de transmissão e distribuição criadas por um regulador independente; a existência de um mercado atacadista de gás; a capacidade dos consumidores finais de mudar de fornecedor de gás; a falta de regulação de preços do varejo nos segmentos em que a concorrência é efetiva; e a obrigação por parte dos varejistas de fornecer informações claras a seus consumidores sobre seu consumo anual e sobre as tarifas cobradas no varejo em suas contas.

No Brasil, os segmentos de mercado que não são monopólios naturais foram abertos à concorrência, com a exclusão dos mercados de fornecimento no varejo, já que, na maioria dos estados, a elegibilidade para se tornar um “consumidor livre” (ou seja, um consumidor que pode mudar de fornecedor varejista) baseia-se no volume de consumo e, portanto, pequenos usuários comerciais e domésticos não conseguem escolher seus fornecedores. Por exemplo, nos estados do Rio de Janeiro e da Bahia, os consumidores livres são apenas aqueles com um consumo médio diário mínimo de mais de 10.000 m3 por dia. No Amazonas, são aqueles com um consumo mínimo mensal superior a 300.000 m3. Já em São Paulo, os contratos de concessão da empresa de distribuição local dão ao fornecedor o direito exclusivo de fornecer gás aos consumidores residenciais e comerciais.24 Isso pode ser resultado de contratos de concessão exclusiva de longo prazo firmados com distribuidoras de gás, apesar de a lei prever de modo geral a possibilidade de consumidores do varejo escolherem seu fornecedor.25 Entretanto, o que ocorre é que muitos consumidores não conseguem escolher seu fornecedor e as concessionárias acabam desfrutando de monopólios locais. Como os mercados de fornecimento no varejo são regulados em nível estadual, é necessário um esforço concertado para garantir que todos os reguladores estaduais tomem as medidas necessárias para harmonizar a regulação relativa ao varejo entre os estados e permitir o desenvolvimento de uma concorrência efetiva para todos os consumidores de gás.

Por outro lado, não há restrições quanto ao número de empresas autorizadas a operar em outros segmentos do setor de gás, e os termos e as condições de acesso de terceiros às redes de transmissão e de distribuição de gás são regulados.

Além disso, o Brasil conta com um mercado atacadista de gás. Entretanto, é importante ressaltar que ainda existem obstáculos práticos à liquidez desse mercado e à entrada de terceiros (ver Quadro 7.3).

Embora o Brasil venha adotando reformas para promover a entrada no mercado, principalmente no que diz respeito ao acesso às redes de transmissão e distribuição de gás, ainda há alguns obstáculos no nível estadual para as empresas que desejam fornecer para certas categorias de consumidores finais. As restrições à entrada de fornecedores no varejo devem continuar a serem removidas para favorecer a concorrência no mercado varejista. A harmonização do comércio e da operação da infraestrutura de gás, inclusive entre estados, pode permitir que os comerciantes de gás no varejo forneçam gás em diferentes estados. Em última análise, todos os consumidores no varejo devem ser livres para escolher seu fornecedor, independentemente do volume de consumo.

Conforme observado acima, a separação dos segmentos de transmissão e distribuição dos segmentos de exploração, produção e comércio varejista é fundamental para a criação e a operação de mercados de gás eficientes e competitivos que funcionem bem. Entretanto, o grau de separação pode variar bastante, o que pode afetar significativamente o funcionamento dos mercados de gás.

Em vista disso, o indicador de PMR para o setor de gás analisa se e como cada segmento é verticalmente separado dos sistemas de transmissão e distribuição de gás. Diferentes modelos de separação são avaliados pelo indicador de PMR levando em consideração o grau de separação real garantido, de acordo com a discussão apresentada na seção PMR e o setor de gás, acima.

Os recentes avanços no Brasil reforçaram a separação vertical no setor de gás. A Nova Lei do Gás, de 2021, exige tanto a separação total da propriedade entre o operador de transmissão de gás e todas as outras empresas ativas em outros segmentos do mercado de gás quanto a separação operacional entre as empresas de geração e importação e as empresas de distribuição de gás. A adoção dessas exigências melhorou os resultados do Brasil no indicador de PMR para o setor de gás.

Para usufruir de todos os benefícios dessas reformas, é crucial que essas condições sejam efetivamente implementadas nos próximos anos. No momento, elas ainda não foram totalmente implementados, e uma longa fase de transição está planejada. Em especial, a Nova Lei do Gás exige que novas empresas de transmissão sejam totalmente separadas daquelas que atuam em segmentos de mercado a montante e a jusante, enquanto as empresas de transmissão existentes precisam apenas contar com autonomia jurídica e operacional, o que pode ser demonstrado por meio de um certificado de independência e autonomia emitido pelo órgão regulador. Essas empresas precisam implementar a separação total da propriedade até 2039. Na prática, porém, o processo de separação está bastante avançado, com grande parte da rede de transmissão já tendo sido totalmente separada ou estando em processo de desinvestimento. Portanto, pode ser que esse processo seja concluído mais cedo.26

Em um mercado efetivamente competitivo, as empresas estabelecem seus próprios preços e os consumidores escolhem os fornecedores com a melhor oferta. Para uma concorrência efetiva no varejo, é fundamental que os consumidores possam escolher seus fornecedores, uma condição que, no momento, é limitada (conforme discutido na seção Regulação de entrada no mercado, acima).

Quando os consumidores não são livres para escolher seus fornecedores, a regulação de preços dos varejo é necessária para protegê-los. No Brasil, o mercado de fornecimento no varejo é regulado no nível estadual e as autoridades reguladoras estaduais determinam os preços do varejo para cada categoria de consumidores que não está apta a mudar de fornecedor. As metodologias usadas para definir esses preços variam de um estado para o outro. Alguns estados, como o Amazonas e a Bahia, utilizam uma abordagem de custo acrescido, que engloba os custos de aquisição do gás, enquanto outros estados, como Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais e Espírito Santo, utilizam uma metodologia de teto de preço.27

Conforme discutido acima na seção Regulação de entrada no mercado, nem todos os consumidores conseguem mudar de fornecedor. Portanto, a regulação de preços do varejo deve se adaptar às condições de mercado relevantes. Isso envolve manter uma regulação de preços do varejo que promova a entrada eficiente de pequenos usuários comerciais e domésticos de gás como uma medida provisória até que a concorrência no varejo se torne efetiva, momento em que a regulação de preços deve ser removida. As exigências de divulgação relativas ao consumo e às tarifas podem aumentar a transparência e facilitar essa mudança.

Mesmo nos locais onde os consumidores conseguem escolher seus fornecedores, a concorrência não pode se desenvolver a menos que os consumidores tenham informações suficientes para poder compreender as opções disponíveis e escolher a melhor dentre elas. Se os consumidores não tiverem essas informações, eles não usufruirão de sua capacidade de mudar de fornecedor e os fornecedores não terão incentivo para competir efetivamente, impedindo assim que a concorrência se desenvolva. Portanto, os consumidores devem receber informações suficientes por parte dos fornecedores de gás no varejo. Essas informações devem incluir, no mínimo, uma indicação clara de seu consumo anual, bem como as tarifas cobradas no varejo.

O estado de São Paulo, por exemplo, cujas leis e atos normativos são refletidos pelo indicador de PMR, exige que as contas enviadas a consumidores residenciais e consumidores comerciais de pequeno porte apresentem essas informações28. Isso tem um efeito positivo sobre o indicador de PMR para o setor de gás. Entretanto, o mesmo não acontece em todos os estados brasileiros: consumidores em todos os estados poderiam ser beneficiados por medidas de transparência semelhantes.

O indicador de PMR oferece informações sobre medidas que o Brasil pode considerar como parte da reforma em curso de seu setor de gás. Nos últimos anos, o Brasil adotou medidas importantes na redução do nível de envolvimento público no setor, promovendo o acesso ao mercado e aumentando a concorrência em inúmeros segmentos da indústria de gás natural. Medidas adicionais que o Brasil poderia contemplar incluem:

  • Alienar ainda mais as diversas participações da Petrobras no setor de gás, com base nos significativos esforços iniciais do Brasil para liberalizar o setor e conforme o acordo firmado pela Petrobras junto à autoridade de defesa da concorrência brasileira para a alienação de seus ativos em transporte e distribuição.

  • Buscar a separação total da propriedade de empresas de distribuição e empresas de geração e importação de gás (as exigências atuais limitam-se à separação operacional).

  • Continuar buscando a separação total da propriedade entre as empresas de transmissão de gás existentes e todas as outras empresas ativas no mercado de gás, processo esse que já está em curso.

  • Implementar as sugestões apresentadas pela AIE em seus dois relatórios sobre o mercado de gás no Brasil (IEA, 2018[15]; IEA, 2021[23]) para promover a criação de um mercado atacadista de gás líquido e eficiente.

  • Permitir que todos os consumidores em todos os estados, independentemente do volume de consumo, escolham seus fornecedores no varejo e, quando a concorrência se tornar efetiva, liberalizar as tarifas do varejo.

  • Assegurar que todos os consumidores recebam em sua conta anual as informações necessárias para que entendam os termos e as condições a que estão sujeitos, o que pode implicar em maiores exigências comuns de transparência entre os estados.

  • Harmonizar ainda mais os marcos regulatórios entre os estados,29 a fim de facilitar o desenvolvimento de uma concorrência eficaz entre fronteiras.

Referências

[18] ANP (2022), Gás natural: medidas implementadas pela ANP para a abertura do mercado, https://www.gov.br/anp/pt-br/canais_atendimento/imprensa/noticias-comunicados/gas-natural-medidas-implementadas-pela-anp-para-a-abertura-do-mercado.

[25] Assembleia Legislativa Espírito Santo (2021), Assembleia autoriza desestatização da ES Gás, https://www.al.es.gov.br/Noticia/2021/12/42303/assembleia-autoriza-desestatizacao-da-es-gas.html.

[7] Comitê de Promoção da Concorrência no Mercado de Gás Natural do Brasil (2019), Novo Mercado de Gás, https://www.gov.br/mme/pt-br/assuntos/secretarias/petroleo-gas-natural-e-biocombustiveis/novo-mercado-de-gas/documentos-relacionados-1/ApresentaoPowerPointNovoMercadodeGsCNPE.pdf (accessed on 7 December 2021).

[20] Competition Policy International (2022), Brazil’s Antitrust Watchdog CADE OKs Compass Purchase Of Gaspetro, https://www.competitionpolicyinternational.com/brazils-antitrust-watchdog-cade-oks-compass-purchase-of-gaspetro/.

[14] Gönenç, R., M. Maher and G. Nicoletti (2001), The Implementation and the Effects of Regulatory Reform: Past Experience and Current Issues - OECD Economic Studies No. 32,.

[23] IEA (2021), Implementing Gas Market Reform in Brazil: Insights from European Experience, https://iea.blob.core.windows.net/assets/e552c7ce-d35d-4e09-8cf9-a7f2a38ff50b/ImplementingGasMarketReformsinBrazil-InsightsfromEuropeanexperience.pdf.

[2] IEA (2021), Natural gas final consumption and production, https://www.iea.org/data-and-statistics/data-browser?country=BRAZIL&fuel=Natural%20gas&indicator=NatGasCons (accessed on 20 December 2021).

[1] IEA (2021), Novo Mercado de Gás – The Brazilian gas market enters a new era, https://www.iea.org/commentaries/novo-mercado-de-gas-the-brazilian-gas-market-enters-a-new-era (accessed on 22 November 2021).

[22] IEA (2020), Fast-tracking gas market reforms, https://www.iea.org/commentaries/fast-tracking-gas-market-reforms.

[15] IEA (2018), Towards a competitive natural gas market in Brazil, IEA, https://www.iea.org/reports/towards-a-competitive-natural-gas-market-in-brazil (accessed on 20 October 2021).

[16] IEA (1998), Natural Gas Pricing in Competitive Markets.

[5] Ministério de Minas e Energia (2021), Subcomitês do CT-GN, https://www.gov.br/mme/pt-br/assuntos/secretarias/petroleo-gas-natural-e-biocombustiveis/gas-para-crescer/subcomites-do-ct-gn (accessed on 24 January 2022).

[6] Ministério de Minas e Energia (2018), Novo Desenho do Mercado de Gás Natural, http://antigo.mme.gov.br/web/guest/secretarias/petroleo-gas-natural-e-biocombustiveis/acoes-e-programas/programas/gas-para-crescer/propostas/novo-desenho-do-mercado-de-gas-natural (accessed on 20 December 2021).

[21] NTS (2021), Our History, https://www.ntsbrasil.com/en/.

[9] OECD (2020), OECD Best Practice Principles for Regulatory Policy: Regulatory Impact Assessment.

[17] OECD (2020), OECD Review of the Corporate Governance of State-Owned Enterprises in Brazil - OECD, OECD Publishing, Paris, https://www.oecd.org/brazil/soe-review-brazil.htm (accessed on 8 October 2021).

[4] OECD (2020), Reviewing the Stock of Regulation, OECD Best Practice Principles for Regulatory Policy, OECD Publishing, Paris, https://doi.org/10.1787/1a8f33bc-en.

[10] OECD (2017), OECD Best Practice Principles on Stakeholder Engagement in Regulatory Policy, Draft, https://www.oecd.org/gov/regulatory-policy/public-consultation-best-practice-principles-on-stakeholder-engagement.htm (accessed on 24 January 2022).

[8] OECD (2012), Recommendation of the Council on Regulatory Policy and Governance, OECD Publishing, Paris, https://doi.org/10.1787/9789264209022-en.

[3] OECD (2011), Regulatory Policy and Governance: Supporting Economic Growth and Serving the Public Interest, OECD Publishing, Paris, https://doi.org/10.1787/9789264116573-en.

[12] OECD (2001), Recommendation of the Council concerning Structural Separation in Regulated Industries OECD/LEGAL/0310, https://legalinstruments.oecd.org/en/instruments/OECD-LEGAL-0310 (accessed on 21 October 2021).

[11] OECD (2000), “IV. Regulatory reform in network industries: past experience and current issues”, in Economic Outlook 67, https://doi.org/10.1787/data-00099-en (accessed on 20 October 2021).

[13] OECD (2000), Promoting Competition in the Natural Gas Industry DAFFE/CLP(2000)18, http://www.oecd.org/daf/clp (accessed on 20 October 2021).

[19] Petrobras (2021), Petrobras sobre saída da Gaspetro na Gasmar, https://api.mziq.com/mzfilemanager/v2/d/25fdf098-34f5-4608-b7fa-17d60b2de47d/72e51c59-a2ce-6dac-23b0-93dddac53609.

[24] Reuters (2021), EIG Global Energy Partners submits offer for Petrobras pipelines in Brazil, source says, https://www.reuters.com/business/energy/eig-global-energy-partners-submits-offer-petrobras-pipelines-brazil-source-says-2021-08-25/.

Observações

← 1. Núcleo Operacional refere-se ao grupo responsável pelo desenvolvimento de uma proposta para o novo desenho do mercado de gás no Brasil. O grupo inclui o Ministério de Minas e Energia, a Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis e a Empresa de Pesquisa Energética.

← 2. Publicado em 9 de abril de 2021.

← 3. O Decreto nº 10.712/2021 foi publicado no Diário Oficial da União em 4 de junho de 2021.

← 4. Isso significa que o fato de esse segmento da indústria ser um monopólio legal não gera uma pontuação negativa no indicador de PMR, como aconteceria no caso de segmentos que poderiam ser abertos à concorrência.

← 5. Ver nota de rodapé anterior.

← 6. O indicador de PMR setorial examina apenas os mercados de gás natural e não inclui o gás liquefeito de petróleo (GLP).

← 7. A Constituição brasileira estabelece que as empresas e a regulação da rede de distribuição local estão sob a jurisdição de cada estado (Constituição Federal do Brasil de 1988 ‐ art. 25, § 2º), enquanto as atividades a montante e intermediárias estão sujeitas à regulação federal (artigo 177 da Constituição Federal do Brasil).‐

← 8. Esse monopólio foi estabelecido na Constituição Federal do Brasil. Uma emenda constitucional de 1995 foi, portanto, necessária para permitir a liberalização do setor.

← 9. Lei nº 9.478, de 6 de agosto de 1997.

← 10. Transportadora Associada de Gás S.A. (TAG), que era proprietária dos gasodutos, e Transpetro, que os operava.

← 11. Lei nº 11.909, de 4 de março de 2009.

← 12. Isso pode ser explicado pelo desenho específico de certos componentes importantes necessários para a criação de um mercado competitivo previstos na Lei do Gás de 2009, mas que nunca foram totalmente implementados. Por exemplo, a Lei do Gás de 2009 estabeleceu o acesso regulado de terceiros à rede de transmissão, mas não a outras instalações (tais como gasodutos a montante, usinas de processamento e terminais de GNL). Isso praticamente impossibilitou o acesso de produtores independentes à infraestrutura de transporte de gás, levando-os a vender sua produção à Petrobras.

← 13. Resolução CNPE nº 10, de 14 de dezembro de 2016.

← 14. Por exemplo, aquelas relacionadas ao Decreto nº 9.616, de 17 de dezembro de 2018, relativo ao modelo de entrada e saída no sistema de transporte.

← 15. Essas propostas foram consolidadas, em 2017, em um projeto de lei apresentado ao Congresso em substituição ao Projeto de Lei (PL) nº 6.407/2013, posteriormente renumerado como PL nº 4.476/2020 (https:// www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=593065).

← 16. Lei nº 14.134, de 8 de abril de 2021 (http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2021/lei/L14134.htm). Além disso, o decreto que regula essa lei já foi implementado – ver Decreto nº 10.712, de 2 de junho de 2021.

← 17. Principalmente, a Transportadora Associada de Gás (TAG) e a Nova Transportadora do Sudeste (NTS). Outros desinvestimentos estão planejados, mas ainda não foram concluídos: os processos de venda da participação da Petrobras na Transportadora Brasileira Gasoduto Bolívia-Brasil S.A. (TBG) e na Transportadora Sulbrasileira de Gás (TSB) estão em curso, e a venda da Petrobras Gás (Gaspetro) ainda estava em análise pelo Cade no momento da elaboração deste documento (Reuters, 2021[24]; Competition Policy International, 2022[20]).

← 18. No caso do Brasil, os mercados de armazenamento e exportação de gás não são considerados, tendo em vista seu tamanho reduzido.

← 19. https://www.engie.com.br/en/press/press-releases/engie-and-cdpq-to-acquire-remaining-10-of-tag-in-brazil.

← 20. Essa distribuidora de gás, a ESGAS, esteve totalmente sob o controle de uma subsidiária da Petrobras chamada BR Distribuidora até o final de 2018. A Petrobras concluiu a venda de todas as ações da BR Distribuidora nessa empresa em junho de 2021. Mais tarde, em dezembro de 2021, o estado do Espírito Santo aprovou uma nova lei que permite ao governo estadual alienar sua participação na empresa de distribuição (Assembleia Legislativa Espírito Santo, 2021[25]).

← 21. A Petrobras detém 51% da Gaspetro. Os 49% restantes são detidos pela Mitsui Gás e Energia do Brasil Ltda.

← 22. https://www.gov.br/cade/en/matters/news/cade-extends-deadlines-for-petrobras-asset-sale-in-oil-refining-and-natural-gas-markets.

← 23. Se esse processo for concluído até o final de 2022, ele será refletido pelo indicador de PMR do Brasil no próximo ciclo, de 2023.

← 24. Observe que, na medida em que o varejo de gás está sujeito à regulação estadual, os indicadores de PMR refletem apenas a situação no estado de São Paulo, pois esse é o estado brasileiro usado como base para os indicadores de PMR. O Ministério da Economia do Brasil e o Ministério de Minas e Energia forneceram mais informações sobre outros estados.

← 25. Por exemplo, o art. 28 da Deliberação nº 1061/2020, de 6 de novembro de 2020, da Agência Reguladora de Serviços Públicos do Estado de São Paulo – ARSESP. Entretanto, essa mesma deliberação prevê (ver art. 1, § 2) que é necessário respeitar os termos do contrato de concessão para o fornecimento aos usuários nos segmentos residencial e comercial. Entendemos que alguns dos contratos de concessão relevantes vão até 2029, e que essa restrição permanecerá em vigor até lá.

← 26. É importante ressaltar que, uma vez que os indicadores de PMR avaliam o marco regulatório de jure. Mesmo que a separação total fosse alcançada mais cedo, isso não afetaria a pontuação no indicador de PMR.

← 27. De acordo com informações fornecidas pelo Ministério da Economia e pelo Ministério de Minas e Energia do Brasil.

← 28. Art. 53 da Deliberação ARSESP nº 732.

← 29. Levando em conta as responsabilidades e competências dos estados em relação à infraestrutura de gás, pode acabar sendo necessário um mecanismo para coordenar ou harmonizar os termos e as condições de acesso e segurança operacional da infraestrutura em nível federal e estadual. Ver OCDE/AIE (2018, pp. 6, 8[15]).

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