9. Abertura

Uma abordagem holística da integridade pública inclui medidas destinadas a promover a abertura, em que os agentes públicos se sintam seguros para identificar ativamente, levantar questões, preocupações ou ideias e responder a possíveis violações da integridade pública. Construir uma cultura organizacional aberta tem três benefícios principais: primeiro, pode construir confiança na organização; segundo, pode cultivar o sentimento pertencimento e motivação, aumentando assim a eficiência (Martins and Terblanche, 2003[1]); e terceiro, em uma cultura organizacional aberta, qualquer pessoa pode levantar questões para resolvê-las antes que se tornem prejudiciais à organização. A comunicação aberta e o compromisso com os valores organizacionais criam um ambiente seguro e encorajador onde os agentes expressam suas opiniões e se sentem à vontade para discutir livremente dilemas éticos, possíveis situações de conflito de interesses e outras preocupações de integridade.

A Recomendação da OCDE sobre Integridade Pública exorta os aderentes para “apoiar uma cultura organizacional aberta no setor público que responda às preocupações de integridade, em particular através de:

  1. a. Incentivar uma cultura aberta onde dilemas éticos, preocupações com a integridade pública e erros possam ser discutidos livremente e, quando apropriado, com representantes dos agentes públicos, e onde a liderança seja responsiva e comprometida em fornecer conselhos oportunos e resolver questões relevantes;

  2. b. Fornecer regras e procedimentos claros para relatar suspeitas de violações dos padrões de integridade e garantir, de acordo com os princípios fundamentais do direito interno, proteção na lei e na prática contra todos os tipos de tratamentos injustificados como resultado da denúncia de boa fé e por motivos razoáveis;

  3. c. Fornecer canais alternativos para relatar suspeitas de violações dos padrões de integridade, incluindo, quando apropriado, a possibilidade de relatar confidencialmente a um órgão com competência e capacidade para conduzir uma investigação independente” (OECD, 2017[2]).

No contexto da integridade pública, uma cultura organizacional aberta significa que agentes públicos , gestores e líderes podem se envolver regularmente em conversas com o objetivo de levantar dúvidas, preocupações ou ideias e prevenir má conduta, fraude ou corrupção (Detert and Edmondson, 2011[3]; Morrison, 2014[4]; Collins, 2012[5]). Isso é complementado por mecanismos formais de comunicação, como canais de denúncias e outras políticas internas de divulgação, que permitem que os agentes denunciem má conduta por meio de um canal oficial quando a má conduta já tiver ocorrido. Uma cultura organizacional aberta tem os seguintes elementos de apoio: liderança receptiva e comprometida em fornecer conselhos oportunos e resolver questões relevantes; e funcionários que se sentem à vontade para levantar questões éticas (OECD, 2017[2]). Alcançar esses dois elementos envolve o seguinte:

  • Os agentes públicos se identificam com os valores da organização;

  • Os agentes públicos estão engajados e capacitados para proteger seus valores no local de trabalho;

  • gestores. Líderes e gestores são responsivos, leais e confiáveis com as questões e preocupações relativas à integridade;

  • Ambientes seguros para expressar dúvidas, preocupações e ideias são cultivados e mantidos;

  • Canais e mecanismos são estabelecidos para garantir que a má conduta seja denunciada, investigada e devidamente sancionada, e os denunciantes se sintam protegidos e à vontade para expressar suas preocupações.

Um elemento chave para garantir a abertura requer agentes públicos que se identifiquem com o propósito da organização, conheçam as regras e procedimentos e entendam como eles são implementados na prática. Quando os valores e normas organizacionais entram em conflito com os do funcionário, seu comprometimento e envolvimento com a organização provavelmente serão prejudicados. Por um lado, se os funcionários mantiverem seus valores pessoais em um padrão mais alto do que a organização, eles experimentarão um conflito, resultando em menor comprometimento e falta de vontade de se manifestar contra possíveis irregularidades (Berry, 2004[6]). Por outro lado, se os padrões de integridade pessoal de um funcionário forem inferiores aos da organização, as violações de integridade correm o risco de serem vistas como uma parte necessária da rotina diária (Berry, 2004[6]).

Práticas concretas para cultivar a identificação com os valores incluem a comunicação de regras e padrões em linguagem simples (para saber mais, consulte o Capítulo 4) e recrutamento de acordo com os padrões éticos (para mais informações, consulte o Capítulo 7). As organizações também podem garantir que, quando novosagentes forem contratados, o treinamento inclua discussões sobre as regras, padrões e valores da organização (para saber mais, consulte o Capítulo 8). Outras ferramentas podem incluir um sistema de premiação de integridade, por meio do qual os funcionários podem nomear seus pares com base em sua demonstração dos valores da organização (Quadro 9.1).

Para cultivar a identidade com os valores da organização, a Autoridade de Denúncias, nos Países Baixos, sugere o uso de um método de “narraçãoconjunta”. Isso inclui líderes e gestores fazendo perguntas como: “O que é importante para nós, o que valorizamos e do que nos orgulhamos?” – E, juntamente com os colaboradores, falar sobre a organização, a sua história, o futuro comum e como pretendem alcançá-lo. A lógica subjacente é que, por meio do compartilhamento de histórias, todos ganham mais informações sobre a cultura existente. Isso cria vínculo e coesão entre as pessoas e o trabalho, podendo contribuir para um ambiente seguro dentro da organização (Hoekstra, Talsma and Zweegers, 2017[8]).

É mais provável que um funcionário cuja voz seja ouvida se sinta engajado para resolver um problema de forma construtiva (Holland, Cooper and Sheehan, 2017[9]; Beugré, 2010[10]; LePine and Van Dyne, 1998[11]). Engajamento e abertura também se apoiam mutuamente com culturas organizacionais abertas aumentando o engajamento. De fato, quando os funcionários percebem oportunidades para expressar genuinamente suas preocupações e participar da tomada de decisões, o seu engajamento melhora (Beugré, 2010[10]).

Existem várias ferramentas para construir o engajamento e o empoderamento dos agentes. Por exemplo, agentes cujos líderes os consultam individualmente têm uma visão positiva de sua influência individual em seu ambiente de trabalho (Tangirala and Ramanujam, 2012[12]). Isso, por sua vez, pode afetar sua disposição de se engajar e expressar ideias ou preocupações. Os líderes também podem praticar “sair de cena” para que os lideradospossam “entrar em cena”, como mudar onde os líderes se sentam/ficam (por exemplo, no meio da mesa em vez de na cabeceira) ou a ordem das intervenções para garantir que os lideradosfalem primeiro ou possuam momento de fala nas reuniões (Tilleard, 2018[13]).

Os mecanismos não devem se concentrar apenas em melhorar o engajamento individual entre líderes e liderados Os líderes podem querer considerar o estabelecimento de espaços de grupo para facilitar o feedback, disponibilizando oportunidades para aqueles que não se sentem à vontade para falar em uma situação individual. Esses espaços podem assumir a forma de reuniões regulares, onde a equipe sabe com antecedência que questões, problemas e possíveis soluções podem ser levantadas, ou reuniões ad hoc quando surgem questões específicas. Os líderes podem querer agradecer e reconhecer publicamente aqueles que se manifestam durante essas reuniões, bem como adotar pelo menos uma ideia ou resolver um problema mencionado, demonstrando que falar tem resultados (Detert and Burris, 2016[14]). Outras opções podem incluir o uso de ferramentas online para elucidar o feedback, como o processo ThinkGroup desenvolvido pela Equipe de Insights Comportamentais do Reino Unido (Quadro 9.2).

Outra ferramenta possível é a seleção de “Defensores da Abertura” que consultariam o pessoal sobre medidas para melhorar os processos de trabalho, bem-estar e abertura em geral. Os Defensores podem ser responsáveis por facilitar o feedback sobre questões específicas ou questões atribuídass a unidades ou diretorias específicas. Seu objetivo seria identificar os principais pontos críticos dentro da organização que exigem mudanças ou onde existam boas práticas para apoiar a abertura.

A disposição de um funcionário de falar se relaciona positivamente com a percepção de que gestores e líderes são líderes transformacionais e éticos (Avey, Wernsing and Palanski, 2012[16]; Detert and Burris, 2007[17]; Walumbwa and Schaubroeck, 2009[18]). Existem várias ferramentas para apoiar os líderes na demonstração de seu compromisso com a integridade, incluindo sistemas de recrutamento e desempenho que incluem integridade, modelagem de papéis, comunicação sobre integridade, recompensar o bom comportamento e sancionar o mau comportamento (para mais informações, consulte o Capítulo 6). Outras ferramentas, como diretrizes, podem ser desenvolvidas para apoiar os gestores na tomada de ações concretas para criar um local de trabalho aberto (Quadro 9.3).

Enquanto os líderes que “fazem o que falam” são essenciais para promover a confiança, os gestores que mostram franqueza com sua própria gestão também podem cultivar credibilidade e confiança. Em outras palavras, os gestores que falam com sua liderança em nome das preocupações expressas por seus funcionários demonstram que podem ser confiáveis (Knight, 2014[20]; Detert and Burris, 2016[14]). De fato, a disposição de um gerente de “subir as questões na cadeia de comando” melhora a disposição dos funcionários de se apresentar ao gerente em primeiro lugar (Knight, 2014[20]). Embora os gestores e líderes possam capitalizar as oportunidades de levantar problemas com sua gestão na frente dos funcionários, há momentos em que isso não será viável. Líderes e gestores podem informar os funcionários sobre o que eles discutiram e quais os próximos passos (se houver) necessários. Isso traz três benefícios principais: i) demonstra aos funcionários que os gestores estão dispostos a falar em seu nome; ii) amplia as perspectivas dos colaboradores sobre as barreiras enfrentadas pelos líderes; e iii) mantém os colaboradores informados sobre o progresso, eliminando sentimentos de futilidade (Detert and Burris, 2016[14]).

A “segurança psicológica” ou um ambiente seguro é uma condição básica para a abertura dentro de uma organização (Liang, Farh and Farh, 2012[21]). Ao tomar uma decisão sobre falar, os funcionários primeiro avaliarão se é seguro fazê-lo (Dutton et al., 2002[22]). De fato, um impedimento fundamental para uma cultura organizacional aberta é um ambiente em que os funcionários temem que suas ideias, percepções e observações sejam rejeitadas ou, o que é mais preocupante, que a manifestação leve a penalidades.

Existem várias maneiras práticas de cultivar e manter um ambiente seguro. Por exemplo, líderes e gestores podem reconhecer erros e transformar os negativos em lições aprendidas para projetos futuros. Discutir publicamente o que deu errado e o que pode ser feito de forma diferente pode fortalecer a coragem dos funcionários para buscar aconselhamento. Em essência, líderes e gestores devem estar abertos a sugestões e ser consistentes em encorajar pontos de vista divergentes, bem como não retaliar quando seus próprios pontos de vista são ameaçados (Saunders et al., 1992[23]).

Outras opções incluem ir além da política de “portas abertas” e falar com os funcionários em ambientes menos formais, como durante um café ou almoço. Evidencias constataram que uma política de abertura raramente alcança o efeito desejado de criar mais abertura, pois ainda impõe uma dinâmica de poder difícil de superar (Detert and Treviño, 2010[24]). Outras abordagens incluem tornar os líderes mais acessíveis aos funcionários em todos os níveis. Por exemplo, em Victoria, Austrália, um programa de “orientação reversa” foi conduzido pela Equipe de Inovação do Setor Público: executivos seniores foram combinados com mais funcionários juniores, com o objetivo de aprender com eles e adotar diferentes perspectivas. Outra solução é implementar processos de feedback de 360 graus que permitem que os funcionários forneçam feedback sobre seus gestores, bem como seus líderes de nível superior (ou seja, o gestores dois ou três níveis acima deles). As informações podem ajudar a organização a identificar os elos na cadeia de comunicação ascendente que requerem reparo e direcionar recursos de acordo com o treinamento (Detert and Treviño, 2010[24]).

Mesmo em organizações muito abertas, os agentes públicos podem se deparar com situações nas quais não se sentem confiantes em relatar violações de integridade ao seu gestor. Como tal, estabelecer uma estrutura de proteção de denunciantes clara e abrangente é um componente crítico de uma cultura organizacional aberta. Um sistema robusto de proteção ao denunciante começa com uma comunicação clara e eficaz. Informar a todos os colaboradores sobre seus direitos e responsabilidades e os recursos disponíveis para eles é crucial para promover um ambiente de confiança, profissionalismo e companheirismo que apoie a integridade.

As seguintes características são componentes essenciais das políticas de proteção aos denunciantes que órgãos e entidades do setor público devem buscar estabelecer para fortalecer uma cultura organizacional aberta:

  • canais de denúncia claros

  • proibir sanções formais e informais relacionadasao trabalho

  • garantia de proteção ao denunciante

  • avaliação e investigação de reclamações

  • medidas de sensibilização.

Possui um canal de denúnicas claramente definido ajuda a facilitar o recebimento de denúncias, caso contrário, os denunciantes podem não ter confiança no sistema ou podem não se sentir à vontade para se manifestar. Os canais de denúncia geralmente incluem divulgações internas, divulgações externas a um órgão respectivo e divulgações externas ao público ou à mídia (OECD, 2016[25]).

Oferecer acesso a canais internos e externos cria um ambiente propício para denúncias. A divulgação interna é incentivada para fortalecer uma cultura organizacional aberta; fornece informações relevantes às unidades reponsáveis e contribui para uma resolução rápida e eficaz de casos ou preocupações. No entanto, dependendo da situação, os denunciantes podem preferir denunciar para órgãos externos. Exigir que as denúncias sejam feitas primeiro internamente pode desencorajar os indivíduos de expressar preocupações ou relatar má conduta.

Para evitar procedimentos confusos, o processo de divulgação dos canais de denúncias deve ser acompanhado de uma explicação das etapas e processos a seguir, a fim de garantir que os denunciantes estejam bem informados não apenas sobre a quem divulgar, mas também sobre as possíveis repercussões da divulgação. Por exemplo, a Autoridade de Denúncias nos Páíses Baixos,desenvolveu orientações para esclarecer e facilitar tanto o fluxo dos procedimentos de comunicação quanto sua implementação (Quadro 9.4) (Whistleblowers Authority, 2017[26]).

Embora os arranjos institucionais do sistema de denúncias dependam do contexto do país, alguns países usam um órgão externo com competência definida e recursos e capacidades adequados para receber denúncias e conduzir investigações independentes sobre a má conduta denunciada. No Canadá, o Gabinete do Comissário de Integridade do Setor Público é responsável pelas investigações e resoluções de reclamações. O Gabinete do Comissário é um organismo independente que reporta nomeadamente sobre as suas investigações apenas ao Parlamento; com jurisdição sobre quase todas as organizações do governo federal, é acessível diretamente aos servidores públicos federais canadenses para orientação ou divulgação (Sulzner, 2009[27]). Os resumos dos casos investigados pelo Gabinetedo Comissário são posteriormente apresentados ao Parlamento e são disponibilizados ao público no seu sítio Web (PSIC, 2018[28]).

A ausência de proteção efetiva para denunciantes pode representar um dilema, pois muitas vezes espera-se que os funcionários denunciem irregularidades, mas isso pode expô-los a retaliação. A retaliação por denúncias de irregularidades geralmente assume a forma de ação disciplinar ou assédio no local de trabalho. Portanto, a proteção do denunciante deve fornecer proteção abrangente contra ações discriminatórias ou retaliatórias, bem como contra outros comportamentos, como exclusão, hostilidade e qualquer forma de assédio por parte de gestores e colegas de trabalho. Especificamente, isso pode incluir proteção contra demissão, suspensão ou advertência; transferência ou remoção; redução de salário e/oubenefícios, treinamento; e ou exames médicos (OECD, 2016[25]).

Quando um denunciante sofre represálias após divulgar uma má conduta, é importante fornecer clareza sobre as medidas e ações disponíveis pode tranquiliza-los. Um sistema abrangente de proteção ao denunciante inclui medidas específicas e abrange todas as consequências diretas, indiretas e futuras de represálias. As medidas vão desde o retorno ao emprego após rescisão sem justa causa, transferências de emprego ou compensação, abrangendo também danos que não podem ser remediados por liminares, como dificuldade ou impossibilidade de encontrar um novo emprego. Tais medidas podem levar em conta não apenas o prejuízo salárial, mas também danos psicológicos (Banisar, 2011[29]).

Também é essencial proteger a confidencialidade dos agentes públicos que fazem denúncias dentro de sua organização ou externamente aos órgãos e entidades competentes, à mídia ou a uma organização da sociedade civil (OECD, 2017[30]). Nos Estados Unidos, o sistema de proteção de denunciantes proíbe a divulgação de informações de identificação de um denunciante do setor federal sem consentimento, a menos que o Escritório do Conselho Especial (OSC) determine que seja necessário devido a um perigo iminente à saúde ou segurança pública. Nesses casos, o denunciante é informado com antecedência. O sistema de proteção de denunciantes na Austrália permite o anonimato como uma das três opções para denúncias de de interesse público (OECD, 2016[25]).

Legislar e implementar procedimentos investigativos claros e respostas oportunas às denúncias fortalecem a credibilidade dos mecanismos implementados. As respostas dos gestores aos relatórios individuais são o primeiro passo, garantindo que a preocupação seja abordada e a má conduta ou irregularidades, quando verificadas, sejam sancionadas. Além disso, em uma dinâmica de aprendizado organizacional, quando os gestores recebem diversas reclamações sobre situações semelhantes, sua resposta geral para adequar o sistema ou processo implantado sinaliza o impacto dos relatos e fortalece a cultura organizacional aberta do local de trabalho. Em seu relatório anual de 2017-18, o PSIC do Canadá enfatizou essa abordagem sistêmica em três casos de irregularidades, concentrando a atenção nas condições de trabalho dos agentes federais canadenses e na responsabilidade de fornecer a eles ambientes de trabalho seguros (PSIC, 2018[31]).

Conforme mencionado acima, além das respostas dadas pelos gestores e lideranças, a divulgação do número e da natureza dos casos contribui para a transparência e a credibilidade do canal de denúncias. Os organismos e unidades que pretendam tornar públicas essas informações podem recorrer a várias medidas. Por exemplo, o Escritório do Conselho Especial dos EUA publica relatórios anuais de atividades que detalham o número de divulgações, o número de investigações iniciadas ou a quem foram encaminhadas e um resumo dos casos com os resultados das investigações. Esses relatórios também incluem uma análise de questões sistêmicas e respostas quando apropriado, bem como o tempo de processamento e o número de divulgações processadas e fechadas, com dados comparativos de exercícios anteriores (US Office of Special Counsel, 2018[32]). A publicação dessas informações destaca o valor dado a essas manifestações no local de trabalho e reforça o conhecimento de que as denúncias são investigadas e a má conduta abordada, fortalecendo a confiança no sistema geral de comunicação e tratamento de reclamações.

Uma estrutura de proteção de denunciantes clara e abrangente também inclui aumentar a conscientização sobre os canais e proteções disponíveis. Esforços para aumentar a conscientização por meio de campanhas ou treinamento sobre os tipos de proteção disponíveis e as disposições em vigor para evitar retaliações podem tranquilizar os funcionários de que as divulgações são bem-vindas e fazem parte de seu dever profissional. Alguns países, como a República Eslovaca, integraram a proteção de denunciantes em seu treinamento em ética, estabelecendo uma forte ligação entre a proteção do interesse público e a integridade. Da mesma forma, a Lei No-FEAR nos Estados Unidos exige que as agências forneçam avisos anuais e treinamento semestral aos agentes federais sobre seus direitos contidos nas leis trabalhistas e na legislação de proteção ao denunciante.

Embora os desafios possam variar dependendo dos contextos locais e nacionais em que as organizações operam, alguns pontos em comum podem impedi-lás de implementar efetivamente culturas organizacionais abertas. Os mais relevantes deles, discutidos abaixo, são:

  • abordando culturas hierárquicas e formais do serviço público

  • capacitando e destinando recursos

  • garantindo uma proteção abrangente e clara

  • mudando as conotações negativas associadas à denúncia

  • criando ambientes seguros por meio de relatórios confidenciais ou anônimos.

Uma característica típica de muitas organizaçõesé uma cultura hierárquica e formal que opera com base na “deferência aos superiores” (Mulgan, 2000[33]). Várias cadeias de comando estão em vigor, com linhas de autoridade e responsabilidade para garantir a formulação de políticas e a prestação de serviços eficazes. O objetivo da hierarquia é duplo: garantir maior clareza e fornecer maior autoridade sancionatória (Jarvis, 2014[34]). A hierarquia pode, no entanto, ter um efeito desencorajador na abertura.

Abordar isso dentro dos parâmetros de uma estrutura formal é desafiador e exige que todos os níveis implementem ações para melhorar a abertura. A necessidade de os líderes agirem de forma consistente com os valores da organização, conforme discutido na Seção 9.2.3, não pode ser exagerada em uma organização hierárquica. O foco principal nesses ambientes, no entanto, deve ser na equipe imediata, onde os gestores implementam medidas para engajar e capacitar seus funcionáriose garantir um ambiente seguro. Medidas práticas podem incluir a realização de reuniões regulares de equipe para discutir questões, organizar eventos informais, colocar caixas no local de trabalho para coletar reclamações, feedback e ideias e garantir que mecanismos regulares de feedback para os funcionários estejam em vigor. Os gestores também podem implementar a prática de trazer preocupações à alta administração e comunicar os resultados de volta a seus funcionários, conforme discutido na Seção 9.2.3. Discussões abertas e feedback regulares também podem reduzir a lacuna que o formalismo hierárquico pode criar entre líderes,gestores e subordinados.

A falta de capacitação e de destinação de recursos é muitas vezes a principal razão para a implementação lenta ou limitada dos canais de denúncias. Isso, por sua vez, pode levar os indivíduos a acreditar que suas reclamações ou denúncias não serão avaliadas, causando uma perda adicional de confiança no sistema. Além disso, a falta de recursos, orientação e conhecimento sobre como criar ambientes abertos e seguros pode resultar em uma perda ainda maior de confiança.

As organizações podem fortalecer tanto uma cultura organizacional aberta quanto mecanismos eficazes de proteção aos denunciantes, dedicando recursos humanos e financeiros. As oportunidades de capacitação são um elemento adicional para ajudar os gestores a entender melhor e difundir uma cultura aberta em sua equipe e aumentar a eficácia dos canais de denúncia, apoiando e fornecendo à equipe conhecimentos e ferramentas atualizados (para mais, consulte o Capítulo 8).

Embora a maioria dos países da OCDE tenha estabelecido mecanismos de proteção aos denunciantes, as disposições em diferentes atos legislativos continuam sendo a própria lei. Isso pode resultar em uma proteção mais restritiva, com diferentes atores e diferentes procedimentos. Além disso, tais leis nem sempre abarcam todos os tipos de denúncia relacionadas à má conduta. Leis claras e abrangentes de proteção a denunciantes podem esclarecer melhor os processos de denúncia e divulgar soluções para vítimas de retaliação (OECD, 2016[25]).

A falta de procedimentos padronizados também pode dificultar o recebimento da denúncia relacionada à má conduta, pois essas denúncias podem não ser avaliadas de forma consistente em diferentes órgãos. Estabelecer procedimentos e canais claros, diretrizes e práticas padronizadas para encaminhar denúncias aos órgãos e entidades competentes é essencial para garantir uma proteção consistente e eficaz dos denunciantes, assim como a coordenação entre os mecanismos de detecção e denúncia para evitar sobreposições ou duplicações.

Os termos “denúncia” ou “denunciantes podem ser associados a delatores ou deslealdade à organização ou país. Abordar essas percepções é essencial para incentivar que os agentes públicos não tenham receio de apresentar informações ou preocupações. Alguns países optaram por usar um termo mais apropriado à cultura e ao papel de quem apresenta essas informações. Por exemplo, em holandês, o termo usado é klokkenluider ou bell-ringer, que lembra aqueles que no passado tocaram a campainha para sinalizar perigo iminente para a comunidade.

As campanhas de sensibilização também podem destacar o papel dos denunciantes na salvaguarda do interesse público. Essas campanhas podem mudar as percepções negativas, tanto dentro quanto fora das organizações públicas, de que denunciar é falta de lealdade à organização. Por exemplo, a Comissão da Função Pública do Reino Unido inclui uma declaração nos manuais do pessoal para assegurar ao pessoal que é seguro levantar preocupações. Na província de Alberta, Canadá, a Comissão de Interesse Público elaborou uma série de cartazes e os distribuiu para entidades públicas. Os cartazes mostram mensagens como “Faça uma mudança fazendo uma chamada. Seja um herói para o interesse público de Alberta”.

Ao expandir esses esforços de comunicação externamente, a percepção pública dos denunciantes como salvaguardas importantes para o interesse público pode ser melhorada. Por exemplo, no Reino Unido, a forma como o público entende o termo “whistleblower” mudou consideravelmente desde a adoção do Public Interest Disclosure Act em 1998 (Quadro 9.5) (OECD, 2016[25]).

Embora os sistemas de proteção de denunciantes devam garantir que a identidade do indivíduo seja mantida em sigilo, existem vários desafios. Em primeiro lugar, a identidade do denunciante pode ser inferida do relatório ou das circunstâncias descritas, especialmente em pequenas organizações ou países pequenos, dificultando a proteção adequada. Disposições disciplinares para violação de requisitos de confidencialidade podem ajudar a enfrentar esse desafio. Na Coréia, por exemplo, a divulgação da identidade de um denunciante (ou informações que ajudem a identificá-lo) pode ser punida com três anos de prisão ou multa de KRW 30 milhões.

Em segundo lugar, nos casos em que a denúncia anônima é permitida, os desafios podem estar no acompanhamento das informações do denunciante ou em responsabilizá-lo por falsas alegações. Para equilibrar esse desafio, o Ministério da Justiça da Áustria criou um portal on-line para denúncias, que permite denúncias anônimas criptografadas e acompanhamento e feedback por meio de um sistema de numeração de casos (OECD, 2017[30]).

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