Avaliação e recomendações

Desde sua criação como primeiro regulador independente do Brasil em 1996, a ANEEL tem apoiado o desenvolvimento do setor elétrico brasileiro e construído uma reputação como um regulador econômico competente com a ambição de liderar e de se superar.

O setor elétrico brasileiro passou por profundas transformações ao longo das últimas décadas. A ANEEL acompanhou e implementou importantes reformas buscando reformar um setor que se caracterizou por empresas de energia verticalmente integradas e controladas pelo Estado nos anos 1990, e por crises de fornecimento nos anos 2000. O setor híbrido atual (2020) combina os ambientes de contratação livre e regulada, estando sujeito a novos planos de liberalização e privatização. Este impulso final para a “modernização do setor” busca, entre outras coisas, reduzir as tarifas de eletricidade residencial que são objeto de comparação desfavorável em relação aos países vizinhos ou países “hidroelétricos” semelhantes. Cabe destacar ainda que o Brasil está atualmente entre os países que menos dependem do carvão no mundo, com 45% da oferta total de energia proveniente de fontes renováveis1.

O cenário institucional do setor elétrico brasileiro inclui um grande número de órgãos públicos e, em alguns casos, faltam mecanismos formais de coordenação. Na pior das hipóteses, um setor saturado pode gerar problemas de clareza de papéis. Além disso, o setor elétrico está se tornando mais complexo com o tempo conforme vai se expandindo e sendo transformado pelo progresso tecnológico. Nesse contexto, modelos de negócios inovadores oferecem a possibilidade de melhorar a eficiência do setor e gerar valor para os consumidores, mas há um risco de que a política e a regulação fiquem aquém dessa transformação.

As partes interessadas reconhecem a ANEEL como um regulador tecnicamente capaz e as equipes internas da ANEEL fornecem uma base sólida de evidências para a tomada de decisão. A ANEEL também demonstra uma vontade de melhorar seus processos. Por exemplo, a agência liderou esforços para melhorar a qualidade regulatória, utilizando análises de impacto regulatório, sendo pioneira nessa prática entre as agências federais brasileiras antes de se tornar uma exigência legal. A utilização de novas abordagens, tais como insights comportamentais, e a participação ativa da ANEEL em muitas redes internacionais atestam ainda mais o desejo da agência de inovar na sua forma de trabalhar.

Num contexto de esforços nacionais anticorrupção, a ANEEL implementou uma série de medidas de transparência e fortes arranjos institucionais. A ANEEL garante transparência na tomada de decisão através de seus procedimentos de consulta e da transmissão on-line das reuniões da diretoria. Os Indicadores da OCDE de 2018 sobre Governança dos Reguladores Setoriais mostram que a ANEEL tem a melhor pontuação de independência entre os reguladores de energia, indicando um alto número de salvaguardas formais de independência, o que é considerado uma boa prática. Para garantir a prestação de contas de seus processos, a ANEEL realiza consultas sobre as decisões, publica uma enorme quantidade de dados e fornece relatórios sobre o progresso de acordo com seus indicadores estratégicos.

Com base nos resultados sólidos desse trabalho e na sua reputação, a ANEEL pode fazer um esforço ainda maior para criar uma cultura de independência em suas relações com os stakeholders do setor e avançar o último passo para se tornar um regulador de referência mundial. Isso exigirá um diálogo transparente com as partes interessadas do setor quanto aos papéis e responsabilidades na concepção e implementação da “modernização do setor”. A ANEEL também precisará definir sua agenda estratégica para além da tomada de decisão técnica e usar sua discricionariedade dentro das exigências legais e técnicas para garantir que as ações regulatórias beneficiem os objetivos da política de longo prazo para o setor. Ao fazer isso, a ANEEL pode promover mudanças que salvaguardem sua autonomia com relação a seus recursos. Por fim, ao conceber e implementar processos, o regulador precisará se concentrar na sua qualidade e nos seus resultados para garantir métodos simplificados de trabalho e evitar a burocratização.

A ANEEL foi a primeira de dez agências reguladoras independentes criadas pelo governo brasileiro entre 1996 e 2005, como parte de um movimento de liberalização e privatização da economia2. A ANEEL regula um setor que leva energia elétrica a 99,8% dos 209 milhões de habitantes do Brasil, num contexto de rápidas mudanças devido ao aumento do investimento privado, reformas de mercado e novas tecnologias3. As principais funções estatutárias da ANEEL são:

  • Regular a prestação de serviços através de detentores de concessão, permissão e autorização e implementar políticas e diretrizes do governo federal;

  • Estabelecer tarifas de distribuição, transmissão, interligações e geração de energia hidrelétrica sujeitas ao regime de cotas4;

  • Definir procedimentos licitatórios e gerenciar concessões, permissões e autorizações;

  • Mediar e arbitrar controvérsias;

  • Promover o acesso universal à energia elétrica;

  • Fiscalizar a prestação de serviços e monitorar o cumprimento da legislação de defesa da concorrência;

  • Fazer cumprir a legislação do setor e impor multas e outras penalidades.

A ANEEL tem um amplo mandato dentro do setor elétrico brasileiro que se manteve estável ao longo do tempo. Desde sua criação em 1996, a ANEEL é responsável pela regulação e fiscalização do setor elétrico e desempenha uma variedade de funções. A mudança mais notável em seu mandato desde 1996 é a transferência do papel de poder concedente de concessões, permissões e autorizações para o Ministério de Minas e Energia – MME, como parte das reformas de 2004. A mudança foi motivada por considerar que a outorga de concessões para serviços públicos deveria ficar a cargo do Poder Executivo e não das agências reguladoras. Entretanto, a ANEEL ainda desempenha uma série de funções por delegação do ministério, tais como a organização de leilões e a gestão de concessões, permissões e autorizações. Ela realiza essas responsabilidades dentro das diretrizes e do plano de outorgas, conforme estabelecido pelo MME.

Uma variedade de poderes regulatórios corresponde às funções da ANEEL na regulação dos serviços de energia elétrica. A ANEEL realiza a regulação e a fiscalização da produção, transmissão, distribuição e comercialização de energia elétrica no Brasil. Através de seus três departamentos de fiscalização, a ANEEL supervisiona o cumprimento das normas técnicas e operacionais, os prazos de implementação e a situação financeira e econômica das empresas. A ANEEL tem amplos poderes para executar suas diferentes funções e pode impor uma variedade de penalidades às empresas para fazer cumprir a legislação do setor, desde advertências até multas e cassação de concessões e permissões.

As partes interessadas consideram a ANEEL um regulador transparente e competente, mas o público em geral, em grande medida, desconhece o papel da ANEEL no setor. As partes interessadas destacam o processo decisório transparente através de reuniões da diretoria abertas ao público e transmitidas ao vivo no site do órgão. O quadro de pessoal da ANEEL é geralmente considerado bem qualificado e os colaboradores têm orgulho de trabalhar na ANEEL. Entretanto, a grande maioria do público em geral desconhece o papel do órgão. Uma pesquisa de 2019 entre os consumidores residenciais sobre satisfação do consumidor constatou que apenas 12,8% estavam cientes do papel da ANEEL no setor. Essa falta de conhecimento do público pode fazer com que os consumidores não estejam cientes do potencial papel da ANEEL para atender às reclamações com a empresa de distribuição. Isso também pode limitar a capacidade da ANEEL de envolver todos os consumidores no processo regulatório.

Os planos para a modernização do setor elétrico representam novos desafios para a ANEEL, pois o órgão precisa facilitar mudanças no marco regulatório e, ao mesmo tempo, dar previsibilidade. O setor elétrico brasileiro está passando por muitas mudanças ao mesmo tempo. A geração distribuída, a liberalização do mercado de fornecimento, as novas tecnologias e o afastamento da energia hidrelétrica estão transformando o cenário do setor. Nesse contexto, a ANEEL enfrenta a difícil tarefa de garantir previsibilidade e confiabilidade, e precisará ajustar sua estrutura regulatória para atender ao ambiente dinâmico do setor. Há um risco de que a regulação fique aquém ou mesmo dificulte a inovação. Isso pode ser agravado por um contexto de alta complexidade dos procedimentos regulatórios em comparação com os países membros da OCDE (e outros países não membros). Além disso, ao entrar em novas áreas regulatórias nas quais os marcos legais nem sempre estão claramente definidos, a ANEEL terá de se orientar dentro de uma margem maior de discricionariedade regulatória. Isso representa o desafio de equilibrar interesses sem perder de vista a identidade da ANEEL como regulador independente.

Embora o mandato da ANEEL tenha permanecido estável, a expansão do setor levou a um aumento das atividades da ANEEL e poderia, em última instância, exceder seus recursos. Embora as funções e poderes do regulador não tenham mudado tanto ao longo do tempo, a expansão do setor elétrico tem afetado a execução dessas funções na prática. Nos últimos anos, as atividades da ANEEL de autorização de produtores independentes de energia aumentaram, enquanto o Ambiente de Contratação Livre – ACL, por exemplo, cresceu5, e um setor em expansão significa que a ANEEL tem de supervisionar um número maior de atividades. Embora isso incentive a ANEEL a melhorar a eficiência dos processos e demonstre a agilidade do órgão, um aumento da demanda para além dos seus meios poderia diminuir sua capacidade de cumprir todos os seus objetivos.

  • Iniciar um esforço para definir uma abordagem regulatória abrangente e inovadora que coloque a ANEEL como um dos principais motores da modernização do setor. O esforço pode começar com a missão e os valores já definidos pela agência (incluindo sua independência). A abordagem regulatória conectará a missão e os valores da agência à visão de longo prazo, definindo uma abordagem que delineia como a ANEEL se baseará no seu papel pioneiro entre as instituições públicas brasileiras para promover uma regulação ágil, facilitar a inovação setorial, simplificar os processos e reduzir a burocracia e a burocratização. A abordagem regulatória deve ser informada pela análise do mercado futuro e pela análise da prontidão e capacidade organizacional da ANEEL para reagir às tendências previstas e, principalmente, para gerar os resultados desejados do setor vinculados aos objetivos estratégicos da ANEEL. Isso indicará como a ANEEL fará valer sua tomada de decisão discricionária no meio-termo entre a formulação de políticas e o nível técnico. A ANEEL deve estar ciente da sua margem de discricionariedade dentro das exigências legais, econômicas e técnicas, a fim de direcionar os resultados setoriais para os objetivos finais do órgão em apoio às metas das políticas do Brasil. Esse esforço deve ser liderado pela diretoria com o apoio dos colaboradores e incluir todas as superintendências da agência, consultando as partes interessadas, possivelmente como parte do próximo exercício de planejamento estratégico do órgão. Uma vez que a ANEEL tenha definido sua visão de longo prazo e abordagem regulatória abrangente, o exercício normal de planejamento estratégico da ANEEL pode se encarregar de identificar prioridades durante o próximo período regulatório.

  • Definir uma estratégia e atividades para comunicar a abordagem regulatória abrangente da ANEEL tanto aos colaboradores internos da organização quanto às partes interessadas externas. Esse esforço de comunicação poderia criar previsibilidade em relação à abordagem regulatória da agência e garantir que a abordagem seja completa e continuamente aplicada na execução de todas as atividades regulatórias.

  • Monitorar, em colaboração com o Poder Executivo, o escopo das funções e atividades da ANEEL num setor elétrico em expansão, a fim de garantir que as responsabilidades da ANEEL correspondam a seus recursos. A ANEEL poderia realizar uma reunião periódica com o Poder Executivo para discutir o rol de responsabilidades da ANEEL no setor, bem como o impacto previsto que a evolução do mercado pode ter no nível geral das atividades regulatórias. A ANEEL deve comparecer a essas reuniões com a análise de cenários em mãos e um forte senso de como as futuras mudanças, o escopo organizacional e a capacidade organizacional trarão riscos e afetarão a capacidade da ANEEL de cumprir suas funções.

  • Construir uma maior consciência no seio da sociedade sobre o papel da ANEEL como regulador econômico no setor elétrico brasileiro e sobre o papel dos reguladores econômicos na economia em geral. Para conscientizar a sociedade, a ANEEL poderia:

    • Estabelecer proativamente um diálogo com as principais organizações representativas para esclarecer o papel da ANEEL;

    • Iniciar uma campanha de conscientização pública para informar os consumidores sobre o papel da ANEEL na solução de controvérsias e envolvê-los no processo regulatório; e

    • Desenvolver um sistema de mensagens e uma campanha com os reguladores econômicos brasileiros para informar sobre o papel e as contribuições das agências para a economia do país e para a vida dos seus cidadãos.

A ANEEL define e comunica seus objetivos estratégicos, missão e visão através de um processo transparente e inclusivo. A ANEEL define seus objetivos, missão e visão antes de um novo ciclo estratégico no chamado Mapa Estratégico, que é uma visualização do seu planejamento estratégico. A missão da ANEEL permanece inalterada desde sua criação, refletindo a finalidade definida em seu decreto de criação, enquanto sua visão mudou ligeiramente em comparação com o ciclo estratégico anterior (ver Figura 1). A ANEEL agrupa os diferentes objetivos estratégicos de acordo com as perspectivas 'resultados', 'processos' e 'pessoas e recursos'. A ANEEL combina seus objetivos estratégicos com iniciativas e indicadores estratégicos para traduzir os objetivos em ações e metas mensuráveis. No ciclo estratégico 2018-2021, a ANEEL vincula seus objetivos estratégicos a 61 indicadores estratégicos, os quais ela monitora regularmente e informa em seu relatório anual. A ANEEL garantiu a prestação de contas do processo criando um plano de comunicação e o uso de entrevistas com associações, atores do setor, colaboradores e ex-membros da diretoria. Essas medidas, destinadas a fortalecer a transparência e a inclusão, melhoram a legitimidade do processo de planejamento estratégico.

A ANEEL avalia regularmente seu planejamento estratégico, mas raramente revisa objetivos estratégicos durante seu ciclo. Embora a ANEEL tenha a capacidade de rever seu planejamento estratégico com frequência, o órgão geralmente opta por não mudar seus objetivos estratégicos durante um ciclo estratégico. A ANEEL participa de um processo de revisão anual e tem o poder de rever os objetivos, iniciativas e indicadores a qualquer momento. Entretanto, as revisões anuais geralmente resultam apenas em mudanças nas iniciativas e indicadores ligados aos objetivos, não aos objetivos em si. Por isso, na maioria dos casos, os objetivos estratégicos permanecerão os mesmos durante todo o ciclo estratégico de quatro anos. Essa prática garante um compromisso mais confiável com a direção estratégica de longo prazo, mas pode haver um potencial risco de tendência em manter o status quo no contexto de um setor em rápida transformação.

O grande número de objetivos estratégicos pode prejudicar o foco nas metas estratégicas da ANEEL em suas operações do dia a dia, e os objetivos se concentram principalmente em processos e recursos. No mapa estratégico para o período 2018-2021, o terceiro ciclo estratégico, a ANEEL elenca dezesseis objetivos. Apenas dois dos objetivos estratégicos se concentram nos resultados das ações da ANEEL em termos de resultados setoriais. Os outros quatorze objetivos se concentram em processos e gestão de recursos (ver Tabela 1). Aliada ao fato de não haver mais priorização entre os objetivos, essa mistura de objetivos poderia resultar eventualmente na falta de uma agenda clara de mudanças para os colaboradores sobre para onde a organização gostaria de ir, bem como na falta de foco nos resultados. Os recursos tendem a ser escassos e, portanto, um conjunto muito amplo de objetivos estratégicos, em sua maioria voltados para dentro, poderia tornar mais difícil identificar quais atividades deveriam receber o maior grau de atenção. Como os objetivos podem às vezes estar em conflito entre si6, um planejamento estratégico mais focado, baseado em critérios objetivos, pode melhorar a orientação estratégica nas atividades da ANEEL.

  • Esclarecer as metas da ANEEL no setor elétrico através de uma agenda estratégica abrangente e inovadora que destaque um número limitado de objetivos estratégicos principais que a ANEEL pretende atingir no próximo período estratégico. Ao formular seus principais objetivos estratégicos, a ANEEL também poderia discutir sua visão sobre o que espera que um futuro sistema elétrico possa trazer, tanto em termos de resultados quanto de desafios. As discussões devem ser conduzidas por um funcionário ou funcionários de alto escalão da ANEEL e envolver todas as superintendências e equipes dentro do órgão para darem suas contribuições e assumirem os objetivos. O resultado deve ser compartilhado e consultado com as partes interessadas.

  • Aumentar o foco nos objetivos estratégicos da ANEEL para permitir a priorização das atividades e melhorar a eficiência e a consistência das ações da ANEEL. O aumento do foco poderia resultar, por exemplo, na limitação ainda maior do número de objetivos ou na criação de níveis de priorização de objetivos estratégicos para identificar os objetivos mais importantes. Nesse esforço, a ANEEL deve:

    • Consultar as partes interessadas sobre os objetivos estratégicos que elas consideram mais importantes;

    • Avaliar os eventuais ganhos de bem-estar que os diferentes objetivos estratégicos poderiam trazer; e

    • Utilizar critérios objetivos para restringir o foco dos objetivos estratégicos e evitar (a percepção de) subjetividade no processo.

A ANEEL opera num ambiente institucional complexo com uma multiplicidade de órgãos intervenientes, o que pode resultar em tensões involuntárias e coordenação insuficiente. Tabela 2 mostra os diferentes órgãos públicos envolvidos e suas principais responsabilidades no setor elétrico brasileiro. A variedade de instituições pode afetar a efetividade da estrutura geral se não houver clareza de papéis ou mecanismos de coordenação apropriados. O processo de outorga de concessões exemplifica a complexidade da estrutura institucional com relação a funções específicas. Muitos dos diferentes atores compartilham responsabilidades ao longo do processo que tendem a variar conforme os tipos de concessões (Tabela 2). A relação da ANEEL com o Operador Nacional do Sistema Elétrico – ONS e a Câmara de Comercialização de Energia Elétrica – CCEE também mostra que pode haver uma dupla função para a ANEEL na sua interação com outros órgãos: a ANEEL coopera com ambas as organizações na execução de tarefas, mas também supervisiona e regula suas operações. Isso pode criar tensões involuntárias nas relações com o ONS e a CCEE. Entretanto, existem de fato alguns mecanismos de coordenação. Mais especificamente, o Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico – CMSE oferece um mecanismo de coordenação entre vários órgãos setoriais7 na área de segurança e continuidade do fornecimento.

A sobreposição de competências e a insuficiente clareza de papéis entre a ANEEL e outras agências federais acrescentam outro nível de complexidade à estrutura institucional. A ANEEL compartilha responsabilidades com a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustível – ANP na regulação dos combustíveis fósseis usados na geração de energia elétrica. As atividades de ambas as agências reguladoras se tornam mais interligadas com o aumento da geração de energia térmica, mais especificamente a partir do gás natural. A agência também compartilha responsabilidades com a Agência Nacional de Águas – ANA e o Conselho Administrativo de Defesa Econômica – CADE na área de geração de energia hidrelétrica e análise de fusões. Em alguns casos, certos aspectos da cooperação são formalizados através de acordos, como é o caso do CADE e da ANP. Entretanto, pode faltar clareza de papéis em alguns casos. Uma decisão do Tribunal de Contas da União – TCU em 2020 evidencia isso. O TCU concluiu que algumas hidrelétricas de menor porte não foram fiscalizadas, pois diferentes interpretações da legislação levaram tanto a ANEEL quanto a ANA a concluir que a outra agência era responsável. Neste caso, o TCU informou a ambas as partes que a ANEEL era, em última instância, responsável pela fiscalização das hidrelétricas de menor porte.

  • Defender junto ao MME e outros órgãos públicos a necessidade de criar plataformas de coordenação setorial, tais como reuniões setoriais periódicas e redes de partes interessadas, e promover reuniões bilaterais com outros órgãos setoriais. A ANEEL poderia usar as plataformas de coordenação e reuniões bilaterais para discutir a clareza de papéis e responsabilidades, bem como pontos de contato, e avaliar a necessidade de formalizar as relações em acordos e memorandos de entendimento. Tais mecanismos atenderiam à necessidade de maior coordenação, dada a complexidade da estrutura do setor, a multiplicidade de órgãos e o contexto dinâmico do setor.

  • Criar mecanismos formais de coordenação com a ANP, tais como reuniões formais trimestrais entre os dois órgãos, para discutir sobre as áreas de competência compartilhada. A ANEEL e a ANP também podem usar esse mecanismo formal de coordenação para avaliar se certas funções regulatórias no setor de gás natural devem passar para a ANEEL, a fim de melhorar a consistência e a efetividade das estruturas regulatórias. A interação frequente entre ambos os órgãos reguladores pode promover o compartilhamento de conhecimentos e melhores práticas, e ambos os reguladores poderiam iniciar um diálogo para analisar onde a integração de funções poderia trazer eficiência. A ANEEL também poderia considerar estender essa prática a outros reguladores ativos no setor elétrico, tais como a ANA.

  • Considerar a criação de outros mecanismos de resolução de conflitos, tais como a consulta a terceiros ou (como último recurso) a revisão judicial, em áreas de sobreposição de competências com outros órgãos. Isso permitiria que a ANEEL pudesse resolver quaisquer diferenças de pontos de vista e evitar eventuais impasses. Além de mecanismos mais formais, a ANEEL também deve procurar participar de discussões com todas as partes envolvidas caso surjam zonas cinzentas ou interpretações conflitantes da legislação.

A delegação das atividades da ANEEL aos reguladores estaduais brasileiros tem o potencial de aumentar a eficácia da regulação, dada a dimensão do país e a heterogeneidade das regiões. A cooperação aproxima a regulação de empresas e consumidores em todas as áreas do Brasil e libera os recursos humanos da ANEEL para outras atividades. Os reguladores estaduais mencionam que a cooperação é boa para sua reputação como regulador e que eles se beneficiam das atividades de capacitação da ANEEL. Desde 2020, a ANEEL mantém “Contratos de Metas” com nove reguladores estaduais. Com quatro outros reguladores estaduais, a agência tomou medidas para cooperação através da celebração de acordos de cooperação ou de interesse. A ANEEL pode delegar certas atividades de supervisão, sanção e arbitragem aos reguladores estaduais, mas isso só pode ser feito se eles atenderem a certos critérios relativos à sua governança e autonomia para assegurar uma tomada de decisão independente.

Não existe um processo uniforme para a execução de tarefas delegadas pelos reguladores estaduais e seu nível de capacitação e governança varia, dificultando a efetividade da delegação. Embora o processo de cooperação seja formalizado através de um processo uniforme de três etapas, conforme determina a Resolução Normativa nº 417/2010, a execução das tarefas reguladas varia entre os reguladores estaduais. Os reguladores estaduais também variam muito em termos de autonomia, processos decisórios, instrumentos regulatórios e qualificação de pessoal. Essa falta de uniformidade pode afetar a implementação das tarefas delegadas e a eficiência que a delegação de atividades acarreta para a ANEEL. Os reguladores estaduais podem nem sempre estar suficientemente preparados para as tarefas, o que significa que a ANEEL precisa incorporar verificações extras ou reimplementar certos elementos das atividades delegadas.

  • Investir em treinamento e padronização de processos para garantir uma alta qualidade e execução consistente das tarefas delegadas, alocando uma parte específica do orçamento da ANEEL para esse objetivo. Ao padronizar os processos, a ANEEL poderia viabilizar a consistência através do desenvolvimento de manuais e formatos para a execução de atividades de supervisão, sanção e arbitragem. A agência também poderia promover discussões para compartilhar experiências e práticas entre os reguladores estaduais que mantêm um acordo de cooperação, por exemplo, através de reuniões temáticas regulares para os reguladores estaduais viabilizadas pela ANEEL.

  • Conduzir uma análise comparativa das competências e arranjos de governança dos reguladores estaduais, em cooperação com outros órgãos federais (por exemplo, a Controladoria Geral da União – CGU) com o objetivo de avançar em direção a um patamar de igualdade nas competências e capacidades dos reguladores estaduais. Tais análises e dados devem ser compilados em colaboração com os reguladores estaduais e podem ser usados como subsídio para programas de capacitação em nível federal.

  • Pressionar por melhorias nos processos decisórios e no desempenho dos reguladores estatais com os quais mantém acordos de cooperação para aumentar a efetividade da delegação de tarefas. Nesse esforço, a ANEEL poderia considerar a promoção, juntamente com outros reguladores federais que cooperam com os reguladores estaduais, do alinhamento necessário de poderes. Os reguladores federais poderiam criar um conjunto de ferramentas de desempenho regulatório para os reguladores estaduais, definindo as melhores práticas para o desempenho organizacional e regulatório. A ANEEL também poderia avaliar o papel que a Associação Brasileira de Agências Reguladoras (ABAR) poderia desempenhar no desenvolvimento de uma abordagem mais unificada da regulação da energia elétrica entre as agências reguladoras estaduais.

  • Dialogar com os reguladores estaduais com os quais não mantêm um acordo de cooperação atualmente para comunicar os ajustes necessários nas estruturas de governança e competências que poderiam permitir a delegação de tarefas no futuro. Para isso, a ANEEL poderia organizar reuniões abertas para os reguladores estaduais interessados na cooperação para informá-los sobre os requisitos e procedimentos.

A ANEEL interage estreitamente com o Ministério de Minas e Energia: a agência contribui para a implementação de políticas e diretrizes federais e fornece subsídios para o processo de formulação de políticas. As amplas responsabilidades da ANEEL no setor exigem interações regulares com o ministério. Embora não seja uma função estatutária da ANEEL, o órgão também contribui regularmente para o processo de formulação de políticas, definindo uma posição institucional e fornecendo subsídios e sugestões de texto para projetos de lei relacionados ao setor elétrico. Mediante convite, a ANEEL esporadicamente manifesta sua posição sobre projetos de lei ao Poder Legislativo.

A ANEEL é capaz de criar novas regras para o setor, mas pode nem sempre haver clareza suficiente sobre os respectivos papéis em relação ao ministério. Uma função central de muitos reguladores econômicos independentes é apresentar novas regras. A ANEEL tem o poder de expedir atos regulatórios dentro do setor para garantir o cumprimento da Lei nº 9.074/1995 e outras normas relevantes. A agência criou novas regras em certas áreas, tais como a geração distribuída e a adoção de uma tarifa variável de energia elétrica, com consequências sociais e redistributivas. No caso da regulação da geração distribuída, a falta de incentivos para a geração de energia renovável em pequena escala, ao contrário das tendências internacionais, motivou o regulador a propor a regulação. A agência está atualmente em processo de revisão dessa resolução8. Existe uma percepção entre algumas partes interessadas de que a ANEEL – em alguns casos, ao intervir para preencher a lacuna deixada por uma legislação pouco clara – assumiu um papel mais ativo na elaboração de regras específicas do que o inicialmente previsto. A falta de clareza de papéis na área de novos assuntos regulatórios poderia confundir as linhas que separam a regulação da ANEEL da formulação de políticas pelo ministério.

  • Aproveitar os mecanismos de coordenação existentes, tais como reuniões setoriais e bilaterais, para discutir o impacto de um contexto setorial em transformação na clareza de papéis. A ANEEL deve argumentar que a clareza de papéis é um tema prioritário para discussão no âmbito da iniciativa de modernização do setor.

  • Participar de discussões regulares com o MME para discutir novos assuntos regulatórios e identificar antecipadamente quaisquer zonas “cinzentas” potencialmente problemáticas na fronteira entre a formulação de políticas e a regulação econômica. Nessas discussões, a ANEEL deve assegurar que suas responsabilidades nessas zonas cinzentas estejam de acordo com sua identidade própria como regulador econômico independente.

  • Assegurar a clareza de papéis através de uma definição clara das competências e tarefas que são delegadas à ANEEL pelo MME. A ANEEL poderia comunicar publicamente essa definição de competências e tarefas às partes interessadas para evitar a percepção de que existe uma confusão na linha que separa a formulação de políticas e a regulação econômica da ANEEL.

A ANEEL construiu uma reputação de integridade num contexto caracterizado pela luta contra a corrupção nos setores de infraestrutura do Brasil. Constituem motivos importantes para delegar tarefas a uma agência reguladora independente aumentar a credibilidade dos compromissos da política de longo prazo no setor e criar a confiança de que as decisões são tomadas com integridade. A regulação independente pode criar estabilidade e confiança e, entre outras coisas, diminuir a incerteza para que as empresas invistam no setor. Entretanto, a delegação de poderes significativos de regulação e fiscalização a agências reguladoras independentes, fora da supervisão hierárquica direta dos ministérios, não foi isenta de controvérsia no Brasil no momento da criação da ANEEL, coincidindo com um período de grande turbulência no Brasil. Tem sido difícil chegar a um consenso sobre o tema da autonomia num contexto em que escândalos de corrupção corroeram a confiança nas instituições democráticas. A falta de consenso pode afetar a experiência de independência dos reguladores na prática e os reguladores brasileiros foram confrontados com a difícil tarefa de construir uma reputação de integridade. Para isso, embora os escândalos de corrupção tenham impactado os setores de infraestrutura brasileiros, a ANEEL deu grande ênfase à transparência de seus processos e vinculou um de seus objetivos estratégicos à garantia de sua autonomia.

A ANEEL tem muitos arranjos de jure em vigor para salvaguardar a independência do órgão, mas, quanto aos reguladores em geral, sua independência pode ser comprometida por “gargalos” no seu ciclo de vida. A ANEEL tem a melhor pontuação de independência em comparação com os reguladores de energia dos países membros e não membros da OCDE incluídos nos Indicadores da OCDE de 2018 sobre Governança dos Reguladores Setoriais, que apontam diversas boas práticas em termos de arranjos formais de independência (ver Figura 2.1 para a pontuação de independência dos reguladores de energia). A ANEEL recebe orientação do governo sobre sua estratégia de longo prazo, mas não sobre seu programa de trabalho, decisões ou recursos. Somente o tribunal é capaz de decidir derrubar as decisões do regulador ou dispensar sua liderança no caso de uma sentença judicial, condenação ou violação das proibições legais. Essas medidas podem atuar como um reforço contra a influência indevida no trabalho do dia a dia da ANEEL. Entretanto, na prática, os arranjos de jure não serão suficientes e precisam ser complementados por uma forte cultura e independência de facto. Além disso, a independência nunca é dada ou estática, e pode ser colocada sob tensão em diferentes “gargalos” quando a pressão política ou a influência indevida é sentida como sendo maior. Principalmente num contexto de significativa propriedade pública no setor elétrico e uma forte interligação entre tarifas de energia elétrica e política social, proteger o processo decisório da ANEEL contra influências indevidas será essencial para salvaguardar sua independência de facto.

  • Dialogar com as partes interessadas governamentais e não governamentais para demonstrar a importância da independência da ANEEL como regulador do setor como um meio de melhorar o ambiente de investimento e os resultados do mercado. O diálogo proativo pode ajudar a aumentar a compreensão do papel da ANEEL e ajudar a manter a independência de jure and de facto. Nesse esforço, a ANEEL poderia prestar informações sobre o desempenho do órgão até o momento e discutir o papel que sua independência desempenha na entrega de resultados do setor. Esses esforços sustentariam a criação de uma cultura geral de independência para as agências reguladoras no Brasil.

  • Promover, junto a outras agências independentes de regulação e supervisão, medidas adicionais que poderiam melhorar a independência de facto que as agências experimentam na prática. Dependendo do assunto em questão, a ANEEL poderia considerar divulgar publicamente suas opiniões sobre questões de independência e usar a mídia para chamar a atenção para elas, se necessário. Ações e posições como essas permitiriam que a ANEEL continuasse a fortalecer uma cultura de independência, tanto dentro do órgão quanto em suas relações com as partes interessadas, com base numa abordagem regulatória abrangente e inovadora.

O orçamento operacional da ANEEL é financiado através de uma taxa regulatória cobrada da indústria e o governo pode reter uma parte da receita dessa taxa. A ANEEL é financiada através da Taxa de Fiscalização de Serviços de Energia Elétrica – TFSEE, fixada em lei. A taxa é baseada na receita anual da empresa e está atualmente fixada em 0.4% do “benefício econômico” anual de uma empresa (o cálculo varia entre segmentos do setor, envolvendo receita menos energia e taxas de acesso). A ANEEL define a metodologia de cálculo para pagamento, fixada anualmente, e as concessionárias, permissionárias e autorizadas estão sujeitas ao pagamento da taxa. O orçamento da ANEEL é tratado dentro do orçamento nacional e o governo retém uma parte significativa das receitas da taxa (tanto ex ante quanto ex post, através de mecanismos discutidos com mais detalhes abaixo). Por exemplo, em 2019, 61% das receitas da TFSEE (Tabela 3) foram destinadas para o orçamento operacional da ANEEL, sendo que o restante foi retido pelo governo. Além das receitas da taxa, a ANEEL também cobra multas, penalidades e taxas de Uso de Bem Público – UBP. Esses recursos são destinados à Conta de Desenvolvimento Energético – CDE, administrada pela CCEE, e não financiam as operações da ANEEL. Do total de recursos arrecadados pela ANEEL, a maior parte é destinada à CDE (multas, penalidades e UBP), enquanto a taxa do setor (TFSEE) representa 41% dos recursos arrecadados.

O governo e o parlamento têm a oportunidade de afetar o orçamento da ANEEL durante todo o ciclo orçamentário, criando incerteza e comprometendo a independência financeira da ANEEL. Como a maioria dos reguladores, a ANEEL integra seu processo de planejamento financeiro nos instrumentos fiscais e orçamentários nacionais. O planejamento começa na ANEEL, quando a agência consolida propostas para necessidades orçamentárias departamentais num único plano de negócios anual. O plano de negócios torna-se a proposta orçamentária da ANEEL, incluída com os orçamentos de agências governamentais e ministérios pelo Ministério da Economia na Lei Orçamentária Anual (LOA). O Ministério da Economia tem o poder de ajustar a proposta orçamentária da ANEEL no projeto de LOA posteriormente enviado ao Congresso. Quando o Congresso analisa a lei, tem o poder de aumentar e diminuir os orçamentos propostos (embora certas despesas, tais como salários para funcionários do governo, não possam receber emendas). Após a aprovação do Congresso e assinatura dos decretos de execução orçamentária pelo Presidente, o Presidente e o Ministério da Economia podem ajustar o orçamento da ANEEL (novamente, com exceção de certas despesas, tais como salários), expedindo novos decretos. Um acordo orçamentário com diversas oportunidades para cortes vai contra os Princípios de Melhores Práticas da OCDE sobre Governança de Reguladores, os quais afirmam que acordos de financiamento plurianuais seguros protegem o regulador de cortes orçamentários politicamente motivados (ver Gestão de recursos financeiros).

O governo e o parlamento têm a oportunidade de afetar o orçamento da ANEEL durante todo o ciclo orçamentário, criando incerteza e comprometendo a independência financeira da ANEEL. Como a maioria dos reguladores, a ANEEL integra seu processo de planejamento financeiro nos instrumentos fiscais e orçamentários nacionais. O planejamento começa na ANEEL, quando a agência consolida propostas para necessidades orçamentárias departamentais num único plano de negócios anual. O plano de negócios torna-se a proposta orçamentária da ANEEL, incluída com os orçamentos de agências governamentais e ministérios pelo Ministério da Economia na Lei Orçamentária Anual (LOA). O Ministério da Economia tem o poder de ajustar a proposta orçamentária da ANEEL no projeto de LOA posteriormente enviado ao Congresso. Quando o Congresso analisa a lei, tem o poder de aumentar e diminuir os orçamentos propostos (embora certas despesas, tais como salários para funcionários do governo, não possam receber emendas). Após a aprovação do Congresso e assinatura dos decretos de execução orçamentária pelo Presidente, o Presidente e o Ministério da Economia podem ajustar o orçamento da ANEEL (novamente, com exceção de certas despesas, tais como salários), expedindo novos decretos. Um acordo orçamentário com diversas oportunidades para cortes vai contra os Princípios de Melhores Práticas da OCDE sobre Governança de Reguladores, os quais afirmam que acordos de financiamento plurianuais seguros protegem o regulador de cortes orçamentários politicamente motivados (ver Gestão de recursos financeiros).

Além disso, os decretos governamentais podem desviar recursos da taxa de recuperação de custos do órgão para o orçamento geral do governo e reduzir ainda mais a previsibilidade de financiamento da ANEEL. Tais “decretos de contingenciamento” permitem ao governo redirecionar as receitas dentro de um ano fiscal para corrigir um desequilíbrio orçamentário. O órgão informa que esses cortes governamentais ocorrem com frequência e sem aviso prévio, e a ANEEL se prepara para eventuais restrições, definindo cursos de ação para diferentes cenários orçamentários em seu plano de gestão de riscos. O orçamento anual da ANEEL aumentou de modo geral nos últimos anos (com um aumento de 5 a 6% no orçamento operacional a cada ano de 2016-2019), mas a ANEEL passou por cortes no orçamento nos últimos anos suficientemente significativos para forçar a agência a suspender determinados serviços. Por exemplo, dois cortes orçamentários em 2016 reduziram o orçamento da ANEEL em mais da metade. Entretanto, a ANEEL informa que tem defendido com sucesso junto ao Ministério da Economia a manutenção de um orçamento saudável nos últimos anos. Entretanto, existe o risco de que restrições e contingenciamentos orçamentários possam novamente cortar o financiamento de que a ANEEL precisa para desempenhar suas funções no futuro.

  • Continuar a defender a retenção das receitas necessárias para o desempenho de suas funções, garantindo que as taxas cobradas do setor não sejam desviadas e que a ANEEL possa continuar a cumprir suas funções ao longo dos ciclos orçamentários. Embora o orçamento operacional anual da ANEEL tenha aumentado ano a ano, existe o risco de que restrições e contingenciamentos orçamentários possam cortar o financiamento de que a ANEEL precisa para desempenhar suas funções. Em sua defesa, a ANEEL poderia destacar a importância de se fixar taxas do setor que reflitam seus custos e de se criar um processo delimitado para alocar fundos ao órgão. Isso poderia salvaguardar um nível adequado e previsível de financiamento e assegurar que os atores do setor estejam pagando uma taxa “justa”.

  • Defender a criação de um fundo de reserva que aumente a estabilidade e a resiliência do modelo de financiamento do órgão, num contexto de choques no setor e na renda regulatória. O fundo de reserva poderia atuar como uma proteção para compensar as diferenças positivas e negativas entre o orçamento da ANEEL e as receitas de taxas em anos específicos.

  • Promover o diálogo permanente com o governo sobre novos decretos orçamentários, visando maior transparência sobre eventuais decretos e uma “relação sem surpresas” com o governo sobre as mudanças que afetam o orçamento da ANEEL. Esse diálogo poderia envolver não apenas a ANEEL, mas também outras organizações que estão igualmente sujeitas aos efeitos de decretos orçamentários.

  • Comunicar os impactos das restrições orçamentárias do governo e do parlamento, documentando e compartilhando os efeitos sobre as operações e atividades da ANEEL. A ANEEL procurou a imprensa para expor o impacto dos recentes cortes orçamentários, mas poderia aumentar a conscientização do público divulgando essas informações com mais regularidade.

  • Dialogar de maneira regular e sistemática com as partes interessadas envolvidas no planejamento orçamentário à medida que novas ou mais atividades resultem de mudanças no setor. Com o crescimento contínuo previsto para o setor elétrico, será importante para a ANEEL comunicar proativamente a evolução das necessidades do setor. A expansão das atividades do setor pode ter efeitos diferentes no nível de receitas de taxas (como um percentual das receitas do setor) e no nível de atividades regulatórias, o que cria uma necessidade de monitorar esses efeitos coletivamente.

As restrições governamentais impedem a ANEEL de contratar o número de servidores públicos permanentes exigido pela agência, o que levou o órgão a depender ainda mais de profissionais terceirizados nos últimos anos. O quadro de pessoal da ANEEL é composto de três categorias: 1) servidores públicos de carreira aprovados em concursos públicos, 2) servidores comissionados que não passaram por concursos públicos e podem ser indicados e exonerados a seu critério, e 3) colaboradores de apoio administrativo que são profissionais terceirizados sob a responsabilidade das empresas contratadas. O número de servidores públicos que podem ser empregados na ANEEL está estabelecido na legislação, mas o número desse tipo de colaborador está aquém dos números permitidos, devido à disponibilidade restrita de concursos públicos. O Ministério da Economia, encarregado de autorizar as solicitações de realização de concursos públicos, indeferiu a recente realização de concurso alegando preocupações fiscais. Essa prática deixou a ANEEL com um quadro de servidores públicos que representa 89% do número permitido por lei em 2019. As restrições de pessoal da ANEEL só devem aumentar conforme o setor elétrico brasileiro se expande, principalmente nas áreas de regulação e monitoramento. O número total de colaboradores permaneceu praticamente estável nos últimos quatro anos, mas o número de colaboradores de apoio está aumentando, enquanto o número de colaboradores profissionais (incluindo servidores públicos e cargos de alto escalão indicados) diminuiu nos últimos anos (Tabela 4).

O déficit de servidores públicos permanentes é um fator que impulsiona a crescente dependência de colaboradores de apoio e obriga a ANEEL a “fazer mais com menos”. O uso crescente dos serviços de colaboradores de apoio é uma forma de a ANEEL continuar a desempenhar suas funções, mesmo quando o número de servidores públicos empregados pela ANEEL cai (Tabela 4). A ANEEL informa que teve que tomar outras medidas para “fazer mais com menos”, inclusive delegar atividades a agências reguladoras estaduais, credenciar empresas para ajudar nas atividades e aproveitar tecnologia e métodos inovadores como o georreferenciamento em atividades de fiscalização para ajudar os departamentos a melhorar seus processos.

Os servidores públicos da ANEEL são altamente qualificados, com treinamento especializado e vários anos de experiência. Os servidores públicos pertencem a uma determinada família e categoria de trabalho que indica o salário básico e a quantidade de bônus que um colaborador pode receber. Para ocupar um cargo de nível B, o servidor público deve ter mais de 5 anos de experiência relevante e 360 horas de treinamento especializado, ou 8 anos de experiência e 240 horas de treinamento. Para um cargo de nível “especial”, um servidor público deve ter pelo menos 14 anos de experiência e ter concluído um curso de especialização de pelo menos 360 horas, possuir um mestrado e pelo menos 12 anos de experiência relevante, ou possuir um doutorado e ter pelo menos 10 anos de experiência relevante. O número de servidores públicos em cada classe se distancia do nível “A”, mostrando que os servidores públicos da ANEEL tendem a ter treinamento e experiência significativos (Tabela 5).

O número de homens supera o número de mulheres em todas as categorias – alta administração, servidores públicos de departamentos técnicos ou administrativos e colaboradores de apoio – e falta na ANEEL um programa abrangente de diversidade e inclusão. 37% dos colaboradores são mulheres (Tabela 6). O desequilíbrio de gênero é maior na categoria de colaboradores de alto escalão, onde apenas um pouco mais de um quarto dos colaboradores são mulheres. A ANEEL aborda a paridade de gênero na categoria de colaboradores de apoio e servidores públicos nos departamentos administrativos, onde quase metade dos colaboradores são mulheres. A ANEEL tomou as primeiras medidas para implementar atividades de diversidade, instituindo treinamento em diversidade e trabalhando para formar um comitê interno de diversidade, mas ainda falta um programa integrado de diversidade e inclusão.

O programa de treinamento da ANEEL ajuda a desenvolver seus colaboradores e algumas competências essenciais poderiam ser beneficiadas por mais treinamento. Com um orçamento anual de treinamento de mais de 500 mil euros, a ANEEL tem sido capaz de fornecer treinamento a 95% dos seus colaboradores. A agência oferece treinamento a todos os colaboradores em cinco áreas: integridade, metodologias de gestão, transformação digital, visão sistêmica e relacionamentos. Em alguns casos, a ANEEL patrocina a educação continuada dos colaboradores, por exemplo, com mestrados. Além desse treinamento profissional, a ANEEL também investiu em treinamento técnico para análise de impacto regulatório, em cooperação com a Universidade de Brasília. A ANEEL também oferece treinamento em análise de dados e alfabetização de dados. Entretanto, a ANEEL enfrenta o mesmo desafio que muitos reguladores, com o número de colaboradores com habilidades analíticas especializadas ficando aquém das necessidades da agência.

Num setor em que os salários nem sempre são competitivos quando comparados ao setor privado, benefícios adicionais tornam o emprego na ANEEL atraente. De acordo com o órgão, os salários são menos competitivos no nível da alta administração, cuja remuneração normalmente seria mais alta no setor privado. Os servidores públicos têm direito a benefícios além do salário, incluindo a segurança no cargo, educação infantil, auxílio-alimentação, auxílio-transporte e auxílio-saúde. A ANEEL colocou em prática outras iniciativas para melhorar o bem-estar dos colaboradores, tais como a jornada de trabalho flexível. O programa de treinamento da ANEEL também ajuda a construir e reter talentos internos.

Uma maior conexão com o planejamento estratégico poderia assegurar que todos os objetivos dos colaboradores estivessem alinhados com os objetivos estratégicos da agência. O procedimento de avaliação de desempenho individual é o mesmo para servidores públicos e servidores comissionados. O gerente conduz uma avaliação intermediária e uma anual de cada colaborador, identificando as necessidades de desenvolvimento e definindo metas para o próximo período de avaliação. A lei estipula uma série de fatores que devem ser avaliados para os servidores públicos, tais como produtividade e trabalho em equipe. Junto com novas experiências ou qualificações, os resultados da avaliação de desempenho determinam se um colaborador continua para a próxima etapa da carreira, com um aumento proporcional no salário. Os gerentes de alto escalão são avaliados com base nos critérios gerais de gestão estratégica, gestão do desempenho humano, mediação de conflitos internos, negociação, orientação para inovação e mudança, e comunicação gerencial. Embora a avaliação do desempenho dos gerentes de alto escalão tenha um elemento estratégico, a avaliação dos outros colaboradores não está necessariamente vinculada ao planejamento estratégico da agência.

  • Avaliar o déficit exato de colaboradores e de competências e justificar a urgência de aumentar o número de servidores públicos de carreira perante o Poder Executivo tanto formal quanto publicamente. Dar continuidade às reuniões com outras agências federais para compartilhar desafios e refletir sobre a defesa coletiva de assuntos relativos a recursos humanos.

  • Investigar outras medidas de melhoria da eficiência para desempenhar suas funções com um quadro de pessoal limitado, tais como o programa de georreferenciamento existente na ANEEL. A ANEEL pode aproveitar sua participação em redes nacionais e internacionais de reguladores para trocar ideias sobre novas medidas, envolvendo sua equipe de inovação em discussões com outros inovadores. Como parte desse esforço, a ANEEL poderia avaliar se algum dos ajustes em suas práticas regulatórias em resposta à crise da COVID-19 deveria permanecer em vigor para manter formas mais eficientes de trabalho após a recuperação.

  • Continuar a oferecer treinamento personalizado de alta qualidade aos colaboradores da ANEEL para desenvolver o capital humano e oferecer um benefício não financeiro aos colaboradores. Com oportunidades limitadas de recrutamento de novos colaboradores, os esforços da ANEEL para desenvolver seu atual quadro de pessoal adquirem maior importância. Como a ANEEL adota uma abordagem mais “prática” para impulsionar a modernização do setor, a ambição do seu programa de treinamento deve estar à altura das suas ambições para o seu papel no setor. Para isso, o programa de treinamento deve promover o desenvolvimento do capital humano em todos os níveis da agência e nas principais áreas mais urgentes, como a análise de dados. É claro que o treinamento do atual quadro de pessoal somente levará a ANEEL até certo ponto, e será importante que a ANEEL comunique as autoridades competentes quando precisar contratar novos talentos.

  • Aproveitar o sucesso do programa de treinamento para oferecer treinamento direcionado ao desenvolvimento de competências regulatórias. Com o sucesso do treinamento de AIR da ANEEL, um programa de treinamento formal para análise ex post pode facilitar a integração dessa ferramenta. Um treinamento adicional em análise de dados pode ajudar os colaboradores a acompanhar a evolução da abordagem da ANEEL em relação aos dados.

  • Colaborar com as outras agências reguladoras para defender um regime de remuneração para os servidores públicos de alto escalão que seja competitivo com a remuneração do setor. Nesse esforço, a ANEEL poderia conduzir uma análise quantitativa de como seus salários se comparam aos salários do mercado para diferentes níveis hierárquicos e comunicar os resultados publicamente.

  • Revisitar os esforços de diversidade e inclusão da ANEEL com o objetivo de desenvolver uma política eficaz e abrangente de diversidade e inclusão. Embora a ANEEL calcule a distribuição de homens e mulheres na organização, o órgão deve fortalecer sua base de evidências com o objetivo de compreender as necessidades e acompanhar o progresso no sentido de melhorar a igualdade no local de trabalho (tanto para mulheres quanto para outros grupos). De acordo com a Recomendação de 2015 do Conselho da OCDE sobre Igualdade de Gênero na Vida Pública, a política deve definir papéis, responsabilidades e cadeias de comando claras para a fase de implementação. O comitê interno de diversidade da ANEEL é um órgão que poderia proporcionar um nível de responsabilização e supervisão, mas a adesão e a atenção do alto escalão será fundamental para dar peso a suas recomendações. Através do seu programa de diversidade e inclusão, a ANEEL deve tentar compreender as barreiras que impedem as mulheres (e outros grupos) de alcançar cargos de alto escalão e lançar programas para enfrentar essas barreiras (por exemplo, programas de mentoria ou treinamento direcionado de lideranças).

  • Estabelecer uma conexão mais forte entre o trabalho do dia a dia dos colaboradores e o planejamento estratégico da agência. Os objetivos estratégicos visam dar um foco claro no que a organização deseja alcançar, o que também dá clareza às partes interessadas. Entretanto, na prática, os colaboradores da ANEEL podem nem sempre ser capazes de vincular diretamente o planejamento estratégico ao seu trabalho do dia a dia. A falta de vínculo entre o trabalho do dia a dia e o planejamento estratégico pode diminuir a efetividade da agência na consecução dos seus objetivos, pois as ações da agência poderiam se tornar menos previsíveis e não estar completamente alinhadas com os objetivos gerais.

Os três níveis de hierarquia da ANEEL – a diretoria, os chefes de departamento e os líderes de equipe – administram a enorme agência. A ANEEL é dirigida por um Diretor-Geral e quatro diretores. O Diretor-Geral tem o apoio do Gabinete do Diretor-Geral, e a diretoria conta com o apoio da Assessoria da Diretoria e da Secretaria-Geral. A diretoria tem funções executivas e não executivas. Ela toma decisões relacionadas ao funcionamento do dia a dia da organização, define a direção estratégica e tem um papel no monitoramento do desempenho. Além disso, ela profere decisões regulatórias, garante o cumprimento da lei e da política, administra os contratos e analisa os recursos. A diretoria supervisiona vinte e três departamentos enquadrados em sete áreas temáticas: assessoramento e controle da gestão, regulação econômica do mercado e estímulo à competição, relações com a sociedade, outorgas e gestão dos potenciais hidráulicos, fiscalização dos serviços e instalações de energia elétrica, regulação técnica e padrões de serviço, e planejamento e gestão administrativa. Ter níveis hierárquicos limitados aproxima a diretoria do funcionamento do dia a dia da agência, mas a execução de funções executivas e não executivas pode correr o risco de sobrecarregar os recursos da diretoria.

Algumas das atividades da ANEEL envolvem várias equipes e questões abrangentes, mas a estrutura e o tamanho da agência aumentam os riscos de desenvolver silos organizacionais e de não difundir abordagens e cultura compartilhadas. A ANEEL realiza reuniões técnicas envolvendo várias equipes para discutir questões de relevância para todas as equipes. A diretoria também desempenha um papel importante na harmonização de abordagens, formas de trabalho e cultura. Entretanto, numa grande organização com muitos departamentos divididos tematicamente, existe o risco de as atividades ficarem isoladas em silos sem uma interface adequada entre as equipes. Por exemplo, áreas técnicas separadas, cada uma com um alto grau de autonomia operacional, podem favorecer a formação de silos de informação. Além disso, o tamanho da agência pode tornar desafiadora a manutenção de abordagens e formas de trabalho comuns, e o desenvolvimento de uma cultura compartilhada.

Embora a maior parte do quadro de pessoal da ANEEL trabalhe com assuntos regulatórios, existe uma forte presença de colaboradores administrativos e de assessoramento da gestão. A área de Planejamento e Gestão Administrativa, o Gabinete do Diretor-Geral e a área de Assessoramento e Controle da Gestão (que inclui o apoio à diretoria, a Secretaria-Geral, o departamento de relações públicas, a Auditoria Interna, a Procuradoria Federal e a Secretaria Executiva de Leilões) representam juntos cerca de 40% do total de colaboradores (Figura 2)9. Depois de Assessoramento e Controle da Gestão e Planejamento e Gestão Administrativa, a Fiscalização dos Serviços e Instalações de Energia Elétrica é a terceira maior área (para conhecer o organograma completo com o número de colaboradores, ver Figura 2.2).

  • Examinar a distribuição de recursos humanos nos departamentos e entre os departamentos “regulatórios” e “de apoio” para avaliar se mais recursos podem ser direcionados para a execução das principais funções do órgão. Este exercício deve ser realizado de forma transparente e poderia incluir um benchmarking com outros reguladores e órgãos públicos brasileiros para identificar boas práticas.

  • Desenvolver o alinhamento horizontal no nível dos colaboradores e da liderança, a fim de mitigar o risco de inconsistência na tomada de decisão e ineficiências organizacionais. A ANEEL poderia criar várias equipes multifuncionais (com o mesmo espírito da CT-REG). A agência também poderia promover diálogos entre silos para investigar onde existem silos e como superar esses principais silos, tais como entre as superintendências de fiscalização. A ANEEL já fortalece os laços entre as equipes, permitindo o movimento horizontal e melhorando o sistema de gestão de informações para assegurar o compartilhamento de informações/dados entre silos (ver também abaixo). A agência poderia se beneficiar com a criação de cargos para “corretores culturais”, que são colaboradores que se reportam a mais de uma equipe para promover a interação e criar vínculos. No nível da liderança, a ANEEL deve estudar maneiras de fazer com que os gerentes promovam o compartilhamento de ideias entre as equipes. A alternância temporária de líderes em diferentes posições de liderança poderia ajudar os líderes de equipe a compreender os desafios de outras equipes, identificar oportunidades de colaboração e, de modo mais geral, “falar a língua” de outras equipes.

  • Avaliar incentivos para colaboração entre equipes e estabelecer incentivos interfuncionais, por exemplo, usando exemplos de cooperação interdepartamental efetiva para incentivar esse comportamento. Estabelecer metas compartilhadas entre departamentos específicos que incentivem a redução de ineficiências de silos organizacionais. Por exemplo, os departamentos de fiscalização poderiam estabelecer metas interdepartamentais para limitar o número de solicitações duplicadas de informações.

  • Promover a visão compartilhada e a abordagem regulatória abrangente da ANEEL em toda a organização, e assegurar que cada colaborador compreenda e se sinta comprometido com os objetivos compartilhados. Sem uma visão e objetivos compartilhados que permeiem toda a organização, os benefícios do trabalho interfuncional serão limitados e os colaboradores poderão não ser capazes de relacionar suas atividades aos objetivos da organização. Além de envolver os colaboradores na criação de objetivos estratégicos, o que a ANEEL já faz, ferramentas de comunicação contínuas que comunicam o desempenho da ANEEL em relação aos objetivos (tanto os objetivos gerais quanto aqueles relacionados ao trabalho de um número limitado de equipes) podem ajudar os colaboradores a compreender como seu trabalho está promovendo a visão da organização. Para complementar os relatórios de desempenho anuais e trimestrais da ANEEL, e-mails periódicos para os colaboradores, comunicando o progresso e destacando as realizações, ou um painel de indicadores da organização atualizado regularmente, poderiam fornecer informações contínuas aos colaboradores sobre um número limitado de indicadores-chave de desempenho.

Embora os atuais diretores da ANEEL tenham experiência técnica de grande relevância, a politização das indicações de diretores para as agências brasileiras já foi identificada como um problema no passado. O Diretor-Geral e quatro diretores da ANEEL são indicados e, após aprovação do Senado, nomeados para mandatos de cinco anos sem possibilidade de recondução pelo Presidente do Brasil, conforme previsto em lei. Um estudo sugere um número crescente de indicações políticas no início dos anos 2000 nas agências reguladoras federais no Brasil, com um aumento na proporção de indicados sem nenhuma experiência técnica ou acadêmica relevante entre 2002 e 2005. Outro estudo revela que menos da metade dos diretores entre 1997 e 2014 tinha pós-graduação. A lei, atualizada em 2019, não exclui a possibilidade de indicação de diretores com experiência não técnica. Ela formaliza a exigência de formação acadêmica relevante e descreve outros requisitos relacionados ao histórico profissional da pessoa indicada. Ela especifica que a pessoa indicada deve ter reputação ilibada, formação acadêmica relevante e notório conhecimento no campo de sua especialidade. Ela exige que os indicados tenham um certo número de anos de experiência profissional numa das seguintes categorias:

  1. 1. no setor público ou privado no campo de atividade da agência ou em área conexa,

  2. 2. em empresa no campo de atividade da agência em cargo da alta administração,

  3. 3. no setor público em cargo superior ao nível especificado,

  4. 4. como docente ou pesquisador em área relevante, ou

  5. 5. como profissional liberal em área relevante.

Não é raro os governos indicarem diretores de acordo com as afiliações partidárias, o que pode aumentar a agilidade de resposta da agência às solicitações do governo e também pode contribuir para a politização de uma agência. Uma análise da filiação partidária dos diretores em todos os órgãos reguladores federais do setor de infraestrutura revela que uma minoria significativa de indicados está filiada a um partido no momento da nomeação em10: 15% no governo Fernando Henrique Cardoso, 23% no governo Luiz Inácio Lula da Silva, e 15% no governo Dilma Rousseff. A politização da diretoria também pode ocorrer através de vacâncias estratégicas, por meio das quais o Poder Executivo retarda a nomeação de novos diretores. Há evidências de que o Poder Executivo fez uso dessa técnica nos últimos três governos. Todos os atuais diretores possuem experiência relevante no setor ou na regulação e a tomada de decisão pela maioria reduz o risco de que qualquer pessoa indicada possa influenciar a diretoria. Ainda assim, a possibilidade de indicações politizadas (mesmo que seja apenas uma percepção) pode ser um risco para a credibilidade da agência.

A diretoria da ANEEL opera em estreita proximidade com seus departamentos técnicos, delegando atividades regulatórias aos departamentos com forte capacidade técnica e um grau de autonomia, mas mantendo seu papel como autoridade decisória final. Os departamentos elaboram o trabalho técnico da agência, trazendo o produto à diretoria para a votação final, conforme consta das normas organizacionais da ANEEL e está descrito abaixo. Pela lei, algumas competências devem permanecer com a diretoria, sendo que outras atividades foram formalmente delegadas aos departamentos. De acordo com o órgão, a estrutura horizontal da ANEEL com apenas dois níveis hierárquicos torna a agência ágil e rápida.

O processo decisório da diretoria favorece a deliberação antes das reuniões da diretoria e a falta de um direito de emenda pode tornar os processos da diretoria mais complicados. Quando se trata da tomada de decisão regulatória, o departamento competente inicia o processo. Ele publica uma análise técnica com recomendações de opções regulatórias, submetida à diretoria. O relator, um diretor selecionado por sorteio, avalia a proposta junto a um assessor jurídico antes de se reportar a toda a diretoria. Quatro ou cinco assessores auxiliam os diretores na tomada de decisão. Os diretores têm oito semanas para analisar as propostas. No momento da votação, o voto é um simples sim/não, sem emendas. Os diretores não podem modificar uma proposta, mas eles têm o direito de apresentar outra proposta para votação se houver divergências em relação à proposta da equipe técnica. Uma decisão da diretoria requer uma maioria de três votos para ser aprovada.

Num setor em transformação, a diretoria desempenha um papel fundamental na previsão das mudanças. As competências da diretoria são amplas; inclui decisões relacionadas ao funcionamento do dia a dia da organização, decisões regulatórias, a garantia do cumprimento da lei e da política, a administração de contratos e a análise de recursos. Além dessas tarefas, a diretoria define a direção estratégica e tem um papel no monitoramento do desempenho, conforme descrito acima em Objetivos estratégicos e operacionais. Um setor elétrico em processo de crescimento e mudança trará novos desafios regulatórios, o que exigirá que a ANEEL tenha uma forte capacidade de previsão. A visão estratégica da diretoria será um fator determinante para a capacidade da agência de prever e se adaptar às mudanças.

  • Recalibrar o foco da diretoria, permitindo que a definição e a implementação da agenda estratégica da ANEEL seja o cerne das ações da diretoria. A ANEEL delegou formalmente algumas decisões e poderia explorar outras estruturas que o órgão pode usar para aprofundar a delegação e aumentar o foco em questões estratégicas. Para auxiliar a diretoria em seu papel estratégico, ela precisará definir questões centrais de sua competência e avaliar quais decisões podem ser delegadas a superintendências além daquelas que já delegou. Por exemplo:

    • Os procedimentos da ANEEL poderiam definir que as decisões sem precedência ou decisões de princípio são sempre tratadas pela diretoria, enquanto decisões posteriores do mesmo tipo poderiam ser delegadas a equipes técnicas que utilizam as decisões anteriores da diretoria como modelos. A ANEEL pode usar uma abordagem semelhante para outros produtos; e

    • Se a ANEEL receber uma tarefa governamental específica que resulte num relatório ou produto semelhante, a diretoria decidiria sobre esse produto. Para relatórios produzidos para uso interno (excluindo certos produtos influentes como políticas ou diretrizes), a diretoria pode delegar decisões às equipes técnicas, que apresentarão o produto à diretoria apenas para informação.

    • A ANEEL poderia avaliar se existe alguma competência que não possa ser delegada de acordo com a legislação vigente, mas para a qual a delegação poderia eventualmente melhorar a eficiência ou melhorar o foco da diretoria no seu papel estratégico. Para essas competências, poderia defender mudanças legislativas que permitissem a delegação da tomada de decisão.

  • Aprimorar a capacidade de previsão do órgão, dedicando alguns dos recursos consultivos internos a esta tarefa específica, e estudar a criação de um grupo informal que inclua especialistas externos para apoiar a agência nessa tarefa. Esse grupo poderia informar regularmente, através de documentos informais de discussão, sobre os principais acontecimentos previstos que afetam o setor e poderiam justificar ajustes nas práticas regulatórias da ANEEL. Como a transformação do setor elétrico coloca novas demandas à ANEEL, a diretoria será um importante indutor da preparação institucional.

  • Considerar a inclusão de um direito de emenda nos procedimentos internos da ANEEL para dar aos diretores a opção de modificar as propostas perante a diretoria em vez de apresentar propostas alternativas, como parte de um esforço para simplificar os processos da diretoria e para assegurar que a discricionariedade regulatória seja realmente exercida. Com um grande volume de decisões11, a diretoria da ANEEL deve explorar oportunidades para tornar seus processos mais eficientes. Alocando à Diretoria somente as decisões de suma importância, a Diretoria será capaz de se concentrar nas principais questões políticas que exigem uma ponderação de prós e contras de uma medida regulatória proposta que vai além de uma “escolha técnica de sim/não” sem nenhum critério. Ao incluir o direito de modificar a proposta, a Diretoria estará em condições de apresentar essas considerações onde for necessário, sem ter que rejeitar a proposta por completo, o que é um uso ineficiente do tempo dos diretores. Além disso, com essas “emendas direcionadas”, a qualidade das decisões é aprimorada, pois a fundamentação pode ser refinada e completa. Assim, a tomada de decisão da Diretoria da ANEEL estará focada nas decisões mais importantes e será mais eficiente.

  • Criar confiança na independência da tomada de decisão da diretoria para contrariar as percepções de politização da diretoria. Medidas para salvaguardar a independência do órgão (conforme discutido em Autonomia e independência) e para proteger a integridade dos colaboradores da ANEEL (conforme discutido no Código de ética) serão contribuições cruciais para a criação de confiança.

  • Defender a criação de prazos para que o Poder Executivo indique os diretores a fim de reduzir o uso de vacâncias estratégicas que possam atrapalhar a efetividade da diretoria. Se necessário, a ANEEL também poderia considerar comunicar-se publicamente para enfatizar a importância de indicações tempestivas para a diretoria.

Os mecanismos internos da ANEEL para questões éticas dos colaboradores atestam a dedicação do órgão na promoção da integridade. A ANEEL complementa o Código de Ética Profissional do Servidor Público Civil do Poder Executivo Federal com seu próprio código de ética interno, lançado em 2009. O código delineia os valores da ANEEL – imparcialidade, transparência, independência e responsabilidade social – e obriga a ANEEL a adotar uma série de medidas para melhorar a integridade. Ele cria uma comissão de ética responsável por implementar, monitorar e avaliar as ações de gestão da ética e fornecer orientações sobre ética. A comissão é composta por um secretário executivo e três membros com três suplentes, todos indicados pela diretoria. Dada a importância da integridade para a ANEEL e a necessidade de estabelecer um padrão elevado num contexto de rápida evolução, existe a necessidade de monitorar continuamente a relevância e a efetividade do Código de Ética e sua governança.

As restrições federais anteriores, durante e posteriores ao exercício do cargo gerenciam o risco de conflitos de interesse nos mais altos escalões do serviço público. As restrições anteriores ao exercício do cargo para os indicados para cargos de alto escalão, inclusive diretores da ANEEL, estabelecem que os indicados são inelegíveis se eles ou seus parentes ocuparem certos cargos políticos ou sindicais antes da indicação. Os novos diretores devem apresentar uma declaração de bens, renda e potenciais conflitos de interesse à Comissão de Ética Pública Federal. Durante seu mandato, os diretores estão sujeitos a outras restrições de conflito de interesses que, se violadas, podem ser motivo de demissão. Essas restrições incluem a divulgação ou uso de informações privilegiadas para benefício pessoal ou de terceiros e o envolvimento em atividades que impliquem a prestação de serviços ou a manutenção de uma relação comercial com uma pessoa física ou jurídica com interesse na decisão do órgão. A lei também define situações que constituem conflito de interesse posteriores ao exercício do cargo. Além de um período de quarentena de seis meses, os diretores não devem divulgar ou fazer uso de informações privilegiadas obtidas no decorrer das funções públicas.

  • Assegurar que o código de ética da ANEEL e sua abordagem em relação à integridade tenham uma perspectiva de gestão de riscos, estejam atualizados e reflitam quaisquer novos riscos e vulnerabilidades, reconhecendo que o ambiente de integridade não é estático. Pensando nisso, a ANEEL poderia usar os dados coletados pela comissão de ética para avaliar os riscos e potenciais vulnerabilidades à improbidade e à corrupção de seus colaboradores e suas atividades. A comissão de ética também deve informar os colaboradores sobre suas atividades. Paralelamente, a agência pode assegurar que os mecanismos de monitoramento forneçam efetivamente sinais de risco para a diretoria e a comissão de ética. O envolvimento da diretoria e demais gerentes de alto escalão nessa “verificação de integridade”, juntamente com a comissão de ética, aumentará a conscientização e demonstrará um compromisso de alto nível com a integridade.

  • Comunicar os valores e o compromisso da ANEEL com a integridade, de acordo com a Recomendação do Conselho da OCDE sobre Integridade Pública. Informar sobre as principais métricas de integridade é uma forma de sinalizar o compromisso contínuo da ANEEL com a integridade, e a ANEEL pode estimular a transparência sobre a efetividade dos seus processos de integridade, ao mesmo tempo em que respeita a confidencialidade, informando dados devidamente agregados e anonimizados.

A ANEEL, pioneira na aplicação sistemática da análise de impacto regulatório no Brasil, está se aproximando de seu objetivo de concluir a AIR para todas as propostas de normas. A ANEEL foi uma das primeiras a adotar a análise de impacto regulatório, implementando a AIR sistematicamente antes que ela fosse uma obrigação legal para as agências reguladoras. A equipe técnica dentro da unidade responsável realiza a AIR, que geralmente é submetida a consulta na primeira fase da audiência pública. A ANEEL mede a proporção de propostas de normas que vão para consultas públicas com uma AIR concluída e aquelas sem AIR disponível: embora a ANEEL tenha definido uma meta de 100% para este índice, 94% das propostas de normas foram para consulta pública com a AIR em 2020.

A ANEEL garante que a AIR seja proporcional ao significado da regulação, isentando certos atos normativos, tais como os de evidente baixo impacto, da análise. A norma de AIR da ANEEL detalha os requisitos da AIR, que padroniza a estrutura de AIR e serve para aumentar a uniformidade da AIR conduzida por diferentes departamentos. Além de certas isenções definidas, a ANEEL deve conduzir a AIR antes da emissão de todos os atos regulatórios. Além disso, a norma de AIR especifica que a metodologia da AIR deve ser adequada ao objeto da norma e à sua complexidade. As isenções garantem que a AIR se concentre nos atos normativos mais importantes, excluindo as de baixo impacto e variando a profundidade da AIR, de acordo com os Princípios de Melhores Práticas sobre Análise de Impacto Regulatório.

Uma comissão especial aumenta a capacidade interna para conduzir a AIR e melhora a qualidade da AIR da agência. Uma Comissão Técnica (CT-REG) oferece suporte para o uso da AIR dentro da agência. A finalidade da CT-REG, que se reúne uma vez ao mês, é aprimorar a qualidade da AIR da ANEEL. Para isso, a comissão elaborou um guia de perguntas e respostas para a AIR e um modelo de relatório de AIR, além de organizar treinamento sobre a AIR. Embora a comissão não elabore a AIR, ela apoia a Diretoria na análise dos pedidos de dispensa de AIR. A CT-REG é composta por assessores dos diretores, membros do gabinete do diretor-geral e representantes de departamentos.

A norma de AIR da agência inclui requisitos para monitorar e conectar a AIR à análise ex post, uma área que a ANEEL está desenvolvendo atualmente. Entre os requisitos mínimos para os relatórios de AIR na norma de AIR da ANEEL está a exigência de que o relatório inclua informações sobre os resultados de monitoramento do novo ato normativo. Além disso, a norma resultante deve incluir uma disposição para elaborar uma análise ex post numa data posterior.

  • Tirar lições sobre a AIR para compartilhar com outros reguladores, incluindo o uso da CT-REG transversal para melhorar a qualidade da AIR e a adesão em toda a organização. Isso poderia assumir a forma de um “conjunto de ferramentas de AIR” para complementar o manual elaborado em 2018, compartilhando métodos e ferramentas específicas que a ANEEL utiliza para melhorar a qualidade e a efetividade do seu programa de AIR.

  • Integrar totalmente a AIR com outras ferramentas de gestão regulatória, de acordo com os Princípios de Melhores Práticas sobre Análise de Impacto Regulatório. A ANEEL está atualmente desenvolvendo sua avaliação ex post e a sua proposta de norma prevê uma estrutura apropriada para “fechar o ciclo” do ciclo de governança regulatória ao mesmo tempo em que fortalece seu programa ex post.

O envolvimento das partes interessadas é uma expressão importante da responsabilidade social. O envolvimento robusto e abrangente das partes interessadas é fundamental para a ANEEL enquanto regulador independente e influente num setor normalmente politizado. Um relatório anterior da OCDE destacou a participação social como um desafio no Brasil, que historicamente carece de uma forte presença da sociedade civil na política regulatória. Além disso, os consumidores nem sempre tiveram uma voz expressiva nos setores de redes do Brasil. A participação social é fundamental para manter o “compromisso crível” representado por uma agência independente e assume um significado ainda maior num país com um alto nível de desigualdade.

Com procedimentos de consulta das partes interessadas em vigor, o desafio da ANEEL agora é envolver efetivamente os cidadãos afetados. A ANEEL geralmente realiza consultas em duas etapas: primeiro solicita contribuições sobre a proposta de AIR e depois apresenta a proposta de ato normativo. Durante a consulta sobre a proposta de AIR, a ANEEL utiliza uma série de instrumentos para dialogar com as partes interessadas a fim de coletar informações e dados: reuniões técnicas com as partes interessadas, seminários, cartas diretas às partes interessadas e tomadas de subsídios. Durante a consulta sobre a proposta de ato normativo, a ANEEL geralmente oferece audiências públicas. Nesta etapa, o relatório da AIR inclui uma seção sobre os comentários coletados das partes interessadas, indicando como esses comentários foram levados em consideração. Embora a ANEEL ofereça múltiplas oportunidades para a contribuição das partes interessadas, o órgão não consegue atrair sistematicamente uma ampla participação pública. Várias análises constataram uma forte presença de especialistas nas audiências públicas da ANEEL, com uma representação menor de partes interessadas não especializadas. A presença de atores políticos também pode politizar as discussões, diluindo a efetividade das audiências como espaços para coletar contribuições das partes afetadas.

Uma comissão para entender a perspectiva do consumidor sobre o processo regulatório, criada como um esforço para ampliar o envolvimento nos processos de participação pública, ainda não apresentou melhoras nos níveis de envolvimento. Como parte do seu objetivo estratégico de aumentar a representação nos processos decisórios, a ANEEL criou uma comissão para analisar o processo regulatório a partir da perspectiva do consumidor, a Comissão de Apoio ao Processo Regulatório. A Comissão tem representação das cinco classes de consumidores e dos campos de pesquisa e jurídico. A tarefa da Comissão é avaliar as necessidades dos consumidores no processo regulatório e analisar os impactos sobre os consumidores, destacando as melhorias para as propostas em discussão nas audiências públicas. Ela exerce uma função consultiva, analisando as regulamentações propostas antes de serem levadas à consulta pública. Entretanto, os níveis de contribuição aos processos regulatórios ainda estão aquém dos objetivos da ANEEL, sugerindo que a ANEEL deveria ajustar sua estratégia para ampliar seu envolvimento.

Um conselho de consumidores para cada distribuidora institucionaliza o envolvimento das partes interessadas no segmento de distribuição, mas sua efetividade poderia ser melhorada. Pela lei, cada distribuidora de energia deve manter seu próprio conselho de consumidores. Os conselhos de consumidores servem como órgãos consultivos sobre temas como contas e qualidade do serviço. Os conselhos são autônomos, financiados através de uma tarifa sobre as distribuidoras. Os conselhos são compostos por dois representantes de cada um dos cinco principais grupos de consumidores: residencial, industrial, comercial, rural e poder público (com o possível envolvimento do Procon). O conselho nomeia seus novos membros e define seu próprio planejamento anual. Os conselhos devem dar feedback regularmente sobre o desempenho das empresas de distribuição, mas sua contribuição para outros processos de envolvimento das partes interessadas é limitada e geralmente não se reflete no produto final. Os conselhos de consumidores devem fazer comentários formais e não vinculantes sobre as tarifas e a qualidade do fornecimento de energia elétrica da distribuidora em questão. Os conselhos também trabalham com a empresa de distribuição para fazer a divulgação ao consumidor. A ANEEL convida os conselhos de consumidores a fazerem parte dos processos de participação pública da ANEEL. Entretanto, sua contribuição nas consultas da ANEEL poderia ser intensificada: A ANEEL informa que cerca de 1/5 dos processos de participação pública contam com contribuições dos conselhos e cerca de 30% dessas contribuições são refletidas no produto final. Embora a ANEEL defina as condições gerais para a formação e funcionamento dos conselhos, alguns conselhos são mais ativos do que outros. A ANEEL facilita a contribuição significativa dos conselhos de consumidores através da participação em reuniões, fornecendo informações relevantes, bem como da realização de reuniões técnicas e treinamentos com os conselhos.

  • Avaliar a participação em consultas públicas e identificar lacunas de grupos específicos de partes interessadas representadas. Fazer uso da Comissão de Apoio ao Processo Regulatório para identificar oportunidades (e avaliar a alocação proporcional de recursos) para aumentar a representação das principais partes interessadas nos processos da ANEEL.

  • Considerar a criação de um canal para a ANEEL interagir mais diretamente com os consumidores, fora do mecanismo dos conselhos de consumidores dirigidos pelos atores do mercado, para conscientizar sobre o papel da ANEEL e seus serviços ao consumidor. A Comissão de Apoio ao Processo Regulatório poderia desempenhar um papel na identificação de oportunidades de participação direta.

  • Assegurar a consistência e o uso estratégico em conselhos consultivos integrados nas empresas. Isso pode envolver as seguintes ações:

    • A ANEEL pode identificar conselhos consultivos com menor qualidade de participação. A comunicação de resultados relativos pode oferecer outro incentivo comportamental para melhorar a qualidade da participação. O órgão poderia trabalhar com as empresas de distribuição para investir em colocar esses conselhos no mesmo patamar de efetividade que os conselhos de alto desempenho;

    • A ANEEL e as distribuidoras podem aumentar o treinamento para assegurar que os participantes de todas as classes de consumidores possam ter uma voz igualmente informada nos procedimentos dos conselhos de consumidores;

    • A ANEEL pode incentivar o compartilhamento de conhecimentos e outras interações entre os conselhos para melhorar a qualidade geral das contribuições. A agência pode considerar a implementação de mecanismos para incentivar as trocas, tais como uma plataforma compartilhada na qual os conselhos possam compartilhar boas práticas, modelos, recursos, etc.;

    • A ANEEL pode se comprometer a informar como a contribuição do grupo de consumidores e da sociedade civil foi levada em consideração na decisão final.

  • Criar um ambiente “seguro” nas audiências públicas para as partes interessadas e partes afetadas, sem a politização do discurso, limitando a participação dos atores políticos. A ANEEL pode enfatizar, ao anunciar audiências públicas, que oferece esses eventos para as partes afetadas. As regras da ANEEL para as audiências públicas devem ser claras aos participantes, bem como a finalidade da audiência e o assunto da consulta.

O uso inicial de novas abordagens, tais como insights comportamentais, para gerir a demanda de energia elétrica e melhorar o desempenho das empresas de distribuição foi recebido com relativo sucesso. A ANEEL criou um sistema de “bandeiras tarifárias” para sinalizar aos consumidores o custo real da geração de energia elétrica, acompanhado de uma sobretaxa quando o custo de geração é alto. Entretanto, o TCU determinou que a ANEEL revisitasse essa abordagem de gestão da demanda baseada no comportamento para assegurar que ela estivesse cumprindo os objetivos. O comitê de inovação, formado por colaboradores da ANEEL e diretores, apoia os esforços dos departamentos na utilização de métodos inovadores, como o de insights comportamentais.

A ANEEL concede Prêmio ANEEL de Ouvidoria para as três empresas de distribuição com o melhor serviço de atendimento ao cliente e gestão de reclamações, um mecanismo para incentivar as empresas a melhorar. O Prêmio ANEEL de Ouvidoria e o Índice ANEEL de Satisfação do Consumidor são programas baseados no comportamento que “reconhecem” distribuidoras com bom desempenho para dar uma motivação a mais ao seu desempenho. O Prêmio ANEEL de Ouvidoria é concedido às empresas com o melhor serviço de atendimento ao cliente e o melhor histórico no atendimento das reclamações. Os fatores considerados são o número de canais pelos quais os consumidores podem entrar em contato com a empresa, o modelo específico da ouvidoria dentro da empresa, a rapidez e a clareza no atendimento das reclamações e a disponibilidade de relatórios de monitoramento. A publicação dos melhores desempenhos no serviço de atendimento ao cliente representa outra motivação para que as distribuidoras melhorem os serviços.

  • Promover o uso de abordagens inovadoras, como insights comportamentais, onde tais abordagens podem melhorar o desempenho da ANEEL e do setor que ela regula. Isso pode ser feito:

    • Firmando parcerias com instituições de pesquisa que conduzem pesquisas na área da ciência comportamental para identificar oportunidades para o uso de insights comportamentais em seus processos e criar intervenções comportamentais de alta qualidade;

    • Realizando sessões de treinamento interno para colaboradores sobre abordagens em relação à regulação através de ferramentas e metodologias mais inovadoras, tais como insights comportamentais, regulamentação de ética nos negócios, etc., para compartilhar conhecimentos e reunir ideias.

A ANEEL está nos estágios iniciais da institucionalização do uso da análise ex post e deve tomar outras medidas para incentivar a adoção generalizada da prática na agência. Num país onde a complexidade dos procedimentos regulatórios supera a dos países da OCDE, a avaliação ex post pode ser uma ferramenta importante para que a ANEEL possa defender a simplificação administrativa no setor elétrico. A partir de julho de 2018, todos os atos normativos devem incluir um prazo para implementar uma Avaliação de Resultado Regulatório – ARR, tendo a ANEEL realizado quatro até o momento da elaboração do presente documento. Em geral, o departamento que produz a AIR para um ato normativo também é responsável pela avaliação ex post, e os departamentos planejam despesas futuras relacionadas com as análises ex post que são de sua competência através do processo orçamentário normal. A ANEEL ainda não definiu os aspectos mínimos que devem ser avaliados ex post nem tem um modelo para relatórios. Vários projetos-piloto estão elaborando o programa ex post da ANEEL, inclusive através da elaboração de um manual definindo boas práticas e trazendo recomendações.

A ANEEL implementou uma revisão anual para gerir seu estoque regulatório, mas o sistema poderia ser incrementado pela incorporação de revisões ex post como um elemento integrante do ciclo de regulação. Um dos objetivos estratégicos no Planejamento Estratégico 2018-2021 da ANEEL é “aperfeiçoar, simplificar e consolidar a regulação”, com uma iniciativa para “revisar sistemática de elaboração de regulamentos e o estoque regulatório”. Para gerir o estoque regulatório, todas as áreas técnicas avaliam anualmente a efetividade dos atos normativos em vigor sob sua responsabilidade. Elas identificam atos que não são mais efetivos para a Secretaria-Geral. A Secretaria-Geral, por sua vez, submete as informações consolidadas à Diretoria que decide se deve atualizar o status legal dos atos normativos. Essas revisões programadas oferecem uma base sólida sobre a qual é possível desenvolver outras formas de fazer o levantamento do estoque regulatório.

  • Manter o ritmo para implementação total da avaliação sistemática ex post. Embora a ANEEL tenha dado o primeiro passo para exigir análises ex post em novos atos normativos, o apoio direcionado para assegurar que as avaliações ex post tenham uma alta qualidade consistente (como a desenvolvida para a AIR) será determinante para o sucesso do programa. O programa deve incorporar a avaliação ex post como parte integrante do ciclo regulatório, definindo como a avaliação irá retroalimentar os processos para ajustar ou redesenhar a regulação. A ANEEL poderia combinar um programa de treinamento formal, como discutido em Recursos humanos, com comunicação interna (através de apresentações e e-mails), para conscientizar os colaboradores a respeito da avaliação ex post.

  • Revisar os procedimentos de gestão de estoque regulatório de acordo com os Princípios de Melhores Práticas da OCDE sobre Revisão do Estoque Regulatório. A ANEEL pode visar um processo de gestão de estoque que seja tanto holístico quanto contabilizável. A ANEEL pode fazer uso da ferramenta de “levantamento” público dos atos normativos para dar uma oportunidade de identificar os desafios com a contribuição das partes interessadas e concentrar seus esforços de gestão do estoque regulatório nas questões mais urgentes. A ANEEL poderia considerar adicionar novos recursos para aumentar a efetividade da gestão do estoque, tais como notificar com antecedência as próximas revisões dos atos normativos, como um “plano de revisão regulatória futura” anual.

  • Considerar o direcionamento de qualquer regulamentação que esteja impedindo a modernização do setor através de uma iniciativa temática especial de modernização regulatória que coleta informações de departamentos e partes interessadas. Tal iniciativa pode ajudar a ANEEL a identificar a regulamentação que não está acompanhando a mudança do cenário e a reagir de acordo. A ANEEL poderia aceitar informações sobre barreiras regulatórias de forma contínua incluindo uma página “Denunciar uma barreira” no site da ANEEL na qual os agentes de mercado podem enviar informações sobre as barreiras enfrentadas.

Os departamentos que realizam o controle e a fiscalização estão entre os mais atingidos pelas restrições de pessoal, o que ameaça uma função central da agência. Conforme discutido em Recursos humanos, a falta de concursos públicos para servidores públicos da ANEEL resultou num déficit de pessoal que afeta mais determinados departamentos, principalmente os departamentos de fiscalização. Para dar conta de uma grande carteira com um quadro de pessoal reduzido, esses departamentos têm algumas ferramentas à sua disposição, incluindo fiscalizações remotas e delegação aos reguladores estaduais.

Os esforços de controle e fiscalização da ANEEL utilizam uma abordagem de gestão de risco, mas essa abordagem nem sempre é padronizada entre departamentos e compreendida pelo público. Na ANEEL, as atividades de fiscalização são conduzidas por três departamentos diferentes, focados respectivamente na fiscalização econômica e financeira, na fiscalização de serviços de eletricidade e na fiscalização de serviços de geração. A ANEEL monitora os atores do setor e seleciona agentes para fiscalização e acompanhamento formal caso identifique um risco de não conformidade com qualquer obrigação legal, regulatória ou contratual ou padrões de qualidade na prestação do serviço. As práticas de fiscalização diferenciam as respostas com base no tipo de entidade regulada, no porte do agente, no seu histórico, no tipo de outorga e na fase do projeto (em implementação ou operação). Embora os três departamentos baseiem suas ações de controle e fiscalização em riscos, eles não possuem um processo de avaliação de risco em comum. Além disso, críticas recentes a fiscalizações remotas da ANEEL após um incidente de segurança de fornecimento sugerem uma compreensão limitada do público da abordagem baseada em riscos da ANEEL em relação às fiscalizações.

A integração limitada da base de dados entre os departamentos de fiscalização cria um risco de fragmentação na informação, e a ANEEL continua trabalhando em prol de um procedimento único para compartilhar informações dentro da organização. A ANEEL coleta informações diretamente das entidades reguladas e através de serviços e aplicativos on-line, mas ainda não existe uma base de dados central integrada que consolide essas informações. A ANEEL deu os primeiros passos para integrar as bases de dados numa tentativa de reduzir a duplicação de informações e o uso ineficiente dos dados. Para melhorar a infraestrutura digital de dados sobre os agentes de geração, o órgão também participa do Projeto de Assistência Técnica dos Setores de Energia e Mineral – META, um projeto financiado pelo Banco Mundial sob a responsabilidade do MME.

A organização da fiscalização de acordo com uma pirâmide de conformidade permite que a ANEEL diferencie sua fiscalização dentro de uma estrutura adequada em termos de discricionariedade. A ANEEL adota medidas de fiscalização proporcionais à gravidade da infração. Uma pirâmide de conformidade, dividida em quatro níveis por ordem de gravidade, orienta as ações de fiscalização da ANEEL. A ANEEL diferencia as respostas com base no tipo de entidade regulada, no porte do agente, no seu histórico, no tipo de outorga e na fase do projeto (em implementação ou operação). A ANEEL impõe um alerta de monitoramento para a maioria dos casos menos graves de não conformidade e um plano de resultados para casos mais graves (discutidos abaixo). Para os casos mais graves e reiterados de não conformidade, a ANEEL pode impor sanções.

A imposição de sanções pela ANEEL está de acordo com o princípio da proporcionalidade e um procedimento claro estabelecido por lei torna o processo de determinação transparente. O tamanho da sanção que a ANEEL impõe é proporcional à gravidade da infração. A ANEEL tem poderes para impor uma série de sanções, desde advertência até multa, embargo de obras, suspensão temporária da participação em licitações para obtenção de novas concessões, permissões ou autorizações, revogação da autorização e caducidade da concessão ou permissão. O valor de uma multa é limitado por um teto de 2% da receita da empresa durante o último ano. Para promover a proporcionalidade, o cálculo da multa leva em conta a renda da empresa, a gravidade da sanção, a extensão da infração, os danos causados, as vantagens econômicas obtidas e a existência de sanções anteriores. Esses procedimentos e restrições claramente definidos permitem que a ANEEL aumente as sanções, o que confere credibilidade (e eventual poder de dissuasão) ao programa de fiscalização.

A ANEEL tem adotado medidas para tornar seu regime de controle e fiscalização mais efetivo e eficiente. Uma recente resolução normativa da ANEEL permite uma maior promoção da conformidade e uma fiscalização responsiva, por exemplo, permitindo que as empresas com deterioração da prestação de serviços ou da posição financeira ou econômica estabeleçam um plano de resultados com a ANEEL que define quais ações a empresa tomará para enfrentar a situação, os prazos para os resultados e os critérios de monitoramento. Os departamentos nem sempre usam a ferramenta de plano de resultados da mesma forma. Enquanto a SFE usa a ferramenta de forma mais sistemática, a SFG usa os planos de resultados para promover campanhas específicas. Nos últimos anos, a ANEEL implementou o Projeto Fiscalização Responsiva, que utiliza novas ferramentas, tais como inteligência analítica e técnicas de fiscalização baseadas em evidências, para tornar a fiscalização mais responsiva.

  • Aliviar a pressão sobre as equipes de inspeção, que são particularmente atingidas pela falta de pessoal. A ANEEL pode considerar diminuir a carga de trabalho das equipes de inspeção utilizando inspeções remotas que complementam as inspeções in loco em casos de menor risco e ampliando os esforços para envolver e delegar aos reguladores estaduais. Além disso, o aprimoramento dos indicadores utilizados no diagnóstico inicial de risco poderia ajudar a ANEEL a tornar seus programas de fiscalização mais eficientes e efetivos.

  • Assegurar que a fiscalização responsiva baseada em riscos seja padronizada em todos e dentro dos departamentos que conduzem atividades de fiscalização. A harmonização dos processos de avaliação de risco e a maior integração das bases de dados entre diferentes departamentos e equipes podem aumentar a consistência nas atividades de análise de risco e fiscalização da ANEEL. O compartilhamento de conhecimentos entre departamentos poderia aumentar a consistência das abordagens de fiscalização.

  • Revisar regularmente o desempenho dos programas de controle e fiscalização. Considerar o acompanhamento de indicadores-chave como satisfação das partes interessadas, histórico de conformidade e eficiência (em termos de despesas da ANEEL e encargos para as entidades reguladas). Embora a ANEEL acompanhe a conformidade das entidades reguladas nos setores de distribuição e transmissão, os indicadores de desempenho poderiam ir além para ter uma visão holística do desempenho das atividades de controle e fiscalização.

  • Comunicar a abordagem baseada em riscos da ANEEL nas atividades de controle e fiscalização para aumentar a compreensão das partes interessadas sobre suas ações. A ANEEL poderia fornecer informações sobre sua abordagem nas atividades de controle e fiscalização através de uma página dedicada em seu site, utilizando uma linguagem não jurídica e de fácil compreensão para todas as partes interessadas.

  • Integrar as bases de dados existentes para aumentar o compartilhamento de informações e dados entre os diferentes departamentos.

Uma alta incidência de recursos mobiliza recursos significativos da ANEEL. As decisões do regulador podem ser contestadas perante a diretoria e a diretoria recebe um grande volume de recursos. Uma pesquisa concluiu que 41.5% das decisões tomadas pela diretoria em 2016 foram sobre recursos (superando em muito o número de decisões sobre outros temas, tais como regulamentação). O grande volume de recursos reduz a tempestividade da resolução. Não existe um órgão que aceite recursos em segunda instância e a única possibilidade restante de recurso é o Poder Judiciário.

O processo de recurso, juntamente com a implementação de regras amplamente contestadas na última década, pode contribuir para a judicialização do setor. Cerca da metade dos recursos resulta em mudanças. Entretanto, para o grande número de recursos que são negados, os requerentes têm apenas uma possibilidade restante de revisitar a decisão. Sem um órgão de recurso administrativo de segunda instância além da diretoria, a única possibilidade de recurso restante para as petições negadas é o Poder Judiciário. Embora os tribunais tendam a mostrar deferência aos aspectos técnicos das decisões da ANEEL, os recursos perante os tribunais são comuns. De fato, a ANEEL enfrentou um grande volume de processos judiciais nos últimos anos (com 451 processos judiciais iniciados somente em 2019). Embora seja difícil determinar um número “ideal” de recursos, a ANEEL definiu um objetivo estratégico para limitar o número de processos judiciais a 170 em 2019. O volume de processos judiciais continua bem acima da meta da ANEEL e põe em questão a conveniência de se definir uma meta quantitativa em relação aos processos judiciais. As causas da judicialização do setor são múltiplas e complexas. Em especial, as empresas podem recorrer ao Poder Judiciário quando se opõem ao marco regulatório em si. Alguma culpa também pode recair sobre o processo de recurso administrativo: diante de longos prazos de processamento dos recursos administrativos e uma possibilidade desfavorável de mudança, as empresas podem optar por recorrer ao Poder Judiciário.

Na maioria dos casos, a ANEEL deixa a cargo do consumidor a solução de reclamações diretamente com a empresa e fornece mecanismos de resolução de conflitos para reclamações não resolvidas, mas a conscientização sobre esse papel pode exigir investimentos. A primeira linha de defesa de um consumidor é fazer uma reclamação diretamente para a empresa. A ANEEL facilita o intercâmbio direto entre consumidores com reclamações e empresas. Os consumidores podem enviar uma reclamação através do site da ANEEL que está integrado com uma plataforma do governo federal. Os consumidores também podem entrar em contato com a ouvidoria da sua empresa de distribuição, que deve manter canais de acesso disponíveis para os consumidores. A ANEEL não faz a mediação nesta etapa, mas coleta informações sobre a qualidade do serviço e tendências. Se a empresa e o consumidor não forem capazes de solucionar o problema diretamente, o consumidor pode registrar a reclamação diretamente na ANEEL. A ANEEL pode fazer a mediação para a resolução de conflitos entre consumidores e empresas nos casos em que as regras existentes não forneçam claramente a resposta. O volume de mediação desse tipo é muito baixo. A ANEEL pode servir como árbitro, proferindo decisões em primeira instância nos processos administrativos sobre as relações de consumo e certas negociações frustradas entre os agentes de mercado. Em vista da baixa conscientização geral do papel da ANEEL (ver Mandato, funções e poderes), a consciência das possibilidades de reclamação entre o público em geral pode ser uma área para futura investigação.

  • Reavaliar o fluxo de trabalho dos recursos para aumentar a eficiência, dentro dos parâmetros legais. As etapas podem envolver:

    • Iniciar um diálogo com as partes interessadas para compreender as motivações e considerações comuns por trás dos recursos e explorar abordagens alternativas;

    • Considerar medidas para melhorar a confiança e construir relações menos antagônicas entre as entidades reguladas, tais como a implementação de princípios de regulamentação de ética nos negócios.

    • Com base nessas avaliações e diálogos, reconsiderar o uso de uma meta quantitativa para reduzir o número de recursos, focando em vez disso na qualidade e no resultado dos processos.

  • Buscar compreender as experiências das partes interessadas nos processos de recursos e reclamações para identificar estratégias a fim de melhorar a eficiência e a efetividade desses processos. Por exemplo, a ANEEL poderia acompanhar o progresso na melhora da tempestividade dos recursos, incluindo essa métrica no mapa estratégico. Além disso, a ANEEL poderia analisar a experiência do consumidor no processo de reclamação para saber se os consumidores estão cientes (e podem aproveitar) das possibilidades de reclamação.

  • Conduzir uma auditoria no site da ANEEL para assegurar que os usuários que não estejam cientes dos serviços da ANEEL ainda possam encontrar e usufruir dos serviços do órgão. Uma auditoria de Otimização do Motor de Busca pode ajudar a agência a entender como direcionar os usuários utilizando certas palavras-chave (por exemplo, aqueles que buscam por “reclamação de energia elétrica”) para as páginas correspondentes no site da ANEEL. Uma auditoria da experiência do usuário no site da ANEEL pode ajudar o órgão a saber se o site é intuitivo e de fácil navegação para todos os visitantes (inclusive, por exemplo, para aqueles que acessam o site através de um dispositivo móvel ou para aqueles com deficiência visual), ajudando os visitantes a encontrar informações pertinentes da maneira mais fácil possível.

Os processos de tomada de decisão da ANEEL mostram uma forte ênfase na transparência. A ANEEL disponibiliza seus processos de tomada de decisão a um público mais amplo, utilizando diversas estratégias. Para incentivar a transparência, a ANEEL fornece acesso aos consumidores antes, durante e depois das reuniões da diretoria. Pelo menos cinco dias antes de uma reunião da diretoria, a ANEEL divulga a pauta da reunião da diretoria ao público. As reuniões propriamente ditas são abertas ao público e transmitidas ao vivo on-line. Após a reunião, a ANEEL publica uma ata resumida das ações da diretoria. A ANEEL publica decisões e documentos comprobatórios no Diário Oficial e no site da ANEEL.

As exigências em nível federal também ajudam na transparência. O governo federal mantém um Portal da Transparência que fornece informações sobre a execução de programas e políticas públicas. A ANEEL deve implementar uma Carta de Serviços ao Cidadão e um plano anual de comunicação para informar o público sobre as oportunidades de participação e os direitos dos consumidores.

A ANEEL tem um grande volume de solicitações de informação e muitos solicitantes estão aguardando respostas há muito tempo. A Lei de Acesso à Informação do Brasil dita as regras para a divulgação das informações. A ANEEL tem o terceiro maior número de solicitações de informação entre as 300 instituições abrangidas pela lei. Embora o tempo médio que a ANEEL leva para responder a uma solicitação seja de 6 a 7 dias, o grande volume de solicitações faz com que muitos solicitantes esperem mais do que os prazos estabelecidos na lei para receber uma resposta (mais informações sobre este estudo no Capítulo 2).

A supervisão parlamentar da ANEEL ocorre com a ajuda do Tribunal de Contas da União (TCU) e tem havido tensão entre a supervisão do TCU e a discricionariedade técnica da ANEEL. O TCU tem amplo poder de supervisão sobre a ANEEL, conduzindo inspeções de rotina e supervisionando leilões e contratos de concessão. O TCU considera que também pode revisar e contestar as determinações da ANEEL, fazendo julgamentos sobre os resultados, a economia, a eficiência e a efetividade das suas atividades. Em alguns casos, a ANEEL recuou diante das decisões do TCU que considera estarem infringindo a discricionariedade técnica da ANEEL.

  • Empreender esforços contínuos para melhorar ainda mais a transparência e a acessibilidade dos processos da ANEEL. Usando a experiência de materiais em linguagem objetiva produzidos para acompanhar a AIR, implementar tais iniciativas para acompanhar guias que explicam as principais áreas dos processos decisórios e as decisões regulatórias da ANEEL para as partes interessadas não especializadas.

  • Simplificar processos para responder às solicitações de informação. Identificar solicitações comuns e considerar a publicação proativa dessas informações ou tornar material já publicado mais acessível, juntamente com esforços para implementar o plano de dados abertos da ANEEL.

  • Intensificar o nível de interação entre a ANEEL e o TCU no nível estratégico para aumentar a compreensão mútua do papel e das competências da ANEEL.

A ANEEL promove suas atividades de fiscalização e regulação, coletando uma enorme quantidade de informações, e realiza esforços para melhorar a qualidade dos dados. A ANEEL coleta informações sobre qualidade do serviço, metas operacionais, segurança de barragens e desempenho de geração, entre outros. No seu esforço de coleta de dados, a ANEEL criou um manual de contabilidade para o setor, juntamente com as partes interessadas, consultores e associações de contadores, para melhorar a qualidade dos dados. A divulgação de informações pelas empresas inclui balancetes mensais, relatórios trimestrais e anuais e um relatório anual de responsabilidade social e ambiental.

Entretanto, problemas com a qualidade dos dados às vezes complicam o uso e a integração eficiente dos dados. Apesar dos esforços da ANEEL para aumentar a qualidade dos dados através do seu manual de dados, a qualidade dos dados continua sendo um problema. Como a ANEEL coleta a maior parte das suas informações de fontes externas, os dados são provenientes de entidades que utilizam definições diferentes. Em outros casos, os dados podem estar incompletos ou desatualizados, ou pode haver inconsistências entre os dados recebidos pelos diferentes departamentos da ANEEL. Esses problemas dificultam o uso eficiente de dados na fiscalização e na regulação de empresas do setor elétrico, pois reduzem a comparabilidade e confiabilidade dos dados.

A ANEEL implementou medidas para melhorar a divulgação de dados e informações para o público em geral. Para informar o público sobre o desempenho das empresas de distribuição no serviço de atendimento ao cliente e no atendimento das reclamações, a ANEEL concede o Prêmio ANEEL de Ouvidoria a empresas com bom desempenho (ver Envolvimento das partes interessadas). A ANEEL também publica uma quantidade significativa de dados brutos sobre o desempenho do setor regulado, tais como balancetes mensais, relatórios trimestrais e anuais e indicadores de confiabilidade da rede. A ANEEL não publica todos os dados, pois alguns dados são confidenciais e outros são compartilhados somente mediante solicitação. Através da publicação de dados, a ANEEL também visa possibilitar a “auditoria social” de dados, recebendo contribuições da sociedade sobre possíveis inconsistências ou dados incorretos. Para melhorar o compartilhamento e a qualidade dos dados e auxiliar a tomada de decisão, a ANEEL elaborou um Plano de Dados Abertos 2020-21).

A ANEEL monitora os resultados do setor em relação a indicadores estratégicos, o que fornece insights sobre alguns elementos importantes do desempenho do setor. A ANEEL divulga anualmente informações sobre dois objetivos estratégicos relacionados aos resultados do setor através de seu relatório anual (ver Tabela 2.10). Ao fazer isso, o órgão compara elementos como o índice de adimplência das obrigações, um índice de sustentabilidade econômica e financeira, a satisfação do consumidor e a confiabilidade da rede. Embora os indicadores não meçam diretamente o impacto da ANEEL nos resultados do setor, por serem influenciados por outros fatores externos, eles fornecem insights sobre o desempenho geral do setor elétrico brasileiro.

A prática da ANEEL de definir uma meta para cada indicador estratégico é uma boa prática para incentivar a melhoria, apesar de algumas metas relacionadas a processos parecerem pouco realistas. A ANEEL inclui nove objetivos estratégicos relacionados a seus processos em seu planejamento estratégico (ver Tabela 2.10 para os objetivos estratégicos e indicadores da ANEEL). Para a maioria dos indicadores, a ANEEL registrou uma melhora na pontuação ao longo do tempo. Entretanto, algumas metas podem precisar ser revisadas para torná-las mais realistas. Por exemplo, a ANEEL pretende realizar uma AIR em 100% dos casos, ter 100% das suas decisões tomadas dentro do prazo e ter 100% de sucesso nos processos judiciais. Na prática, a ANEEL não atingiu essas metas. Além disso, estabeleceu uma meta de 170 novos processos judiciais em 2019, embora o número de casos tenha chegado a 451. A distância entre a meta e o que de fato mostraram esses indicadores específicos pode indicar que a ANEEL poderia ajustar essas metas para torná-las mais realistas.

  • Elaborar um marco estratégico mais focado para aumentar o foco nos indicadores estratégicos, permitindo um acompanhamento mais fácil do desempenho do órgão. Isso envolveria:

    • Priorizar os principais objetivos estratégicos;

    • Selecionar um número menor de indicadores a serem divulgados pela ANEEL;

    • Fornecer orientação ao público sobre a interpretação dos diferentes indicadores.

  • Avaliar se todas as metas dos indicadores estratégicos são realistas para melhorar os incentivos deles decorrentes e revisar aqueles que não se enquadram nesse escopo. A ANEEL poderia usar a análise histórica para avaliar o nível adequado das metas para garantir que elas sejam atingíveis.

  • Aumentar a disponibilidade de dados ao público através de iniciativas como o plano de dados abertos para assegurar a prestação de contas do desempenho do setor e da ANEEL. Para corresponder às expectativas e definir as necessidades, a ANEEL deve consultar as partes interessadas sobre os processos de compartilhamento de dados através de reuniões e solicitações de contribuições ou opiniões.

  • Analisar coletivamente com os atores do setor que fornecem dados regularmente à ANEEL ambiguidades nas definições de dados que complicam seu uso e atualizar o manual de contabilidade com definições mais detalhadas.

Referências

[6] ANEEL (2018), A Missão, a Visão e os Valores da ANEEL, https://www.aneel.gov.br/missao-e-visao.

[7] ANEEL (2017), Portaria n° 4.823, de 28 de Novembro de 2017, http://www2.aneel.gov.br/cedoc/prt20174823.pdf.

[1] BnetzA (2020), Shaping the future for Germany’s key infrastructure, https://www.bundesnetzagentur.de/SharedDocs/Downloads/EN/BNetzA/PressSection/ReportsPublications/2020/ImageB.html (accessed on 22 March 2021).

[2] CTA (2020), Annual Report 2019-2020, https://www.otc-cta.gc.ca/eng/publication/annual-report-2019-2020 (accessed on 18 March 2021).

[3] CTA (2020), Departmental Plan 2020-2021, https://otc-cta.gc.ca/sites/default/files/departmental_plan_2020_2021.pdf.

[5] ICER (2015), Energy Connections: Engaging the consumer in building stronger systems, http://icer-regulators.net/wp-content/uploads/download-manager-files/i15-vwg3-report%20on%20consumer%20issues_for%20print.pdf.

[4] ICER (2009), Institutional Documents, http://icer-regulators.net/institutional-documents/ (accessed on 30 July 2020).

Notas

← 1. Especificamente para o setor elétrico, a energia hidráulica, solar, eólica e os biocombustíveis representam 82% da geração total de energia elétrica em 2018.

← 2. O Plano Real reestruturou o cenário econômico do Brasil no início dos anos 1990, após um longo período de intervenção estatal. O plano criou um ambiente mais favorável para a abertura econômica, a reforma regulatória e institucional e uma inflação estável. A criação das novas agências reguladoras independentes foi inspirada pela experiência internacional, principalmente pelo modelo institucional norte-americano de agências reguladoras independentes.

← 3. Os dados sobre a população e a parcela da população com acesso à energia elétrica são números da OCDE e da AIE para o ano de 2018.

← 4. A Lei nº 12.783/2013 criou um regime de remuneração por tarifa definido pela ANEEL para as concessionárias de geração de energia hidrelétrica com concessões prorrogadas, incluindo a alocação de cotas de garantia física e padrões de qualidade.

← 5. Embora os consumidores fossem elegíveis para o ambiente de contratação livre no caso de terem uma carga acima de 3 000 kW, esse limite diminuiu para 2.500 kW a partir de 1 de julho de 2019 e para 2 000 kW a partir de 1 de janeiro de 2020. Após a publicação de uma portaria ministerial, esse limite diminuirá ainda mais no futuro para 1 500 kW a partir de 1 de janeiro de 2021, 1 000 kW a partir de 1 de janeiro de 2022 e 500 kW a partir de 1 de janeiro de 2023.

← 6. Por exemplo, projetos-piloto para testar novas tecnologias podem auxiliar a inovação tecnológica no setor, mas possivelmente à custa da eficiência de custos no curto prazo. Isso poderia significar uma troca entre os objetivos estratégicos 1 e 4.

← 7. O CMSE é composto por representantes do MME, da ANEEL, da Câmara de Commercialização de Energia Elétrica - CCEE, da Empresa de Pesquisa Energética – EPE, do Operador Nacional do Sistema Elétrico – ONS e da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis – ANP.

← 8. A revisão está pendente no momento da elaboração do presente documento (Março de 2021).

← 9. Embora a Procuradoria Federal esteja representada nesses números, os colaboradores da Procuradoria Federal podem ser discriminados de outros colaboradores da ANEEL. Se os colaboradores da Procuradoria Federal forem excluídos do número de colaboradores, a proporção de colaboradores administrativos e de assessoramento da gestão permanece igual em 38%.

← 10. Incluindo ANEEL, ANATEL, ANP, ANTT, ANTAQ e ANAC.

← 11. Os diretores da ANEEL realizaram 51 reuniões públicas para analisar mais de 1 500 deliberações em 2019.

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