8. Capacitação

Aumentar a conscientização, desenvolver conhecimentos e habilidades e cultivar o compromisso com a integridade são elementos essenciais da integridade pública. Aumentar a conscientização sobre padrões, práticas e desafios de integridade ajuda os agentes públicos a reconhecer problemas de integridade quando eles surgem. Da mesma forma, treinamento e orientação bem elaborados preparam os agentes públicos com o conhecimento e as habilidades necessárias para gerenciar adequadamente as questões de integridade e buscar consultoria especializada quando preciso. Por sua vez, a sensibilização e a capacitação contribuem para cultivar o comprometimento entre os agentes públicos, motivando sua atuação para o cumprimento das suas funções públicas e pela busca do interesse público.

A Recomendação da OCDE sobre Integridade Pública exorta os aderentes para “fornecer informações suficientes, treinamento, orientação e consultoria oportuno para que os agentes públicos apliquem os padrões de integridade pública no local de trabalho, em particular por meio de:

  1. a. Fornecimento aos agentes públicos, no início e ao longo de suas carreiras profissionais, de informações claras e atualizadas sobre as políticas, regras e procedimentos administrativos da organização que sejam relevantes para a manutenção de altos padrões de integridade pública;

  2. b. Oferecimento de curso de formação emintegridade para agentes públicos, no início e ao longo de suas carreiras profissionais, a fim de conscientizar e desenvolver habilidades essenciais para a análise de dilemas éticos e para tornar os padrões de integridade pública aplicáveis e significativos em seus próprios contextos pessoais;

  3. c. Fornecimento de orientação formal e informal e mecanismos de consulta facilmente acessíveis para ajudar osagentes públicos a aplicar os padrões de integridade pública em seu trabalho diário, bem como para gerenciar situações de conflito de interesses” (OECD, 2017[1]).

Há uma série de ferramentas e mecanismos que os órgãos e entidades podem usar para fornecer informações, treinamento e orientação aos agentes públicos. As seguintes características são elementos essenciais:

  • As informações sobre políticas de integridade, regras e procedimentos administrativos estão atualizadas e disponíveis.

  • O curso de formação emintegridade ocorre regularmentepara aumentar a conscientização e desenvolver habilidades para a integridade pública, e medidas de avaliação estão em vigor para avaliar a eficácia.

  • Mecanismos de orientação e consulta para a aplicação consistente de padrões de integridade no trabalho diário dos agentes públicos estão em vigor, são bem conhecidos e acessíveis.

Disponibilizar informações suficientes para os agentes públicos é fundamental para aumentar a conscientização e a compreensão das políticas, padrões, regras e procedimentos administrativos de integridade. Os métodos e mensagens dependerão se o objetivo é aumentar a conscientização sobre padrões de integridade aplicáveis em todo o setor público ou se o objetivo é aumentar a conscientização sobre as regras de integridade aplicáveis em instituições ou contextos específicos. Se o foco for aumentar a conscientização sobre os padrões de integridade em todo o setor público, a Administração pode emitir comunicados sobre valores e princípios no serviço público. Isso pode incluir enviar aos agentes públicos uma cópia do código de conduta ou código de ética e apresentar seu conteúdo quando ingressarem no serviço público, bem como solicitar-lhes que assinem, no ingresso ou quando mudarem de função, uma declaração de que leu, entendeu e concorda em aderir ao código de conduta ou código de ética. O valor jurídico de tal ato geralmente é limitado, mas seu significado pode ser considerado se estiver inserido em um sistema de integridade mais amplo (OECD, 2009[2]).

As organizações públicas podem usar meios adicionais para difundir padrões de integridade, como pôsteres, protetores de tela de computador, quadros de funcionários, banners, marcadores e calendários impressos (entre outras coisas), para aumentar a conscientização sobre as normas de integridade. Por exemplo, no México, o Ministério da Administração Pública (SFP) divulgou cartazes sobre os princípios constitucionais, explicando o que significa cada valor do serviço público (legalidade, honestidade, lealdade, imparcialidade e eficiência) (Figura 8.1). Se o foco for aumentar a conscientização sobre regras de integridade específicas em um setor específico, pode-se considerar a produção e divulgação de mensagens personalizadas. A Agência de Alfândega e Proteção de Fronteiras dos EUA e o Departamento de Assuntos Internos da Austrália têm inserido vídeos com conteúdos sobre integridade no correio eletrônico das agências, buscando disseminar e esclarecer expectativas e condutas esperadas de todos os seus funcionários (OECD, 2017[3]).

O uso de mensagens que contenham exemplos concretos sobre o que esses valores significam incentivará os agentes públicos a refletir sobre eles e internalizá-los. Por exemplo, o pôster dos Padrões de Integridade e Conduta da Nova Zelândia (Figura 8.2), que é exibido tanto em organizações públicas quanto publicamente para os cidadãos, oferece exemplos concretos do que os valores significam.

A simples exibição de regras de integridade não garante necessariamente que os agentes públicos darão a devida consideração às informações à sua disposição. Assim, quaisquer que sejam as ferramentas e mensagens escolhidas, a promoção regular de políticas, regras e procedimentos de integridade pode ajudar os agentes públicos a lidar com os dilemas éticos (OECD, 2017[4]). Conforme observado em (OECD, 2019[5]), os lembretes morais têm se mostrado uma ferramenta eficaz para combater o comportamento antiético, lembrando as pessoas dos padrões éticos no momento da tomada de decisão (Mazar and Ariely, 2006[6]; Bursztyn et al., 2016[7]). Mensagens discretas, como “Obrigado por sua honestidade” podem ter um impacto marcante no cumprimento dos padrões de integridade (Pruckner and Sausgruber, 2013[8]), embora, para alcançar o impacto desejado, as intervenções devam ser programadas para antes do momento da tomada de decisão (Gino and Mogilner, 2014[9]).

Uma medida política concreta derivada dessas descobertas poderia envolver a inclusão de uma sentença a ser confirmada por um agente de contrataçãoantes de tomar a decisão sobre um contrato de compras. A frase poderia ser: “Tomarei a seguinte decisão de acordo com os mais altos padrões profissionais e éticos”. Ao assinar, o agente de contratação vincula implicitamente seu nome à conduta ética (OECD, 2017[10]). Outras medidas podem incluir a exigência de caixas de assinatura no início de documentos públicos (Quadro 8.1).

De uma perspectiva de capacitação, uma abordagem estratégica para a integridade pública exige que o treinamento de integridade seja integrado à estrutura mais ampla de desenvolvimento de habilidades de qualquer serviço público. Em todos os países da OCDE, o desenvolvimento de habilidades é uma parte essencial da gestão do serviço público. A supervisão institucional, bem como quem é responsável por promover, coordenar e administrar a aprendizagem, varia de acordo com a estrutura institucional de um país (OECD, 2017[4]). As estruturas-chave podem incluir um órgão central ou uma escola nacional de serviço público, ou a responsabilidade pode ser delegada individualmente a um ministério (OECD, 2016[12]). Os planos de aprendizagem e desenvolvimento de habilidades podem ser construídos em torno do desenvolvimento individual dos agentes públicos para abordar as lacunas de habilidades nas organizações públicas ou focados em todo o nível do governo (OECD, 2017[4]).

Independentemente da abordagem ou abordagens usadas e em qual combinação, o treinamento em integridade deve ser um componente. As organizações podem considerar os seguintes recursos ao projetar e implementar o treinamento de integridade: o público-alvo, o momento e a frequência do treinamento, o escopo do treinamento e os principais métodos para realizar o treinamento. Além disso, as organizações podem considerar medidas relacionadas à -coordenação dos principais atores que preparam e ministram treinamento, bem como ao monitoramento e avaliação dos resultados do treinamento.

Os novos agentes públicos são um público-chave para o treinamento de integridade, com o curso de formação servindo como a primeira oportunidade para definir o tom dos padrões de integridade ao ingressar no serviço público. Isto é uma oportunidade privilegiada para aumentar a conscientização e construir conhecimento sobre regras e valores. Por exemplo, Canadá, Estados Unidos, Lituânia e Turquia tornaram o curso o de formação em integridade um componente inicial obrigatório de treinamento. Dentro do currículo obrigatório para novos agentes públicos, a Escola de Serviço Público do Canadá oferece um curso de introdução sobre valores e ética. Nos Estados Unidos, todos os novos agentes federais devem seguir um curso de treinamento de introdução à ética elaborado e fornecido pelo Oficial de Ética da Agência. Na Lituânia, o treinamento em ética é indiretamente obrigatório: todos os novos agentes públicos são obrigados a participar de um treinamento inicial , que inclui tempo dedicado a questões de integridade. Os componentes básicos desses cursos de integridade incluem os conceitos de valores e ética, mas também gerenciamento e prevenção de conflitos de interesse, dilemas éticos e atuação responsável no local de trabalho.

Oportunidades específicas de treinamento em integridade também podem ser projetadas para agentes públicos, para fornecer suporte e conteúdo personalizado e atualizado para desempenhar suas funções diárias. Nos Estados Unidos, além do treinamento obrigatório, certas categorias de agentes (por exemplo, aqueles nomeados pelo presidente, o secretário executivo do presidente, certos agentes contratados, etc.) realizam, anualmente, uma capacitação adicional. Muitas agências americanas estenderam esse requisito a todos os agentes. Na França, embora não haja obrigação legal para a formação de oficiais de ética, a Alta Autoridade para a Transparência na Vida Pública (HATVP) oferece um curso de treinamento especificamente projetado para oficiais de ética das empresas semi-públicas da cidade de Paris (HATVP, 2019[13]). Um guia de ética elaborado para eles também fornece orientação e ferramentas (HATVP, 2019[14]).

Além disso, como forma de internalizar o treinamento, os participantes podem ser incentivados a elaborar seu próprio plano de ação de integridade, no qual identificam riscos e desafios de integridade em seu local de trabalho. O treinamento de acompanhamento pode então ser usado para discutir a implementação de seu plano pessoal, incluindo as barreiras enfrentadas na implementação de ações específicas, bem como compartilhar ideias e soluções.

Na Administração Pública, existem agentes públicos que atuam em cargos expostos a maiores riscos de corrupção. Tais cargos incluem os responsáveis pelas contratações públicas, os fiscais e aduaneiros e os agentes públicos que trabalham em órgãos reguladores. Para garantir que esses agentes públicos tenham as ferramentas para lidar com os riscos de integridade que surgem, os programas de treinamento podem ser adaptados às suas necessidades específicas. Por exemplo, desde 2001, a Agência Federal Alemã de Compras exige que todos os novos agentes participem de workshops para adquirir conhecimento sobre prevenção de corrupção, denúncia de irregularidades e comportamento ético. Desde então, o programa foi expandido, com a participação de todos os agentes de compras públicas. São organizados entre 6 e 7 workshops por ano para formar em média 70 agentes (OECD, 2016[15]). Em 2017-19, 313 agentes participaram de treinamentos gerenciais relevantes, treinamentos de indução e workshops específicos de prevenção à corrupção. Na Estônia, além dos quatro cursos de ética no programa de treinamento central, cada agência também pode oferecer programas internos adaptados às necessidades de seus agentes. Por exemplo, o Conselho Fiscal e Aduaneiro da Estônia introduziu o seu próprio módulo de ética adaptado às necessidades dos agentes fiscais e aduaneiros.

Leis, regras, códigos e expectativas mudam ao longo do tempo, e novas formas de violação de integridade e dilemas éticos podem surgir. Atualizações regulares sobre regras e padrões de integridade podem ajudar a garantir que os agentes públicos tenham as habilidades, conhecimentos e capacidade de resposta necessários.

No entanto, considerando todas as questões do setor público, uma quantidade limitada de tempo é dedicada ao treinamento. Conforme mostrado na Figura 8.3, entre 2010 e 2016, mais organizações relataram 1 a 3 dias de treinamento, com queda observada naquelas que ofereciam 7 a 10 dias. Dado o número de tópicos e áreas de treinamento que os agentes públicos devem realizar, o tempo dedicado ao treinamento de integridade em particular pode ser ainda mais limitado.

A regularidade do treinamento em integridade para agentes públicos varia e depende do tamanho em geral do serviço público, dos recursos humanos e financeiros dedicados à capacitação e se o treinamento em integridade é obrigatório ou voluntário, ou direcionado a categorias de agentes públicos expostos a riscos. Mesmo que os recursos dedicados ao treinamento de integridade sejam limitados, as organizações podem aproveitar as oportunidades pontuais. Estas incluem os períodos após reformas ou atos do serviço público, estabelecimento de novas regras ou funções e mudanças nos códigos gerais de conduta e/ou nas funções de “maior risco” (nomeações políticas, contratações, impostos, alfândegas, etc.) ou outros setores.

Embora o conteúdo varie de acordo com o contexto do país, o treinamento em integridade pode, no mínimo, incluir módulos sobre padrões de integridade, regras e valores, procedimentos administrativos (como gestão financeira e compras públicas), instrumentos de transparência e responsabilidade e medidas e controles para gerenciar os riscos para a integridade. O treinamento também pode abranger quais são os riscos de integridade e como identificá-los; o que é raciocínio ético e como aplicá-lo a ideias abstratas; e quais são os dilemas éticos e como gerenciá-los.

Tanto para a formação inicial como para a formação em serviço, existem vários métodos disponíveis para apoiar a oferta de formação em integridade (ver Tabela 8.1 para os principais métodos de treinamento). Os métodos devem ser adaptados de acordo com os objetivos do treinamento, pois alguns métodos podem não ser os mais eficazes para todas as circunstâncias. Métodos de ensino tradicionais, como palestras, mas também módulos de cursos à distância, e cursos online abertos massivos podem ser usados para transmitir conhecimento sobre padrões específicos de integridade, regras e procedimentos administrativos que existem para orientar a integridade no setor público (por exemplo, “baseado em regras”)). Por exemplo, o Escritório de Ética Governamental dos Estados Unidos (OGE) usou a primeira de três sessões de “capacitar o instrutor” de um curso online aberto massivo (MOOC) para introduzir o estatuto e os regulamentos das restrições de atuação profisional impostas àqueles que deixam cargos e funções públicas. O curso foi complementado por cenários e exercícios baseados em valores para os participantes realizarem como se estivessem confrontados com dilemas éticos reais. O treinamento baseado em valores concentra-se no desenvolvimento de atitudes e comportamentos em resposta a possíveis problemas de integridade que ocorrerão à medida que os agentes públicos cumprirem suas funções. Pode ser entregue através de formas mais interativas, incluindo estudos de caso, jogos de simulação, jogos de cartas ou de tabuleiro e role-playing. Por exemplo, na Áustria, o Ministério Federal do Interior usa um jogo interativo chamado “Fit 4 Compliance – Encontre seus valores” para discutir valores pessoais e como os valores do serviço público podem orientar os agentes públicos a lidar com situações difíceis e lidar com dilemas éticos. Esses métodos interativos e situacionais são usados para desafiar os trainees e permitir que reflitam sobre os principais dilemas, bem como sobre as consequências da falta ou violação da integridade; um debriefing segue a experiência.

O treinamento apoiado em dilemas é um exemplo de abordagens combinadas baseadas em regras e valores, pois envolve situações em que não há uma escolha óbvia entre as diferentes alternativas disponíveis. Por exemplo, a Agência para Agentes Públicos do Governo Flamengo oferece treinamento sobre dilemas a agentes públicos; os estagiários recebem situações práticas em que enfrentam um dilema ético sem um caminho claro para a resolução com integridade. Da mesma forma, o OGE nos Estados Unidos oferece treinamento presencial com uma série de cenários que visam fomentar o raciocínio ético e discutir dilemas éticos (US Office of Government Ethics, 2016[16]). O objetivo do treinamento apoiado em dilemas é transmitir que tais situações são inevitáveis e enfatizar a mensagem de que os agentes públicos devem buscar apoio quando enfrentarem tais situações (OECD, 2009[2]). O treinamento apoiado em dilemas também corre menos risco de ser percebido como ingênuo ou como mero requisito formal; pode produzir maiores resultados se for interativo e permitir que os participantes sejam confrontados com situações realistas que gerem um compromisso pessoal com a integridade (Bazerman and Tenbrunsel, 2011[17]). Assim, direcionar o treinamento apoiado em dilemas nas situações de trabalho dos agentes públicos ajuda a estimular a consciência moral dos participantes, contribui para seu nível de raciocínio moral e fornece métodos para ajudar a melhorar a qualidade moral de suas ações.

O conteúdo dos programas de treinamento de integridade pode ser limitado se for desenvolvido exclusivamente por órgãos de integridade sem conhecimento de métodos de ensino eficazes ou por órgãos de treinamento especializados sem conhecimento específico de questões de integridade. Como tal, envolver especialistas em integridade e especialistas no desenvolvimento e implementação de treinamento em integridade pode apoiar uma abordagem holística e relevante, bem como ajudar a definir e direcionar o público certo para cada tipo de treinamento. No Canadá, o órgão central, Secretaria do Conselho do Tesouro, trabalha em estreita colaboração com a Escola de Serviço Público do Canadá para desenvolver treinamento de integridade para agentes públicos. Recentemente, com base nessa cooperação, a Escola de Serviço Público do Canadá atualizou o curso de formação para agentes públicos sobre valores e ética, que, como mencionado acima, faz parte de um currículo obrigatório para recém-chegados. O curso também é usado por secretarias federais como uma atualização para os agentes públicos existentes, para garantir que eles entendam suas responsabilidades sob o Código de Valores e Ética do Setor Público (OECD, 2017[10]). Da mesma forma, na Alemanha, o Ministério Federal do Interior, Construção e Comunidade desenvolveu recentemente um novo conceito de formação com módulos personalizados para diferentes públicos-alvos (gestão de pessoas, agentes vulneráveis à corrupção, agentes que atuam com a prevenção da corrupção, agentes que trabalham nas unidades de preveção da corrupção). O momento, o conteúdo e os meios de treinamento são claramente definidos. Especialistas na área da prevenção da corrupção, auditoria interna, formação e gestão de recursos humanos colaboram com o conteúdo. Além disso, o Ministério e a Academia Federal de Administração Pública estão desenvolvendo, em conjunto, um programa de cursos à distância, levando em consideração as atuais percepções pedagógicas e tendências técnicas.

Conforme mostrado na Figura 8.4, a maioria dos países da OCDE monitora e avalia a qualidade de todas as atividades de treinamento; em regra, não medemo seu impacto (Pearson, 2011[18]). Isso pode ser explicado pelo fato de existirem poucas metodologias que permitem mensurar a efetividade e a mudança organizacional decorrentes do treinamento (Van Montfort, Beck and Twijnstra, 2013[19]). Aliado a isso, as diversas variáveis que podem influenciar a integridade dos agentes públicos que participaram das atividades de treinamento tornam complexa a mensuração dos resultados do treinamento (Pearson, 2011[18]).

Um dos modelos comumente conhecidos para avaliar o treinamento é o “Modelo de Quatro Níveis” de Kirkpatrick (Kirkpatrick, 1994[20]), descrito a seguir:

  • nível 1 – Reação, as impressões imediatas dos participantes e formadores, o que pensaram e sentiram sobre a formação

  • nível 2 – Aprendizagem , o desenvolvimento de conhecimentos, habilidades e atitudes resultantes do treinamento

  • nível 3 – Comportamento , a extensão do comportamento e melhoria da capacidade, e aplicação demonstrada do novo aprendizado dentro do ambiente de trabalho

  • nível 4 – Resultados , o impacto nos resultados do trabalho; o retorno do investimento em treinamento (Kirkpatrick, 1994[20]).

A maioria dos métodos de avaliação de treinamento de integridade se concentra no nível 1 “Reação” que os participantes têm do treinamento e não leva em consideração os níveis 2, 3 ou 4. Para resolver essa lacuna, as organizações públicas podem medir a mudança de comportamento por meio de avaliações pré e pós-treinamento na forma de uma avaliação multi-avaliador (McGivern and Bernthal, 2002[21]). Essas avaliações podem coletar dados úteis sobre se o treinamento de integridade está ajudando a organização a atingir seus objetivos, bem como justificar os custos de treinamento e informar ajustes na estratégia de treinamento.

Medir os “Resultados” do nível 4 requer avaliar as mudanças potenciais em relação a uma linha de base estabelecida antes de iniciar as atividades de treinamento. No contexto da integridade, nas organizações públicas, os indicadores potenciais podem incluir o seguinte:

  • número de casos em que agentes públicos procuraram consultoria e sobre questões específicas de integridade (que podem ser contabilizadas separadamente) e os resultados de tais casos;

  • número de divulgações de potenciais conflitos de interesse às autoridades competentes e as medidas de mitigação implementadas;

  • percepções sobre o nível de integridade e abertura da organização;

  • número de denúncias de cidadãos e empresas em que os agentes públicos não se comportaram com integridade na prestação de serviços públicos;

  • nível de satisfação dos cidadãos e empresas quanto à qualidade dos serviços prestados pelos agentes públicos.

No entanto, ao realizar avaliações de nível 4, as organizações públicas devem ter em mente que o ambiente não controlado dificulta o isolamento completo do impacto de um programa específico. Assim, é melhor acompanhar os resultados da avaliação por um período mais longo para identificar tendências no impacto do treinamento de integridade fornecido.

Embora a integridade seja, em última análise, responsabilidade de todos os agentes públicos, um órgão ou unidade ou pessoal dedicado à essa função pode apoiar a formação da integridade (OECD, 2009[2]). A institucionalização de uma função de consultoria de integridade pode assumir diferentes formas: dentro de um órgão do governo federal, como no caso da Austrália (discutido abaixo); através de um órgão especializado independente ou semi-independente; ou através de unidades de integridade nos órgãos e entidades. . Um exemplo de função consultiva independente pode ser encontrado na França, onde o HATVP fornece consultoria confidencial individual mediante solicitação aos agentes públicos eleitos e não eleitos de mais alto nível que se enquadram em seu escopo, e fornece orientação e apoio à sua instituição quando um desses agentes públicos o solicitam. Um exemplo de designação de unidades, oficiais ou conselheiros dedicados à integridade dentro dos ministérios de linha pode ser encontrado na Polônia, onde os conselheiros de integridade podem ser nomeados em ministérios e outros escritórios da administração pública. O seu papel é aconselhar na resolução de dilemas éticos e apoiar os agentes públicos na compreensão das regras e princípios éticos da função pública. Além disso, as unidades de integridade apoiam a liderança na disseminação do conhecimento sobre os princípios e na promoção de uma cultura de integridade no órgão.

Independentemente da composição institucional, as principais tarefas de uma função de consultoria de integridade são: fornecer consultoria sobre o conteúdo mediante solicitação; fornecer consultoriade integridade sobre o que é aceitável em circunstâncias específicas; e preparar orientações sobre quais devem ser as diretrizes da organização sobre questões-chave de integridade (OECD, 2009[2]). O uso de formas de comunicação escrita – como correio, e-mail ou por meio de um portal on-line – para entrar em contato com consultores de integridade pode ajudar na clareza da resposta e evitar o risco de interpretar mal o conselho oral. A definição de procedimentos claros para entrar em contato com o órgão consultivo, incluindo detalhes de contato, horário de funcionamento e tempos de resposta esperados, pode ajudar a facilitar o acesso. Além disso, especificar os limites da consulta (por exemplo, não equivale necessariamente a uma opinião legal) pode proteger os conselheiros de integridade e os agentes públicos de más interpretações. Deve ser dada especial atenção ao respeito da confidencialidade das trocas entre o consultor e os agentes públicos (por exemplo, um endereço de e-mail dedicado e/ou encriptado, acesso limitado a uma plataforma ou página web específica, etc.). Na Austrália, o Serviço Consultivo de Ética da Comissão de Serviço Público Australiano é disponibilizado a todos os agentes públicos. O site indica claramente como os funcionáriospodem acessar o serviço, com opções que incluem e-mail e telefone, e define padrões de entrega de serviços e padrões de privacidade. O site também detalha o que os funcionários podem e não podem esperar em termos de consultoria do Serviço de Consultoria de Ética (Australian Public Service Commission, 2019[22]).

Além de conselhos, ferramentas como Perguntas Frequentes podem informar os agentes públicos sobre valores e comportamentos, bem como sobre preocupações comumente abordadas. Além disso, a função consultiva pode fornecer comunicação regular sobre as conclusões gerais e o tipo de orientação e apoio fornecido aos agentes públicos. Isso pode ser feito por meio de um relatório anual de atividades ou pela publicação no site de resumos ou conclusões extraídas de pareceres solicitados durante um período específico ou para questões sistêmicas recorrentes ou específicas do setor (por exemplo, ética parlamentar, contratos públicos, etc.).

Uma função de consultoria de integridade também pode ser encarregada de outras demandas de integridade, transparência e abertura. Como pontos focais identificados no local de trabalho, os consultores de integridade estão em posição de facilitar a coordenação das políticas de integridade e transparência dentro da própria organização, bem como em cooperação com outras organizações e em conjunto com outros atores de integridade. Dada a sua posição, eles podem fornecer suporte aos gerentes de risco na avaliação e gerenciamento de riscos dentro de sua organização; difundir informações e procedimentos relacionados à integridade; e preparar eventos de capacitação ou ações de sensibilização no contexto específico do seu local de trabalho. Por exemplo, na Alemanha, os pontos focais de integridade têm a tarefa de manter os agentes informados sobre integridade e prevenção da corrupção (por exemplo, por meio de seminários e apresentações regulares) e de auxiliá-los com treinamento. Experimentando o mesmo local de trabalho que os colegas que eles aconselham e tendo conhecimento profundo dos padrões de serviço público, políticas de integridade e responsabilidades, eles podem orientar os colegas por meio de procedimentos de denúncia apropriados e também podem ser um canal de denúncia (Quadro 8.2). O importante é que esses órgãos não sejam responsáveis por investigar ou aplicar sanções, pois isso pode restringir seriamente seu acesso a agentes públicos com preocupações de integridade. Além disso, os conselheiros de integridade também podem supervisionar e monitorar a implementação dessas políticas e práticas (por exemplo, campanhas de conscientização, planos de treinamento de integridade, disponibilidade de recursos e orientações por escrito, dados relacionados a perguntas e solicitações de integridade etc.), relatar sobre isso, e ser responsabilizado pelos resultados (OECD, 2017[23]).

Recomenda-se que os conselheiros de integridade tenham o perfil apropriado, sejam treinados para ouvir os dilemas da equipe, dem exemplo pessoal, não sejam alternados com frequência e sejam capazes de estabelecer confiança com os funcionários. Algumas perguntas orientadoras podem ajudar a facilitar a nomeação do indivíduo apropriado para uma função de consultor de integridade (OECD, 2009[2]):

  • O indivíduo sabe qual é o comportamento esperado?

  • O indivíduo age com integridade?

  • O indivíduo tem um dever bem definido de discrição profissional? Especificamente, eles sabem quais são seus deveres e direitos quando ouvem sobre formas de irregularidades tão graves que podem haver um imperativo ético de quebrar sua discrição profissional?

  • Eles são suficientemente apoiados por uma unidade ou uma rede?

Embora os desafios possam variar dependendo dos contextos nacionais, os mais comuns em vários países incluem o seguinte:

  • fomentar o interesse através de fmodelos de treinamento inovadores e interativos

  • dedicar tempo e recursos à capacitação e orientação para a integridade

  • garantir a coordenação eficaz das unidades responsáveis pelo treinamento em integridade

  • garantir responsabilidades claras e evitar o uso indevido de consultoria em integridade.

O formato e o conteúdo do treinamento relacioado à tematica de integridade são importantes para gerar interesse. A ênfase em aspectos de definição, cursos desatualizados ou idênticos ao longo do tempo e abordagens teóricas em vez de conteúdos práticos podem limitar o interesse e a participação no treinamento. Além disso, a ausência de interação, discussão e experimentação, bem como feedback e avaliação limitados, podem prejudicar a qualidade e o impacto do conteúdo do treinamento, o interesse e a participação potencial.

Para fomentar o interesse e a participação, o conteúdo e os formatos de treinamento devem permitir que os participantes compartilhem suas experiências e os riscos específicos que enfrentam em seu local de trabalho, atuem como se estivessem em situações reais e discutam e tentem resolver dilemas existentes e recorrentes. Isso pode resultar na elaboração de treinamento para funções ou setores específicos na gestão de risco, conforme mencionado acima, e no uso de diferentes formatos e ferramentas.

A disponibilidade e acessibilidade do conteúdo de treinamento pode ser abordada por meio de plataformas e soluções online, que permitem aos agentes públicos que não podem participar fisicamente das oportunidades de treinamento acessar cursos, estudos de casos práticos e fóruns para discutir dilemas éticos. No entanto, deve-se enfatizar que o treinamento on-line não substitui o treinamento interativo presencial, a reflexão, as discussões ou a experiência.

As atividades de capacitação requerem tempo e recursos para coordenar os atores; conceber, implementar e avaliar conteúdos; e adaptar o formato com base no feedback. Da mesma forma, a difusão de materiais de orientação e treinamento, seja on-line ou por meio de cartazes, folhetos, protetores de tela, podcasts, etc., pode depender do uso de canais existentes (sites, intranet, e-mails, comunicação escrita), mas também pode exigir o desenvolvimento de sistemas, como plataformas online. As agências responsáveis pela implementação do material de formação e orientação requerem demandas adequadas, bem como os recursos financeiros e humanos.

A alocação de funções para supervisão, promoção, coordenação e administração de oportunidades de aprendizagem no setor público varia e pode envolver uma infinidade de atores. A falta de coordenação dos atores responsáveis pelo treinamento em integridade pode surgir da preferência por “trabalhar em caixinhas” devido a diferentes culturas institucionais e estruturas de governança. A fragmentação do treinamento de integridade pode resultar na elaboração de programas com objetivos e metodologias divergentes, levando a diferentes interpretações e explicações de valores e condutas esperadas em todo o setor público.

Funções de coordenação – como uma organização líder designada ou uma plataforma online para todo o material de treinamento do setor público – e a colaboração entre agências podem garantir que os programas existentes sejam coerentes e alinhados. Por exemplo, uma organização líder designada para treinamento de integridade pode comunicar todo o material de treinamento de integridade e garantir que o conteúdo seja válido, atualizado e adaptado aos riscos em nível organizacional e individual.

Existem vários desafios associados ao papel do consultor de integridade:

  • A função do consultor de integridade pode minar o senso de responsabilidade de outros atores da organização pela gestão da integridade.

  • Diretrizes conflitantes que podem ser dadas pelo consultor de integridade e pela alta administração dentro da organização.

  • O proveito de consultorias já prestadas anteriormente para aplicação em outros casos semelhantes ou na tomada de decisões futuras, mesmo que os detalhes da situação possam ser diferentes

Para enfrentar esses desafios, podem ser definidas medidas para esclarecer que os consultores de integridade podem ser consultados quando outros atores (por exemplo, o líder ou a alta administração) não são capazes de fornecer conselhos satisfatórios e para garantir que seus conselhos sejam compartilhados (quando apropriado) com o liderança e gestores para evitar orientações conflitantes para os agentes públicos (OECD, 2009[2]).

Referências

[22] Australian Public Service Commission (2019), “Ethics advisory service charter”, https://www.apsc.gov.au/ethics-advisory-service-service-charter (accessed on 18 June 2019).

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[7] Bursztyn, L. et al. (2016), “Moral incentives in credit card debt repayment: Evidence from a field experiment”, NBER Working Paper, No. 201611, http://home.uchicago.edu/~bursztyn/Moral_Incentives_20161115.pdf.

[9] Gino, F. and C. Mogilner (2014), “Time, money, and morality”, Psychological Science, Vol. 25/2, https://doi.org/10.1177/0956797613506438.

[14] HATVP (2019), Guide déontologique: Manuel à l’usage des responsables publics et des référents déontologues, HATVP, Paris, https://www.hatvp.fr/wordpress/wp-content/uploads/2019/04/HATVP_guidedeontoWEB.pdf (accessed on 31 May 2019).

[13] HATVP (2019), Rapport d’activité 2018, HATVP, Paris, https://www.hatvp.fr/rapports_activite/rapport_2018/pdf/HATVP_RA2018.pdf (accessed on 31 May 2019).

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[6] Mazar, N. and D. Ariely (2006), “Dishonesty in Everyday Life and Its Policy Implications”, Source Journal of Public Policy & Marketing, Vol. 25/1, pp. 117-126, http://www.jstor.org/stable/30000530.

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[4] OECD (2017), Skills for a High Performing Civil Service, OECD Public Governance Reviews, OECD Publishing, Paris, https://doi.org/10.1787/9789264280724-en.

[15] OECD (2016), “Country case: Integrity training in Germany”, Public Procurement Toolbox, p. 1, http://www.oecd.org/governance/procurement/toolbox/search/integrity-training-in-germany.pdf (accessed on 31 May 2019).

[12] OECD (2016), Survey on Strategic Human Resources Management in Central / Federal Governments of OECD Countries, OECD, Paris, https://qdd.oecd.org/subject.aspx?Subject=GOV_SHRM.

[2] OECD (2009), Towards a Sound Integrity Framework: Instruments, Processes, Structures and Conditions for Implementation (GOV/PGC/GF(2009)1), Conference Paper, OECD Global Forum on Public Governance, Paris, http://www.oecd.org/officialdocuments/publicdisplaydocumentpdf/?doclanguage=en&cote=GOV/PGC/GF(2009)1.

[18] Pearson, J. (2011), “Training and beyond: Seeking better practices for capacity development”, OECD Development Co-operation Working Papers, No. 1, OECD Publishing, Paris, https://doi.org/10.1787/5kgf1nsnj8tf-en.

[8] Pruckner, G. and R. Sausgruber (2013), “Honesty on the streets: A field study on newspaper purchasing”, Journal of the European Economic Association, https://doi.org/10.1111/jeea.12016.

[11] SBST (Social and Behavioural Sciences Team) (2015), Social and Behavioral Sciences Team: Annual Report, Executive Office of the President National Science and Technology Council, Washington, D.C., https://sbst.gov/download/2015%20SBST%20Annual%20Report.pdf (accessed on 17 June 2019).

[16] US Office of Government Ethics (2016), Library of Annual Training Scenarios, https://www.oge.gov/Web/OGE.nsf/Education%20Resources%20for%20Federal%20Employees/BCFC70031753234685258049005094CE?opendocument (accessed on 24 September 2019).

[19] Van Montfort, A., L. Beck and A. Twijnstra (2013), “Can Integrity Be Taught in Public Organizations?”, Public Integrity, Vol. 15/2, pp. 117-132, https://doi.org/10.2753/PIN1099-9922150201.

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