3. Políticas e instituições de governança regulatória no Brasil

No Brasil, a agenda de melhoria da regulação remonta a 2007 com a criação do programa PRO-REG. Isso coincidiu com o Estudo da OCDE sobre a Reforma Regulatória no Brasil de 2008 (OECD, 2008[1]), o qual forneceu recomendações que impulsionaram a política de melhoria da regulação no país. O principal objetivo do PRO-REG era melhorar a qualidade dos atos normativos publicados pelo governo federal. Em sua primeira fase (até 2013), o programa concentrou-se no diagnóstico do ambiente regulatório e no desenvolvimento de capacidades para melhorar o quadro normativo do país. Após 2013, a principal ênfase da iniciativa foi a divulgação de boas práticas e ferramentas de regulação. A partir de 2016, as iniciativas de melhoria da regulação ganharam força.

Entre 2016 e 2018, a Casa Civil enfatizou os esforços de coordenação a fim promover mudanças culturais voltadas para as melhores práticas regulatórias e acelerar a implementação de melhores ferramentas regulatórias em nível federal. O governo federal aprovou vários dispositivos legais para reduzir a burocracia na administração federal, promover a avaliação dos atos normativos existentes e iniciar um uso mais sistemático das ferramentas de política regulatória.

Embora a regulação não seja o único caminho para atingir os objetivos das políticas públicas, uma estrutura regulatória de alta qualidade pode ajudar os governos a atingir seus objetivos de maneira efetiva. Os governos adotaram o ciclo de política regulatória como um processo que leva em conta a publicação, implementação e avaliação de normas para garantir a elaboração de uma estrutura regulatória que traga benefícios para a sociedade, o meio ambiente e a economia, entre outros. Nesse ciclo, as normas fazem parte de um processo abrangente que começa com a identificação de um problema de política pública (ver Figura 3.1). A escolha do instrumento para resolver esse problema é feita durante a elaboração de uma análise de impacto regulatório (AIR). De preferência, as AIRs levam em conta várias opções para atingir um objetivo de política pública, sendo a regulação uma das alternativas. Se a regulação for a opção escolhida, ferramentas como controle regulatório, monitoramento e avaliações ex post tornam-se ainda mais relevantes.

A estratégia brasileira para a implementação de uma agenda de melhoria da regulação considera cada um dos blocos como um sistema interconectado que constitui o ciclo de política regulatória, apoiado por atividades horizontais, ou seja, paricipação social, coordenação, cooperação e comunicação, em vez de elementos independentes e autossuficientes. Portanto, a estrutura legal da política regulatória no Brasil está presente em vários instrumentos. Esse marco, entretanto, não é exaustivo em relação às ferramentas de gestão regulatória que aborda, nem em relação à exigência de sua implementação em todo o governo.

A Lei das Agências Reguladoras (Lei nº 13.848/2019) e a Lei da Liberdade Econômica (Lei nº 13.874/2019) são os dois principais diplomas legais que apoiam a implementação de ferramentas específicas de política regulatória no governo federal brasileiro. O primeiro obriga a adoção de ferramentas de melhoria da regulação para apenas 11 agências reguladoras,1 enquanto o segundo tem uma forte ênfase na concorrência econômica, sendo relevante para a maioria das entidades do governo federal.

Vários decretos e normas resultaram da Lei de Liberdade Econômica. Esses instrumentos criaram um escopo mais amplo para a gestão regulatória e os elementos exigidos, isto é, licenciamento, análise de impacto regulatório e revisão do estoque regulatório (ver Quadro 3.1 para mais detalhes sobre esses decretos). Como no caso da norma que apoia sua elaboração, esses decretos aplicam-se a um subconjunto de atos normativos, atividades e procedimentos. Por exemplo, o Decreto para a revisão do estoque regulatório (Decreto nº 10.139/2019) é relevante apenas para aqueles dispositivos legais que são inferiores a decreto. Além disso, a Lei das Agências Reguladoras (Lei nº 13.848/2019) torna obrigatória a consulta pública da análise de impacto e do projeto de regulação apenas para as 11 agências reguladoras e opcional para o resto da administração pública federal.

Em termos de simplificação administrativa e redução do estoque regulatório,2 o Brasil está tomando medidas para melhorar o ambiente de negócios. Em especial, a Lei nº 11.598/2007 que cria a Rede Nacional para a Simplificação do Registro e da Legalização de Empresas e Negócios (Redesim) e as medidas tomadas como parte do compromisso do atual governo de aumentar a competitividade do país e a digitalização são os motivadores desses esforços. Alinhada com os aspectos ligados à Lei de Liberdade Econômica, a ênfase das atividades de redução da carga regulatória é melhorar o ambiente empresarial, concentrando-se em um determinado conjunto de formalidades e procedimentos governamentais.

O Brasil implementou alguns dos pilares para a elaboração de uma política regulatória bem-sucedida. Por exemplo, o país tornou a AIR obrigatória para as entidades do governo federal e instituiu a obrigação de que as agências reguladoras realizem consultas públicas. A implementação desses esforços ainda precisa ser definida como parte de uma estratégia de melhoria da regulação para todo o governo. A abordagem adotada até agora baseia-se no contexto político e econômico para criar uma melhor regulação. Aproveitar as oportunidades existentes e o ambiente atual é uma boa maneira de implementar ferramentas de gestão regulatória sem passar por processos mais formais e demorados. Entretanto, é importante que essas atividades sejam mais integradas para representar uma política clara e abrangente de melhoria da regulação. Além disso, a inclusão da política regulatória do país em um único documento de alto nível protege não apenas os esforços feitos até agora, mas também os futuros contra mudanças no cenário ou prioridades políticas e garante sua sustentabilidade com o passar do tempo (ver Quadro 3.2 para um retrato da política regulatória do Canadá).

Conforme mencionado acima, alguns avanços proporcionaram uma janela de oportunidades para a implementação de elementos de política regulatória. Por exemplo, o objetivo do atual governo de incentivar a competitividade e a concorrência econômica resultou na aprovação da Lei de Liberdade Econômica. Outro exemplo é o uso de obrigações internacionais para implementar ferramentas de gestão regulatória no processo nacional de elaboração de normas. Esse aspecto foi particularmente destacado durante as discussões no âmbito da missão de apuração dos fatos deste relatório. Em 2020, o Brasil assinou o Acordo de Comércio e Cooperação Econômica entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo dos Estados Unidos da América Relacionado a Regras Comerciais e Transparência, que conta com um anexo sobre boas práticas regulatórias. Alguns interessados indicaram a possibilidade de utilizar a exigência de consulta pública prevista no Acordo para legitimar sua implementação em todo o governo federal.3 A experiência do México após a aprovação do Acordo de Livre Comércio da América do Norte (NAFTA) em 1994 mostra que o tratado foi um elemento importante para estimular a adoção de algumas práticas no país.

Aproveitar as exigências internacionais para impor a adoção de ferramentas de gestão regulatória é uma forma de iniciar a implementação de determinadas ferramentas. Entretanto, isso não leva em conta a falta de um documento único de política que enxergue o ciclo de política regulatória como um processo holístico com responsabilidades e liderança claras. Uma abordagem governamental única da política regulatória anda lado a lado com a elaboração de um documento abrangente que promova a qualidade regulatória em todo o governo. Essa declaração de política ajuda a dar consistência às ações e responsabilidades das partes envolvidas. Ela também ajuda a definir objetivos e metas, além de fornecer um referencial a partir do qual os esforços podem ser avaliados.

Embora a publicação de uma declaração geral com objetivos e atribuições claros não represente uma condição necessária para a implantação de ferramentas de gestão regulatória na administração pública, uma das principais recomendações da OCDE é alcançar uma estrutura regulatória de alta qualidade (OECD, 2012[4]). Com uma política de governo única, os governos podem criar mecanismos de cooperação que levam em consideração instituições, interessados e comunidades de políticas públicas. Dessa forma, seria possível utilizar os recursos de forma mais eficiente e extrair os benefícios de melhores regulações. O Quadro 3.3 enumera os principais elementos que uma política de governo única de melhoria regulatória deve incluir.

Mesmo que os países possam adotar diferentes abordagens para integrar a política regulatória em seus governos, a edição de um documento ou declaração abrangente em apoio a essa política é fundamental. Na realidade, a Recomendação da OCDE sobre Política Regulatória e Governança incentiva os países a “editar uma declaração de política formal e vinculativa que apoie a reforma regulatória, incluindo diretrizes para o uso de ferramentas e procedimentos de política regulatória” (2012[4]). Essa recomendação tem sido amplamente adotada pelos países membros da OCDE. Como mostram os dados dos Indicadores de Política Regulatória e Governança (iREG) da OCDE, em 2018, a maioria dos países membros da OCDE já dispunham de uma clara política de govenro única de qualidade regulatória. (OECD, 2018[5]).

Por fim, a declaração de política deve identificar as responsabilidades das diferentes instituições e áreas administrativas com um papel na elaboração, gestão e adoção da política regulatória no país. É importante incluir também arranjos claros e explícitos de coordenação para facilitar a implementação das ferramentas de gestão regulatória e para promover a responsabilização. A próxima subseção fornece uma visão geral do arranjo institucional do Brasil para a política regulatória.

O cenário institucional da política regulatória no Brasil compreende vários órgãos com um papel na implementação de ferramentas de gestão regulatória. Tendo em vista essa variedade de instituições e a forma como os esforços de melhoria da regulação foram implementados no país, algumas funções importantes de supervisão regulatória ainda não foram claramente definidas nem atribuídas. Além disso, as áreas administrativas que se esforçam para melhorar a regulação parecem trabalhar em silos, inclusive em um mesmo ministério. O Quadro 3.4 descreve as principais responsabilidades das entidades que lidam com aspectos do ciclo de política regulatória no governo federal.

É fundamental que o departamento que lidera a elaboração e implementação da política regulatória do país tenha competências técnicas necessárias. Isso garante que as ferramentas sejam adotadas e implementadas corretamente em todo o governo e que as funções de supervisão e controle de qualidade sejam baseadas em conhecimento. Ao mesmo tempo, é importante que o órgão de supervisão tenha o poder e o apoio político para garantir que os esforços de melhoria da regulação sigam uma abordagem de governo única (ver Figura 3.2 para um retrato da localização dos ROBs em toda a OCDE).

No Brasil, a Casa Civil era anteriormente a instituição que liderava os esforços na implementação da política regulatória no Brasil, ou seja, a AIR. Com a criação do novo Ministério da Economia, a supervisão da AIR foi transferida para a Secretaria de Acompanhamento Econômico (SEAE).

As atribuições, responsabilidades e arranjos institucionais do sistema de supervisão regulatória variam entre os países da OCDE. Em algumas jurisdições, as funções de supervisão regulatória estão concentradas em um único órgão (ou seja, Comissão Nacional de Melhoria Regulatória do México, CONAMER), enquanto em outras, elas são atribuídas a várias áreas administrativas ou diferentes instituições. Independentemente da composição, Renda e Castro identificam quatro funções principais dos órgãos de supervisão regulatória (Forthcoming[6]). As subseções a seguir descrevem o ecossistema de supervisão regulatória brasileiro sob a ótica dessas funções principais.

A função de controle de qualidade das ferramentas de gestão regulatória se concentra em três elementos principais: análises de impacto regulatório, participação social e avaliações ex post, sendo a primeira a mais amplamente desenvolvida nos países membros da OCDE. O órgão de supervisão regulatória (ROB) responsável pelo controle de qualidade desempenha um papel fundamental para garantir que os atos normativos sejam elaborados utilizando uma análise completa e seguindo metodologias que avaliem os possíveis custos e benefícios das alternativas analisadas. Além disso, ao garantir processos adequados de participação social, o ROB promove uma regulação mais aceitável e inclusiva.

No Brasil, o exame das ferramentas de gestão regulatória está em seus estágios iniciais e restringe-se à avaliação das AIRs. A SEAE é o órgão responsável pelo exame das AIRs dos atos normativos infralegais (Decreto nº 10.411/2020). Entretanto, a SEAE não realiza uma avaliação sistemática das AIRs e seus pareceres não são vinculativos. Os pareceres devem ser disponibilizados ao público, o que pode acabar incentivando uma maior qualidade da avaliação, funcionando como um mecanismo de denúncia pública. É importante enfatizar que, para que os mecanismos de denúncia pública funcionem, a autoridade de supervisão da SEAE deve estar protegida de interferências políticas. Quando este relatório estava sendo preparado, a equipe da OCDE não conseguiu identificar evidências para avaliar a eficácia desse mecanismo nem seu possível efeito na qualidade das AIRs. Além disso, a Secretaria não está em condições de devolver a avaliação à agência que a apresentou. Por fim, o Decreto nº 10.411/2020 define as bases para a avaliação ex post dos atos normativos ou avaliação do resultado regulatório (ARR). Entretanto, o decreto não define um órgão supervisor para essas avaliações.

Talvez a necessidade de dispor de recursos adequados para desempenhar essa função seja tão importante quanto outorgar um mandato claro e explícito ao ROB para o controle de qualidade. O papel de proteção do órgão de supervisão regulatória deve ser apoiado por uma equipe com o nível adequado de especialização e com os devidos recursos financeiros. Como o ROB funciona como uma central, que reúne as partes relevantes do governo, os funcionários devem ter as ferramentas para identificar como os possíveis efeitos de uma proposta de regulação podem afetar outras agências e interessados. Quando este relatório estava sendo preparado, a SEAE tinha uma equipe de 22 funcionários para examinar as análises de impacto regulatório de todo o governo federal, além de outras tarefas. É muito cedo para dizer se a Secretaria tem os recursos necessários disponíveis para desempenhar essa função corretamente. Entretanto, representantes do centro do governo enfatizaram que, dadas as condições fiscais rigorosas do país, eles não planejam alocar mais recursos para a política regulatória, mas sim mudar a cultura e fazer melhor uso dos recursos disponíveis.

A disponibilidade de orientações e apoio adequados é fundamental para a implementação de uma política regulatória sólida. Reguladores, ministérios e outras instituições não devem enxergar os esforços de melhoria da regulação como mais um ônus, mas sim como ferramentas que incentivam a consecução dos objetivos das políticas públicas. Ter um órgão de supervisão regulatória que ofereça atividades de capacitação pode ajudar a reduzir a resistência que os ministérios ou outras entidades possam ter em relação à política regulatória e pode aumentar sua confiança no uso de ferramentas de gestão regulatória.

No Brasil, o Ministério da Economia encabeçou os esforços para fornecer orientações e assessoria na implementação de ferramentas de gestão regulatória. Na realidade, vários ministérios e instituições enfatizaram a disponibilidade da equipe do Ministério da Economia para ajudar a lidar com questões e dúvidas na implementação da AIR. Além disso, para se preparar para a nova exigência de realizar a AIR, o Ministério publicou uma série de manuais e diretrizes para ajudar na análise de impacto regulatório a ser implementada. Esses documentos concentram-se no poder executivo federal e, em alguns casos, com ênfase especial ao Ministério da Economia, mas estão disponíveis ao público e são uma referência para outros ministérios ou instituições. Os documentos orientativos mais relevantes são:

  • Diretrizes para Elaboração de Análise de Impacto Regulatório (Ministério da Economia, 2021[7])

  • Análise de Impacto Regulatório, Perguntas Frequentes (Ministério da Economia, 2021[8])

  • Participação social no âmbito do Decreto sobre Análise de Impacto Regulatório (Ministério da Economia, 2021[9])

  • Coleta e tratamento de dados no âmbito do Decreto sobre Análise de Impacto Regulatório (Ministério da Economia, 2021[10])

  • Modelo de Governança da Análise de Impacto Regulatório do Ministério da Economia (Ministério da Economia, 2021[11])

  • Diretrizes para a Avaliação de Resultado Regulatório (Ministério da Economia, 2022[12])

Há alguns anos, as agências reguladoras brasileiras implementaram a AIR e outras ferramentas de gestão regulatória. Isso permitiu que desenvolvessem conhecimentos e boas práticas que podem ser compartilhados por todo o governo. A troca de aprendizados pode ajudar a aliviar as preocupações que outras agências possam ter e pode ajudar a incorporar a política regulatória na cultura dos ministérios e outras instituições.

Por fim, a Escola Nacional de Administração Pública (ENAP) também é um ator importante na oferta de treinamento e atividades de capacitação. A Escola realiza cursos sobre análise de impacto e outros estudos regulatórios que podem ser acessados virtualmente e disponibilizados para um grande número de funcionários públicos. O Quadro 3.5 fornece uma breve descrição das atividades de treinamento para gerar conhecimento especializado em AIR na Austrália.

No Brasil, nenhuma área ou áreas administrativas estão explicitamente encarregadas de coordenar a agenda de políticas regulatórias. Por exemplo, tanto o Ministério da Economia quanto a Casa Civil participam da avaliação dos possíveis efeitos dos atos normativos. O Ministério da Economia, especialmente a SEAE, está envolvido na garantia de qualidade das AIRs de atos normativos infralegais (Decreto nº 10.411/2020), enquanto a Casa Civil também pode exigir uma análise de impacto para determinados decretos e leis. Entretanto, não existe um vínculo de trabalho entre as duas instituições, mesmo que as duas entidades tenham um papel na edição dos atos normativos. A falta de um mandato claro dificulta a designação de uma agência responsável por garantir a qualidade da AIR, ainda mais de todo o ciclo regulatório.

Anteriormente, a Casa Civil liderava a gestão da política regulatória no Brasil. Os recursos técnicos disponíveis no Ministério da Economia e o contexto político do país direcionaram a realocação da agenda de AIR para o Ministério da Economia. No futuro, é importante que, uma vez que um departamento ou entidade tiver assumido a frente dos esforços de melhoria da regulação, ele adote uma visão holística do ciclo regulatório e receba o apoio devido. A aprovação da agenda de melhoria da regulação pela liderança política do país ajuda a reforçar a validade da instituição ou da área administrativa encarregada da política. Os arranjos de liderança e governança são fundamentais para garantir a implementação de um sistema bem-sucedido de políticas regulatórias (OECD, 2012[4]). A coordenação e colaboração entre o órgão (ou órgãos) de supervisão regulatória, ministérios e agências são decisivos para garantir a adoção de ferramentas e práticas de gestão regulatória.

Como no caso da AIR, os esforços de simplificação administrativa poderiam tirar proveito de uma coordenação mais estreita entre os atores relevantes do governo. O governo federal criou programas destinados a enfrentar a enorme carga administrativa sobre cidadãos e empresas no Brasil. As três principais iniciativas são: i) O caminho para os Top 50 países mais competitivos, ii) O Programa de Digitalização de Serviços Públicos, e iii) A Rede Nacional para a Simplificação do Registro e da Legalização de Empresas e Negócios (Redesim) (consulte o capítulo 4 para obter mais detalhes). Embora as três estratégias tenham gerado (e continuem a gerar) benefícios e melhorado a eficiência, esses esforços são isolados. Cada iniciativa está sob a gestão de uma área administrativa diferente do Ministério da Economia. Entretanto, nenhuma política ou coordenador central abrange os três programas. Um órgão que coordene a simplificação administrativa e a integre na política regulatória do país pode garantir que as sinergias sejam exploradas e que a regulação gere uma carga mais leve para os brasileiros. Para conhecer um exemplo de coordenação entre instituições em matéria de melhoria da regulação, consulte o Quadro 3.6.

Outro aspecto em que o ROB desempenha um papel importante de coordenação é na consistência regulatória entre os níveis de governo. No Brasil, esse aspecto tem sido considerado apenas de maneira superficial, na medida em que o forte caráter federativo do país tem sido visto como uma desvantagem para o desenvolvimento efetivo de mecanismos de coordenação. Na realidade, a colaboração para a melhoria da regulação entre o governo federal, estados e municípios foi percebida como um tema bastante sensível durante a preparação deste relatório. Embora o capítulo 5 descreva em detalhes os arranjos de governança com governos subnacionais, é importante que o órgão de supervisão regulatória responsável pela coordenação da política de melhoria da regulação em nível federal assuma um papel de liderança na promoção dessa política entre estados e municípios.

Em termos práticos, uma maneira de promover a colaboração entre as agências é criando redes de formuladores de políticas. Atualmente, existem duas redes por meio das quais reguladores e ministérios podem entrar em contato uns com os outros para trocar experiências e boas práticas. A Rede de Articulação das Agências Reguladoras (RADAR), criada em 2018, reúne as 11 agências reguladoras incluídas no âmbito da Lei de Agências Reguladoras. A Rede oferece um espaço para a discussão de temas como regulação baseada em risco, controle e fiscalização da regulação, carga administrativa, entre outros. Por outro lado, os ministérios e agências reguladoras reúnem-se a cada dois ou três meses para compartilhar boas práticas regulatórias no Encontro de Reguladores Federais. Essa iniciativa vai na direção certa, mesmo que a participação nas atividades seja voluntária e bastante informal. Vale ressaltar que existe um grupo de trabalho específico no âmbito dessas reuniões que se concentra na regulação comercial.

A quarta função principal dos órgãos de supervisão regulatória refere-se à avaliação sistêmica da política regulatória. Como no caso de outras políticas do governo, é importante definir metas e objetivos, mas também ser capaz de avaliar o impacto dos esforços e recursos dedicados a atingir esses objetivos. Como o Brasil ainda está no processo de elaboração de uma política de governo única de melhoria da regulação, este é o momento certo para definir um sistema de monitoramento e avaliação. Ter uma perspectiva global dos esforços em política regulatória permite melhorias em todo o sistema e a criação de ciclos de feedback.

Quando se fala de política regulatória, geralmente o foco tende a ser a AIR, a participação social e a avaliação ex post dos atos normativos. Uma regulação de alta qualidade vai muito além desses três pilares e inclui elementos como planejamento prévio, monitoramento e avaliação de sistemas de AIR, controle e fiscalização da regulação, entre outros. No Brasil, várias dessas ferramentas já estão entre as tarefas realizadas por algumas entidades. Entretanto, é importante assegurar que esses mecanismos façam parte do ciclo regulatório do país para se chegar a uma política criteriosa. As subseções a seguir descrevem as realizações e as áreas de oportunidade do governo brasileiro em termos de planejamento regulatório e atividades de controle e fiscalização.

Os reguladores e as partes reguladas são beneficiados pela elaboração de agendas que descrevem as mudanças normativas previstas. Além de incentivar a transparência e a responsabilidade, melhorando a coordenação das instituições do governo, o planejamento fornece aos interessados um roteiro do trabalho do regulador. No Brasil, a publicação de um planejamento prévio ou agenda regulatória é obrigatória apenas para as agências reguladoras incluídas no âmbito da Lei de Agências Reguladoras. A agenda deve estar alinhada com o planejamento estratégico da agência e estar disponível ao público na sede e no sítio eletrônico da entidade (Lei nº 13.848/2019, Art. 21). Outras instituições podem ter uma exigência interna de publicar uma agenda regulatória, como é o caso da Comissão de Valores Mobiliários (CVM). O regulamento interno da CVM estabelece que a Comissão deve elaborar uma agenda regulatória para o ano subsequente (Portaria CVM/PTE 190/19). Como no caso das agências reguladoras, a agenda proposta é aprovada pelo Colegiado e inclui uma priorização dos projetos e se as propostas estariam sujeitas à AIR.

No caso dos ministérios, o planejamento prévio da regulação está mais institucionalizado para as leis primárias. A partir de 2022, a Casa Civil é obrigada a publicar a agenda prioritária do governo (Decreto nº 10.907/2021). Esse documento inclui uma compilação das propostas legislativas (leis primárias) que os ministérios consideram prioritárias para o ano subsequente. Em 2022, os ministérios apresentaram 531 propostas, que foram avaliadas e aprimoradas pela Casa Civil. A agenda final incluiu 45 propostas agrupadas em dez temas principais4 (Casa Civil, 2022[17]). A publicação da agenda prioritária do governo é um esforço para aumentar a transparência e a previsibilidade do governo em relação ao Congresso e a partes interessadas relevantes.

Embora a obrigação de elaborar uma agenda regulatória não se aplique aos ministérios, algumas áreas administrativas e entidades estão incorporando o planejamento prévio em seu processo normativo. Por exemplo, o Ministério da Infraestrutura (MINFRA) publicou, em 2020, sua Agenda Regulatória de Trânsito para o período 2021-2022 (Portaria nº 2.663/2020). Na mesma linha, o Ministério da Agricultura disponibilizou ao público sua agenda regulatória para 2021-2022 (Portaria nº 277/2020).

Embora essa ferramenta não tenha sido adotada sistematicamente em todo o governo federal, as disposições do acordo recentemente assinado entre os Estados Unidos e o Brasil5 devem ajudar na promoção do uso de agendas regulatórias no governo federal. Não está claro, entretanto, quando essa obrigação entrará em vigor. As agendas regulatórias das agências reguladoras, assim como as de um subgrupo de ministérios, estão disponíveis no sítio eletrônico do Ministério da Economia.

Um ponto relevante no ciclo de política regulatória refere-se aos esforços que os governos fazem para fiscalizar as partes reguladas e impor o cumprimento das normas. Os governos podem incorporar elementos importantes para criar um sistema de controle e fiscalização de alta qualidade na política de melhoria da regulação do país. O Brasil tomou algumas medidas para incentivar a melhoria das fiscalizações, introduzindo considerações sobre risco na Lei de Liberdade Econômica e no Decreto nº 10.178/2019. O enfoque dessas leis foi a classificação das atividades econômicas com base em seu nível de risco e a fiscalização pós-mercado das atividades consideradas de baixo risco. Essas medidas vão na direção certa e poderiam ajudar a elaborar uma estratégia mais articulada de controle e fiscalização sob uma perspectiva de melhoria da regulação (ver Quadro 3.7 para mais detalhes sobre os princípios de bons ecossistemas de controle e fiscalização).

As agências reguladoras tomaram algumas medidas para fortalecer seus sistemas de controle e fiscalização. Entretanto, esses esforços não são sistematizados nem difundidos em todo o governo. As evidências coletadas pela equipe do estudo mostram que existem problemas graves a serem resolvidos para garantir que as atividades de conformidade regulatória sejam adequadas, eficientes e baseadas em evidências. Entre as principais áreas de oportunidade estão:

  • As diferentes interpretações das leis e normas

  • Pouca padronização de procedimentos e coordenação entre as instituições e níveis de governo envolvidos no processo de fiscalização

  • Estruturas de alocação de recursos das entidades de fiscalização.

Referências

[17] Casa Civil (2022), Agenda Legislativa prioritária do Governo Federal para 2022, https://www.gov.br/casacivil/pt-br/assuntos/noticias/pautas-prioritarias-de-2022 (accessed on 16 March 2022).

[15] Department for Business, E. (2020), Better Regulation Framework, Interim guidance, https://assets.publishing.service.gov.uk/government/uploads/system/uploads/attachment_data/file/872342/better-regulation-guidance.pdf (accessed on 18 June 2020).

[3] Government of Canada (2018), Cabinet Directive on Regulation, https://www.canada.ca/en/government/system/laws/developing-improving-federal-regulations/requirements-developing-managing-reviewing-regulations/guidelines-tools/cabinet-directive-regulation.html (accessed on 26 April 2022).

[19] Government of Canada (n.d.), Guide to Making Federal Acts and Regulations: Cabinet Directive on Law-Making, https://www.canada.ca/en/privy-council/services/publications/guide-making-federal-acts-regulations/guide-making-federal-acts-regulations-cabinet-directive-law-making.html (accessed on 6 April 2020).

[14] Government of the United Kingdom (2022), Regulatory Policy Committee, https://www.gov.uk/government/organisations/regulatory-policy-committee (accessed on 2 February 2019).

[12] Ministério da Economia (2022), Guia Orientativo para Elaboração de Avaliação de Resultado Regulatório-ARR, https://www.gov.br/economia/pt-br/assuntos/air/guias-e-documentos/GuiaARRverso5.pdf (accessed on 16 March 2022).

[8] Ministério da Economia (2021), Análise de Impacto Regulatório; Perguntas Frequentes, https://www.gov.br/economia/pt-br/assuntos/air/o-que-e-air/copy_of_1.AIRFAQ.pdf (accessed on 7 February 2022).

[10] Ministério da Economia (2021), Coleta e Tratamento de Dados no Âmbito do Decreto da Análise de Impacto Regulatório-AIR, https://www.gov.br/economia/pt-br/assuntos/air/o-que-e-air/3.AIREstrategiadeColetaeTratamentodeDados.pdf (accessed on 7 February 2022).

[7] Ministério da Economia (2021), Guia para Elaboração de Análise de Impacto Regulatório (AIR), https://www.gov.br/economia/pt-br/assuntos/air/o-que-e-air/SEPEC_guiadeair_vfinal_1504211.pdf (accessed on 7 February 2022).

[11] Ministério da Economia (2021), Modelo de Governança da Análise de Impacto Regulatório do Ministério da Economia, https://www.gov.br/economia/pt-br/assuntos/air/o-que-e-air/4.AIRModelodegovernanca1.pdf (accessed on 7 February 2022).

[9] Ministério da Economia (2021), Participação Social no Âmbito do Decreto de Análise de Impacto Regulatório-AIR, https://www.gov.br/economia/pt-br/assuntos/air/o-que-e-air/2.AIRManualdeParticipacaoSocial.pdf (accessed on 7 February 2022).

[13] OBPR (2022), Learning from Australia’s experience of capacity building for Regulatory Impact Analysis (RIA).

[16] OECD (2021), OECD Regulatory Policy Outlook 2021, OECD Publishing, Paris, https://doi.org/10.1787/38b0fdb1-en.

[18] OECD (2018), OECD Regulatory Enforcement and Inspections Toolkit, OECD Publishing, Paris, https://doi.org/10.1787/9789264303959-en.

[5] OECD (2018), OECD Regulatory Policy Outlook 2018, OECD Publishing, Paris, https://doi.org/10.1787/9789264303072-en.

[4] OECD (2012), Recommendation of the Council on Regulatory Policy and Governance, OECD Publishing, Paris, https://doi.org/10.1787/9789264209022-en.

[2] OECD (2011), Regulatory Policy and Governance: Supporting Economic Growth and Serving the Public Interest, OECD Publishing, Paris, https://doi.org/10.1787/9789264116573-en.

[1] OECD (2008), OECD Reviews of Regulatory Reform: Brazil 2008: Strengthening Governance for Growth, OECD Reviews of Regulatory Reform, OECD Publishing, Paris, https://doi.org/10.1787/9789264042940-en.

[20] Regulatory Policy Committee (2019), The RPC-How we work with departments, https://assets.publishing.service.gov.uk/government/uploads/system/uploads/attachment_data/file/795424/The_RPC_Offer_to_departments_logo.pdf (accessed on 29 June 2020).

[6] Renda, A. and J. Castro (Forthcoming), Defining and Contextualising Regulatory oversight and Co-ordination.

Observações

← 1. e Saneamento Básico Nacional

← 2. Entulho regulatório: “atritos excessivos ou desnecessários, tais como a burocracia, que custam tempo ou dinheiro; que podem tornar a vida mais difícil; que podem ser frustrantes, estigmatizantes ou humilhantes; e que podem acabar privando as pessoas do acesso a bens, oportunidades e serviços importantes”. (ver Sunstein, Cass R. (2019), Sludge Audits, 27 April). Harvard Public Law Working Paper No. 19-21, Forthcoming, Behavioural Public Policy, https://doi.org/10.2139/ssrn.3379367.

← 3. As agências reguladoras incluídas na Lei de Agências Reguladoras já são obrigadas a realizar consultas públicas. Consulte o capítulo 3 para obter mais detalhes sobre as atividades de participação social do governo federal brasileiro.

← 4. Econômico, Custo Brasil, Social, Ambiental, Segurança e Defesa, Agricultura, Mineração, Educação, Infraestrutura e Saúde.

← 5. Acordo de Comércio e Cooperação Econômica entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo dos Estados Unidos da América Relacionado a Regras Comerciais e Transparência.

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